• Carregando...
2 leis em 30 anos: vereadores de Curitiba trabalham pouco pela bicicleta
| Foto:
Alexandre Costa Nascimento/Ir e Vir de Bike

Pela Ordem! Em mais de três décadas, a Câmara Municipal de Curitiba fez pouco — ou quase nada — para estimular a ciclomobilidade nesta capital. Desde 1981, a Casa aprovou apenas duas leis diretamente ligadas ao uso da bicicleta, segundo levantamento realizado pelo Ir e Vir de Bike no Sistema de Proposições Legislativas da Câmara.

Porém, sem a devida e necessária fiscalização dos parlamentares, as duas entraram para aquele famoso limbo de “leis que não pegaram”.

Em ano de eleição, muito candidato vai aparecer por aí dando suas pedaladas em busca de alguns votos. A causa da bicicleta será uma bandeira defendida por muitos que buscam uma cadeira na Câmara Municipal de Curitiba, seja pela primeira, seja pela oitava vez consecutiva.

Mas, tanto quem pede uma chance “para mudar as coisas” quanto quem busca seu voto “para continuar trabalhando” precisa admitir que a Casa de Leis do município não é necessariamente uma Casa Amiga da Bicicleta.

Há muito falatório, algum jogo de cena, mas pouca coisa é aprovada resultando em melhoria efetiva para a população que pedala (ou que pedalaria se houvesse melhores condições).

Na atual legislatura, foram apresentadas 88 proposições relacionadas à temática da bicicleta. Destes, 63% são “Requerimentos ao Executivo”, que vão desde a exigência de estudos técnicos aprofundados sobre ciclomobilidade à propostas esdrúxulas, como a do vereador Roberto Hinça (PSD), que propôs no requerimento nº 044.05505.2006 “a proibição de trânsito de bicicletas em torno do cemitério da Água Verde” — provavelmente para não perturbar a paz dos mortos!

Ou outra, que propõe a “fiscalização efetiva” no Parque Bacacheri, “com relação às bicicletas, que circulam em velocidade excessiva, provocando acidentes com os pedestres” — o requerimento, entretanto, não apresenta nenhuma estatística que o sustente e apresenta como justificativa genérica “reclamações de usuários do parque que se sentem intimidados pelos ciclistas”.

O campeão no número de requerimentos é o vereador Professor Galdino (PSDB), que em tempos de campanha pode ser visto circulando pelo calçadão da Rua XV com uma bicicleta tocando seu pegajoso jingle numa caixa de som.

Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
Câmara de Vereadores de Curitiba

Muitos desses requerimentos são arquivados ou recebem como resposta “argumentos técnicos” do Ippuc. O caso mais emblemático é uma resposta ao requerimento nº 044.13401.2009, formulado pelo vereador (atualmente licenciado) Mario Celso Cunha (PSB) pedindo a “recuperação da ciclovia na Rua Pastor Antonio Polito, no Alto Boqueirão”. O órgão indefere o pedido com o argumento de que “devido ao longo período de chuvas e o volume de solicitações pendentes, pelo prazo de 90 dias todos os distritos de manutenção urbana estão realizando apenas obra de manutenção da malha viária“.

Apenas 18 das 88 proposições (20%) são projetos de lei que tramitam vagarosamente pelas comissões da Casa. Outras 10 proposições são emendas ao orçamento pedindo verbas para contrução e recuperação da malha cicloviária — a maioria arquivada com votos da base governista.

Das duas leis aprovadas pela Câmara nas últimas três décadas, uma foi a nº 6.273 de 1981, que prevê que os edifícios com garagem para automóveis reservem obrigatoriamente 5% da área para estacionamento de bicicletas.

Já a Lei nº 10.232 de 2001 atribui ao Executivo a responsabilidade de “avaliar a necessidade” de dotar parques, praças e vias públicas de estacionamentos para bicicletas. Observe que a lei não obriga a instalação, e sim sugere a “avaliação da necessidade”. Não pegou!

Fora as duas peças legislativas raras, nenhuma outra lei de autoria dos vereadores foi aprovada contendo em seu corpo a palavra “bicicleta”.

Quando assume seu mandato, o vereador curitibano faz um juramento prometendo cumprir a Lei Orgânica do Município de Curitiba e promover o bem geral do povo.

A Lei Orgânica é a nossa Constituição. Reformada em 2011 ela prevê, por sugestão dos cicloativistas em audiência pública, em seu artigo nº 147, que a política de desenvolvimento urbano tem como objetivo, entre outros, “assegurar a prioridade de veículos não motorizados sobre veículos automotores” (Inciso VI).

A responsabilidade do Executivo

É só a partir de 1991 que a palavra “ciclovia” começa a aparecer no plano plurianual (PPA) e nas leis de diretrizes orçamentárias (LDOs), que são enviadas à Câmara por iniciativa do Executivo.

