• Carregando...
Entrevista – Bruno Meirinho: “Quem pedala sonha com uma cidade mais justa e democrática”
| Foto:
Robson Santos/Respeite 1,5 m

O candidato do PSol à prefeitura de Curitiba, Bruno Meirinho, defende a criação de espaços seguros para quem pedala e faz questão de frisar que é usuário frequente da bicicleta como meio de transporte. Candidato da Frente de Esquerda, ele propõe a implantação de ciclofaixas paralelas às canaletas do ônibus expresso, totalizando 150 quilômetros de novas vias para as bicicletas na cidade.

Para Meirinho, a cidade não pode ser pensada apenas para o uso dos automóveis. “As vias públicas estão privatizadas pelo uso do carro, do uso do transporte individual que ocupa um espaço desproporcional”, avalia.

Mas, mais que um simples meio de transporte, Meirinho aponta a bicicleta como uma ferramenta de democratização do espaço urbano e promoção da cidadania. “Quem usa a bicicleta se sente poderoso, porque se sente também como responsável pela cidade”, diz.

Bruno Meirinho é o quarto e último entrevistado na série do blog Ir e Vir de Bike com os candidatos à prefeitura de Curitiba. Confira a entrevista na íntegra:

Pessoalmente, você acredita no uso da bicicleta como meio de transporte? Qual o papel que terá a bicicleta na sua administração, caso seja eleito prefeito de Curitiba?

Bruno Meirinho: A bicicleta como meio de transporte é um modal viável. É claro que você não deve concentrar todo o transporte da cidade em apenas um modal, temos que incentivar a diversidade e a bicicleta se insere nisso. O que vemos hoje é justamente uma predominância muito grande de um modal – que é o carro – que causa problemas no trânsito. A cidade não anda pelo excesso de carros e pela predominância do uso do carro para deslocamentos que poderiam ser feitos de outras formas. O transporte coletivo é importante e a bicicleta, em Curitiba como em outras cidades, também pode cumprir seu papel.

Curitiba reúne condições físicas favoráveis. A cidade tem uma área, como uma topografia muito favorável ao uso da bicicleta, o que tornaria adequada a criação de uma rede para deslocamentos.

Eu mesmo, que moro no Boqueirão, quando estava na universidade, fiz uso da bicicleta frequentemente. Hoje é mais esporádico. Não uso diariamente mas sempre que posso percebo que é possível ter um deslocamento ágil com a bicicleta. Não é demorado, não é necessariamente cansativo.

Eu acho que o uso da bicicleta como modal é, acima de tudo, uma atitude consciente. É tão fácil e importante quanto separar o lixo. É uma questão de cultura e, para isso, a prefeitura tem que dar todo o apoio.

Danilo Herek/Cicloativismo.com
“Eu acho que o uso da bicicleta como modal é, acima de tudo, uma atitude consciente. É tão fácil e importante quanto separar o lixo”

Quando e onde foi a última vez que você pedalou?

Pedalei antes de ontem, para fazer a vistoria com os ciclistas da CicloIguaçu. Mas eu pedalei também na semana passada para vir ao escritório. A cada duas semanas eu pego a bicicleta e falo: hoje eu vou pedalando para o centro.

Eu moro no Boqueirão e pego um trecho da ciclofaixa que foi implantada lá, alguns trechos ela é muito complicada, muito estreita. Em outros trechos se percebe que ela não tem conexão, você tem que pedalar pela rua e depois da Linha Verde você tem que decidir se vai pela ciclovia que margeia a Conselheiro Laurindo, que está em péssimas condições, ou se você pedala pela canaleta, ou pela rua.

Eu vou pela canaleta em alguns trechos, sempre com o máximo de cautela. Definitivamente, a canaleta não é espaço adequado para se andar de bicicleta, mas nós temos que escolher com quem vamos competir. Na canaleta há mais previsibilidade.

Em seu plano de governo, registrado no TRE, não consta nenhum plano de ciclomobilidade. As palavras bicicleta e ciclovias sequer são mencionadas. Como acreditar que você, sendo eleito, terá um bom plano para favorecer o uso das bicicletas?

O documento entregue no TRE é um documento preliminar, que coloca um ponto principal da nossa política, que é a defesa da coerência e da história do nosso partido, o PSol. É um documento bastante breve. O nosso plano de governo está sendo lançado de forma definitiva, com um documento mais detalhado que traz todos os pontos de forma mais clara. Por essa razão é que não contava nada naquele documento.

