O sergipano José Avelar de Melo é um dos personagens mais conhecidos do chamado “Setor Histórico” de Curitiba. Depois de vir ao “Sul Maravilha” para trabalhar na construção civil – era especialista em rodovias -, no ano de 1978 resolveu mudar de atividade. Montou uma banca de revistas (o “Nanicão”) na antiga galeria Julio Moreira e, em três décadas, construiu um gigantesco patrimônio imaterial de histórias, fregueses e amigos. Em pouco tempo, sua banca – que, atualmente, funciona na Saldanha Marinho – virou ponto de encontro e discussão de temas como política, futebol e religião.
Em outras eras, recorda, a política foi uma espécie de leitmotif das conversas. Dava ensejo a piadas e a discussões que muitas vezes entravam pela noite. Durante a ditadura, por exemplo, chegou a vender seiscentos exemplares do “Pasquim” por semana – isso, apesar de o próprio Melo não ser adepto da esquerda festiva ou radical, mas um democrata assumido. O sucesso dos jornais alternativos era tamanho que o estabelecimento chegou, mesmo, a sofrer três ou quatro ameaças de bomba. “Eu tinha medo e vez por outra recebia visitas ‘estranhas’, mas não deixava de vender”, recorda.
Em 1989, no reingresso do país na democracia, Melo promoveu uma eleição simulada para presidente da República que teve a adesão de nada menos que oitocentos votantes (dentre os quais este colunista, então eleitor de primeira viagem), número que faria corar de vergonha muitos dos atuais promotores de pesquisas de intenção de voto. Resultado: 1º lugar, Mario Covas; 2º, Guilherme Afif Domingues; 3º, Lula; 4º, Collor de Mello. Naquela época, inclusive, a banca recebia freqüentes visitas de candidatos a prefeito, deputado e vereador. Muitas vezes, inclusive, os pleiteantes eram sabatinados pelos habitués ali mesmo, enquanto tentavam desovar os santinhos.
Em 2008, o clima na banca não lembra, nem por sombra, os melhores tempos d´antanho. “O entusiasmo acabou”, desabafa Melo, observando que nem ele e nem a freguesia reúnem paciência para conversar sobre política. Via de regra, o assunto é “resolvido” com frases curtas, interjeições e xingamentos. As publicações alternativas são poucas, boa parte delas não tem cor ideológica definida e as vendas dos títulos mais conhecidos (“Caros Amigos”, “Le Monde Diplomatique”, “Nova Democracia”, “A Verdade”) são simplesmente medíocres.
O Setor Histórico, observa o velho dono de banca, não parece estar vivendo uma campanha eleitoral – a atmosfera é da mais absoluta sonolência. “Até agora, recebi uma única visita, de um candidato a vereador”, conta. Santinhos ou jornais de campanha, simplesmente não vê (não porque não queira, mas porque não lhe chegam às mãos).
Para José Avelar de Melo, o marasmo reinante reflete um desencantamento “weberiano” em relação ao papel dos políticos na mudança social. Talvez existam, porém, outros motivos, como as pesquisas de opinião – que pintam uma espécie de “cenário prévio definitivo” em nossa cidade – ou a inexistência de ideologias claramente identificadas, capazes de inflamar os espíritos (as mais “definidas” e “inflamadas” são mero populismo).
Questionado sobre se faria uma eleição simulada este ano, ele diz que não, de jeito nenhum. Por quê? Em sua opinião, o número de votantes seria simplesmente ridículo. Melhor mesmo, conclui, é guardar as lembranças dos “melhores tempos idos” sem esperar grandes novidades do futuro.