Rodolfo Bührer/Arquivo/Gazeta do Povo
Sem aplicar recursos previstos no PPA e na LDO, ciclovias curitibanas estão em péssimo estado

Entre 1991 e 1994, na gestão Jaime Lerner (então no PDT), a diretriz “Implantar rede de ciclovias destinadas ao trabalho e lazer” aparecia no campo “Trânsito e Circulação”, do capítulo “Infraestrutura” das LDOs desses quatro anos.

A partir de 1995, na gestão de Rafael Greca (à época no PDT), a diretriz passa a ser: “Executar obras de pavimentação, urbanização, ciclovias, sinalização, bem como implantação de equipamentos de controle e obras especiais”.

Já 1997, na gestão de Cássio Tanichuchi (PDT), a diretriz passa a ser: “Elaborar e executar projetos de pavimentação e urbanização, bolsões, trincheiras, ciclovias, sinalização e segurança de tráfego, através de convênios firmados com o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID”. O Plano Plurianual de seu mandato prevê a implantação de 21 quilômetros de ciclovias.

Entre 1999 e 2003, ainda sob a gestão Taniguchi (que no segundo mandato foi eleito pelo PFL), a palavra ciclovia simplesmente desaparece do planejamento urbano e das propostas da Lei de Diretrizes Orçamentárias nesses anos.

Apenas em 2004, na lei nº 11.266, de iniciativa do Executivo, que dispõe sobre a adequação do Plano Diretor de Curitiba ao Estatuto da Cidade, é que a palavra ciclovia volta a aparecer em uma peça legal do município.

Neste caso, a lei prevê que o eixo viário de integração da região metropolitana seja constituído por um sistema com linha de transporte coletivo em pista exclusiva, vias locais de acesso às atividades e ciclovia (Art. 13, inciso II).

Já o artigo 15º, “Da Mobilidade Urbana e Transporte”,prevê que “a política municipal de mobilidade urbana e transporte, têm o compromisso de facilitar os deslocamentos e a circulação de pessoas e bens no Município, com as seguintes diretrizes gerais: IV – promover a acessibilidade, facilitando o deslocamento no Município, através de uma rede integrada de vias, ciclovias e ruas exclusivas de pedestres, com segurança, autonomia e conforto, especialmente aos que têm dificuldade de locomoção.

O artigo 17º, do capítulo “Dos Sistemas Viário, de Circulação e Trânsito”, estabelece em seu inciso VII a necessidade de se “desenvolver um programa cicloviário, buscando a integração metropolitana, e incentivando sua utilização com campanhas educativas”;

Em 2005, já na gestão de Beto Richa (PSDB), a Lei nº 11.640/2005, que estabelece as metas para o ano seguinte, prevê a implantação de uma ciclovia na Avenida Três Marias, no Bairro Orleans – no local, houve instalação de calçada asfáltica o que, segundo o Ippuc, não é considerada uma ciclovia oficial.

Nos cinco anos seguintes da gestão Richa, a palavra ciclovia simplesmente desapareceu e só voltou em 2010

Antônio Costa/ Gazeta do Povo
Questão de prioridade: na gestão Beto Richa (PSDB) palavra “ciclovia” desapareceu do planejamento entre 2006 e 2010

– quando da aprovação do projeto de lei que autorizou a liberação de recursos para a revitalização da Avenida Marechal Floriano. Mas, ao contrário do previsto no projeto origianal, a ciclovia projetada transformou-se em uma ciclofaixa, com 73 centímetros de largura em alguns trechos.

Em 2011, já só a gestão do vice-prefeito Luciano Ducci (PSB), que assumiu o posto para Richa disputar o governo do Paraná, a Lei Ordinária nº 13.864/11 autoriza o Executivo a tomar empréstimo de R$ 32 milhões para obras viárias, que inclui a construção de ciclovia na Rua Salgado Filho e na rua de acesso ao Zoológico — obras que ainda não foram executadas até o momento.

Já a lei 13.909/11 aprova a Operação Urbana Consorciada Linha Verde, estabelece diretrizes urbanísticas para a área de influência da atual Linha Verde e inclui reurbanização de vias existentes, implantação de novas vias e trechos de ciclovias.

Para 2013, a Câmara ainda deve avaliar a Lei Orçamentária Anual. Na formulação da LDO, as emendas que previam mais recursos foram vetadas com votos da base da apoio do prefeito. A Prefeitura está promovendo uma consulta pública para estabelecer as prioridades do próximo orçamento.

A população pode participar sugerindo investimentos em ciclovias. E deve cobrar do próximo prefeito a execução integral dos recursos previstos. Esse papel cabe aos vereadores, mas não vem sendo cumprido nos últimos 30 anos…

Saiba mais

Clique aqui e baixe o arquivo com as propostas legislativas apresentadas na Câmara Municipal de Curitiba nos últimos anos.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]