Mas, da nossa parte, tem muitos militantes do partido que são ciclistas, tem o candidato Jaques Brand, ligado à ciclomobilidade. Tem a Xênia que também é ciclista. Eu mesmo faço uso da bicicleta e procuro sempre participar das atividades da CicloIguaçu e, dessa forma, busco afirmar meu compromisso com o tema da bicicleta. De fato, a menção a ciclobilidade conta do nosso programa definitivo.

Hoje, você deixaria seus filhos, netos ou sobrinhos irem pedalando para o colégio? Como homem público, estimularia a família curitibana a fazer o mesmo?

É uma questão de cultura. É preciso incentivar uma atitude consciente e dizer: pegue a bicicleta, tome a iniciativa. Mas, se não houver uma infraestrutura que dê segurança, muitos pais não tem coragem de deixar seus filhos andarem de bicicleta.

Como prefeito, eu procuraria tomar medidas imediatas para que o uso das bicicletas fosse mais seguro nas vias, com programas de educação para os motoristas e para os ciclistas de modo que respeitem as regras de trânsito, de modo a usar o lado mais seguro da via, tendo o respeito por parte dos motoristas. E implantar, o mais breve possível, as ciclofaixas que deem acesso funcional dos locais de moradia aos locais de trabalho e lazer da cidade.

Nesse sentido, uma campanha de incentivo seria coerente com a estrutura que a prefeitura estaria oferecendo aos ciclistas.

Danilo Herek/Cicloativismo.com
Meirinho, em frente ao comitê do PSol: bike como meio de transporte

Quais são suas estratégias, planos e metas para tornar o trânsito de Curitiba mais amigável ao uso da bicicleta?

O plano é implantar, de forma imediata, as ciclofaixas nas vias lentas das estruturais, ao lado das canaletas do ônibus expresso. Justamente porque essas vias são importantes para o acesso dos moradores dos bairros ao centro. Portanto elas cumprem um papel funcional.

Além disso, as vias têm de ser inteligentes, devem comportar a diversidades dos modias: devem oferecer a calçada para o pedestre, o espaço para o ônibus, para o carro e, deve sim, ter o espaço para as bicicletas. Essas vias estruturantes devem ser as mais completas, portanto, é nessas vias que a gente vai implantar as ciclofaixas.

Temos o compromisso de atender os 10 pontos da Carta de Compromisso por uma cidade ciclável, incluindo educação, cultura da bicicleta, criação de uma rede de serviços para oferecer reparos, criação de espaços para que o ciclista possa deixar sua bike, como bicicletários e paraciclos e as ciclofaixas.

Acreditamos que a implantação de 150 quilômetros – que consiste na distância do trajeto das paralelas nos dois sentidos – é o nosso compromisso. Também é preciso implantar uma zona 30 no centro da cidade e implantar ciclofaixas, algo que pode ser levado também para os bairros.

O ex-prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa, ao ser questionado sobre a retirada das áreas de estacionamento na capital colombiana para implantação de ciclofaixas, fez o seguinte comentário: “Estacionamento não é responsabilidade minha, é um problema privado. Eu também não digo onde você guarda sua roupa. O estacionamento não é um direito adquirido em nenhuma Constituição do mundo, ao contrário do direito de ir e vir”. Você concorda com essa interpretação?

Concordo. Todas as nossas demandas da nossa campanha a respeito da cidade, se centra na ideia de desprivatizá-la. A demanda por uma rede de ciclovias é na verdade uma demanda por espaços públicos, é uma demanda pela recuperação do espaço públicos da cidade.

Não podemos permitir que as praças e os parques sejam privatizados, como a prefeitura está propondo com a licitação de espaços de lazer. A gente não pode admitir que os espaços públicos sejam privatizados, temos que reverter isso.

É um retrocesso urbanístico da cidade de Curitiba, que tem espaços públicos muito bons, mas que estão sendo abandonados pela prefeitura, sucateados e entregues à iniciativa privada. Acho que acontece isso também com as vias. As ruas estão sendo privatizadas pelo uso dos carros, por um interesse industrial da indústria automobilística, que cria um conceito da cidade para o carro apenas. E isso é uma privatização, já que ocupa um espaço imenso para o uso do carro, que é um transporte individual que é desproporcional.

A bicicleta também é um meio de transporte individual, mas ele ocupa um espaço muito menor e ambientalmente é muito mais adequada.

