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2º Dia: cobras, lagartos e onças…
| Foto:
Alexandre Costa Nascimento
Falta de água e comida pode transformar uma inofensiva ciclista em onça

Acordamos antes mesmo do sol nascer e caímos na estrada às 6h30, na esperança de vermos muitos animais e, quem sabe, até uma onça-pintada. Começamos com um ritmo bem leve, parando constantemente para fotografar e descansar. A informação do caseiro do Pixaim foi de que a distância até Porto Jofre era de 40 quilômetros. Pelos nossos cálculos, daria para chegar antes do meio-dia para o almoço.

Logo no início do trajeto, vimos um filhote de jacaré morto na beira da estrada, atropelado por algum carro durante a noite, pois a carcaça ainda não estava rígida. Tiramos algumas fotos e seguimos em frente e, a cada pedalada, percebemos que deixávamos para traz os últimos indícios de civilização, entrando cada vez mais no Pantanal selvagem, onde pousadas e fazendas praticamente não existem.

No caminho, o Alexandre viu uma pena branca no meio da estrada, provavelmente de uma garça, pegou e colocou-a em sua bike para dar sorte. Quando nos aproximamos dos 40 quilômetros, acreditando estarmos próximos do destino, fizemos uma pausa para beber água e comer bolachas e barra de cereais, nosso desjejum.

Como de praxe, encostamos uma bike na outra para deixá-las de pé. Nesta hora, o Alexandre quis tirar uma foto da “pena da sorte”, mas, ao posicionar o guidão no melhor ângulo, acabou derrubando as duas bicicletas.

Na hora não percebemos, mas quando subimos nas bicicletas a Andreza reclamou que não conseguia pedalar. Foi então que vimos que, na queda, o peso do alforje acabou soltando o parafuso e o braço do suporte entrou na catraca. Maldita pena da sorte!!!

Tentamos, em vão, achar o parafuso durante mais de meia hora. Sem ter o que fazer, sinalizamos para um carro que passava para pedir ajuda. O motorista, no entanto, disse que não tinha nada que pudesse fazer para resolver o nosso problema e, ainda, para completar, nos informou que Porto Jofre estava a cerca de 40 quilômetros daquele ponto – o que dobrou a distância prevista inicialmente.

Para resolver a quebra da bicicleta, o Alexadre teve que recorrer às suas habilidades de escoteiro: pegou uma argola de chaveiro e, com um alicate, abriu e a usou como um arame para prender o bagageiro no quadro da bicicleta, rezando para que não soltasse. E funcionou!

Com o tempo perdido no conserto, seguimos viagem já com o sol do meio-dia rachando nas nossas cucas. Devido ao calor, tomamos toda a água que ainda nos restava. Sem água, com fome e metade do caminho ainda por percorrer, uma onça apareceu na estrada – mas não era a onça-pintada do Pantanal, e sim a Andreza, a beira de um surto!

Ela só se acalmou quando expostas as nossas três únicas opções: pedalar 40 km e voltar para o Pixaim, pedalar 40 km e chegar em Porto Jofre, ou então, acampar ali mesmo, na beira da estrada sem água e dois pacotes de miojo. Decidimos então, seguir em frente.

Pedalamos mais uns 20 minutos quando, em uma ponte, vimos um rio com água corrente – algo raro, já que a maioria é de água parada. Foi a nossa salvação: enchemos o cantil e as caramanholas com aquela água. Aí entrou em cena a farmacêutica prevenida, que trouxe um vidrinho de hipoclorito de sódio. Com três gotinhas em cada garrafa e meia hora, garantimos nosso suprimento de água potável.

Aproveitamos o rio para nos refrescarmos. Enquanto o Alexandre estava brincando de tacar água para cima, a Andreza apontou e perguntou: aquilo ali atrás, não é um jacaré? E de fato era um baita jacarezão, a menos de três metros de onde ele estava. Foi um susto e tanto!!!

Refrescados e reidratados, continuamos nosso pedal, fotografando mais animais e curtindo as belezas do Pantanal. A estrada é um “retão sem fim” – sem subidas ou descidas, o que exige pedaladas constantes.

Neste segundo dia, a Transpantaneira foi praticamente só nossa, quase sem nenhum movimento. Durante o dia todo, não cruzamos com mais de meia-dúzia de carros ou caminhões o que foi bom, pois não levantou tanta poeira na estrada.

Avistamos um desses carros de longe e percebemos que ele estava parado. Ao nos aproximarmos, o motorista e um passageiro do banco de traz sinalizaram com a mão. Quando Alexandre foi frear para parar, o motorista apontou para o chão e gritou: olha a cobra! “Só deu tempo de vê-la dando o bote na minha direção. Tirei os pés do pedal e pulei para frente, levando o meu primeiro tombo na viagem”. A cobra, uma pequena jararaca, fugiu em direção ao mato.

O passageiro do carro era um norte-americano, que estava fotografando a cobra. Conversamos um pouco e, depois do susto, seguimos em frente. Dali em diante entramos em uma região mais alagada, com muitas pontes, onde vimos muitas famílias de capivaras.

Enquanto atravessava uma dessas pontes, involuntariamente, o Alexandre cometeu um crime ambiental. Um lagartinho que não olhou para os dois lados antes de atravessar a estrada foi atropelado, bem na cabeça, pelo pneu dianteiro da sua bicicleta. Sem tempo de realizarmos um funeral digno para o pobre coitado, fizemos uma oração, encomendando sua alma para o céu dos lagartos e lançamos seu corpo ao rio.

Com o sol já começando a se pôr, o que dá um maravilhoso tom alaranjado ao cenário pantaneiro, chegamos ao fim da nossa jornada. A estrada termina exatamente na margem do Rio Piquiri, que divide a fronteira com o estado do Mato Grosso do Sul. Mas, ao contrário do que pensávamos, Porto Jofre não é um vilarejo e se resume a um hotel de luxo, cuja diária custa R$ 995 por pessoa, e um rancho, conhecido como pesqueiro do Neco, administrado pelo “seu” Aldo.

No pesqueiro, conseguimos lugar para acampar. Enquanto armávamos a barraca, novamente constatamos que os mosquitos pantaneiros ainda não foram avisados de que citronela faz mal a saúde deles. Resultado: fomos devorados vivos por um enxame de pernilongos, muriçocas e borrachudos.

No fim, um bom banho e a sensação do dever cumprido e de que vivemos uma aventura que será lembrada pelo resto de nossas vidas.

Animais avistados
Preá
Arara
Jararaca
Pica-pau
Mutum
Arancuã
Tucano
Galo de campina
Anta
Graxaim (Cachorro do mato)
Veado
Búfalo

#Fatos
É melhor cair da bicicleta do que ser picado por uma jararaca;
Antes de banhar-se em um rio, verifique se não há nenhum jacaré por perto;
Água sanitária mata os micróbios, mas não tira o gosto de xixi de jacaré da água;
Lagartos não olham para os dois lados antes de atravessar a estrada;
Uma Andreza brava é tão perigosa quanto uma onça-pintada;
Cruzar a Transpantaneira de bicicleta pode ser a grande aventura de sua vida.

#Fotos
Vejas as fotos do 2° dia da Expedição Transpantaneira no Pedal no Facebook

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