Portanto, ao reivindicar a diversidade de usos, reivindicamos também a desprivatização da cidade. Essa também é a lógica do prefeito citado, já que a cidade não pode ser pensada apenas para o uso do carro. Alguns luxos que os donos de carros tem que ter, como espaços para estacionar, devem ser providenciados por conta própria, e não às custas da privatização do espaço público. Reduzindo as faixas de trânsito para o carro você contempla os diversos ritmos de circulação na cidade.

Danilo Herek/Cicloativismo.com
Candidato percorreu trechos do centro ao lado dos ciclistas e assinou carta de compromisso

Desde 2009, cerca de 80 ciclistas morreram em acidentes nas ruas da capital. O que pretende fazer para reduzir essas estatísticas?

Isso é realmente mostra a importância do tema. Tudo isso que falamos até agora, são medidas de baixo custo. São medidas de educação, medidas culturais ou medidas físicas simples, como a pintura de faixas, colocação de placas e blocos de separação.

É um absurdo que essa política não seja implantada e que pessoas então tenham de se aventurar no trânsito e que acabe ocorrendo esse tipo de situação. A gente acredita que a criação de espaços seguros para os ciclistas já contribuiria para reduzir o número de mortes.

Você se comprometeria em exigir da Setran uma fiscalização efetiva, com autuação de motoristas que colocam ciclistas em situações de risco, a exemplo da CET de São Paulo?

Claro. Nós queremos uma fiscalização mais intensiva dos direitos dos ciclistas, dentro das condições técnicas. É uma questão de razoabilidade.

Hoje a prefeitura dedica um corpo de fiscalização numeroso apenas para a arrecadação dos valores do EstaR [estacionamento regulamentado]. Esses fiscais também deveriam ser colocados a serviço de fiscalizar o trânsito de bicicletas e a convivência pacífica entre os modais.

Nossa proposta é orientar, sim, por esse tipo de fiscalização. É viável fazer isso: existe um monte de fiscais nas ruas, que fiscalizam uma coisa apenas. Eles poderiam também fiscalizar as bicicletas.

Pretende implantar um sistema público de aluguel de bicicletas, a exemplo de São Paulo, Rio de Janeiro ou mesmo Toledo, no interior do Paraná?

Claro. É um sistema que tem custo baixo e que tem um resultado muito bom para a cidade. Por exemplo, na região central, onde pode ser criada uma zona de tráfego lento, você desincentiva o uso do carro, criando a cultura de que as pessoas deixem o carro em regiões mais afastadas do centro e venham de bicicleta. Circular na região central é muito mais fácil de bicicleta do que circular de carro.

Na verdade nem faz sentido criar uma zona de tráfego lento no centro da cidade. Hoje já é assim: os carros não andam no centro da cidade por conta dos congestionamentos. O espaço de aluguel seria útil, podendo ser criados nos bicicletários, com aluguel e infraestrutura para os ciclistas.

Como você avalia o papel social do movimento cicloativista?

É um movimento que revindica uma cidade mais amigável. Há uma radicalidade neste movimento – e a gente acha positivo o sentido da palavra radical –, que é a iniciativa das pessoas de enfrentarem um urbanismo opressivo, um urbanismo tecnocrático com uma atitude individual de pegar uma bicicleta e pedalar.

É um movimento, acima de tudo, muito corajoso que tem coragem não apenas de defender o que acredita na teoria, mas também de praticar o que deseja. Quando um ciclista pega sua bicicleta e vai para o trânsito e busca conseguir seu espaço, já está praticando o que se acredita. Essa união de teoria e prática é o que dá a esse movimento a força que ele tem. Muitas vezes na Câmara de Vereadores e outros espaços de poder, há muita garganta, muito gogó, e pouco prática. Os cicloativistas têm o que dizer e têm muita prática.

Você conhece a iniciativa do VotoLivre.org? Já votou? Se eleito, encamparia as propostas e enviaria à Câmara Municipal um projeto de lei semelhante, por iniciativa do Executivo?

Sim, já votei nesse projeto de lei. É uma iniciativa de colher assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular, através da internet. Usa esse poderoso mecanismo de organizar as pessoas que são as redes sociais. Acho muito inteligente essa iniciativa e, pelo elevado número de apoios que a iniciativa tem, acho que a prefeitura já deveria ter tomado uma iniciativa de enviar uma proposta do próprio executivo. Eu apresentaria sem o menor problema.

Danilo Herek/Cicloativismo.com
Meirinho e o coordenador-geral da CicloIguaçu, Jorge Brand (Goura), avaliam condições de trânsito da área central da cidade para quem pedala

A sua candidatura visa marcar uma posição política e divulgar a ideologia do Partido Socialismo e Liberdade. Como você e o partido veem a bicicleta como ferramenta de democratização das cidades?

Recuperar o uso do espaço público e democratizar a cidade. O patrimônio público tem que ser de controle público. Mas, mesmo que o espaço esteja sob controle público, se você tem uma elite corrupta, antidemocrática, ela vai se favorecer de forma privada do patrimônio público, como estamos acostumados a ver nos escândalos de corrupção, como no caso da Câmara de Vereadores, com o desvio familiar do dinheiro público. Defendemos um processo mais amplo de participação popular na formulação do orçamento.

Podemos, por exemplo, incluir no talão do IPTU um formulário em que o cidadão poderá optar por doar uma parte do valor que está pagando para políticas de ciclomobilidade. Isso cria uma responsabilidade para o movimento convencer a sociedade da importância dessa destinação. É uma forma do cidadão ser empoderado das decisões da cidade, ocupando progressivamente os espaços de poder da cidade.

Há uma evidente demanda pela ocupação do espaço público, como demonstra o carnaval do Largo da Ordem, que foi barbaramente reprimido, o ano-novo fora de época na Praça da Espanha. Ficam falando que o curitibano é acanhado e conservador. Não é nada disso, o curitibano é reprimido por um discurso que diz: “vocês não podem se expressar”.

Eu acho que existe uma espontaneidade do curitibano que tem que enfrentar essa opressão. Acho que a bicicleta entra como um elemento da ocupação do espaço público pelo cidadão. A pessoa que pega sua bicicleta e tem espaço para pedalar, ir para o trabalho, para a escola ou passear, ele se sente poderoso, porque se sente também como responsável pela cidade. Acho que esse é um elemento dessa nossa discussão de desprivatizar a cidade.

Há algo positivo que a atual administração tenha feito em benefício de quem pedala em Curitiba?

Acredito que tudo que foi feito foi muito mais em função da pressão do movimento. O movimento conquistou. É injusto dar um reconhecimento para quem não foi responsável pelo avanço. Acho que, se há algo de positivo que aconteceu, foi fruto da luta do movimento cicloativista.

A ciclofaixa paralela à Marechal Floriano e a implantação dos paraciclos são medidas muito importantes para quem pedala. Eu mesmo utilizo a ciclofaixa da Marechal, acho importante, mas sei que foi uma iniciativa provocada pelos ciclistas há algum tempo, através das bicicletadas e mobilizações.

A prefeitura, na verdade, até demorou demais para implantar uma política acessível, dado que são medidas simples e baratas. Acho sim que foram feitas coisas positivas mas eu responsabiliza muito mais o movimento do que a prefeitura.

Porque quem anda de bicicleta ou quem sonha em fazer isso com segurança, sem ter que com isso arriscar a própria vida, deve depositar seu voto em você?

Porque eu sonho em andar de bicicleta em segurança, eu ando de bicicleta e conheço essa realidade de uma forma muito próxima. Acho que é preciso ter conhecimento de alguns detalhes do trânsito e como ele influencia o deslocamento dos ciclistas para ter a sensibilidade de propor as mudanças mais sérias e corretas, como nas transposições e cruzamentos.

Quando não há nem mesmo um semáforo para pedestres – muito menos para os ciclistas – você percebe que há uma falta de sensibilidade muito grande do engenheiro de tráfego da equipe do prefeito. Eu tenho essa sensibilidade nas não é uma questão individual. Eu acredito que quem sonha com a bicicleta também sonha com uma cidade mais justa e democrática e é isso que a gente defende: democracia. Quem sonha com isso deve votar em mim não para que eu faça isso sozinho, mas para ter mais voz e vez na política municipal.

Imagine que estamos em 31 de dezembro de 2016. Como você imagina que seria o título da matéria do Ir e Vir de Bike como o balanço da sua administração na área da ciclomobilidade?

50% dos deslocamentos em Curitiba são feitos por bicicletas.

————————————–

Confira o calendário de publicação das entrevistas:

15/8 – quarta-feira: Gustavo Fruet (PDT)
16/8 – quinta-feira: Rafael Greca (PMDB)
17/8 – sexta-feira: Ratinho Jr (PSC)
18/8 – sábado: Bruno Meirinho (PSol)

——————————
Vote no Ir e Vir de Bike!

O Ir e Vir de Bike concorre ao Prêmio Top Blog 2012 na categoria Variedades/Blogs Profissionais.

Para votar, clique no selo abaixo. É possível votar até 3 vezes, usando seu e-mail e os prefis do Facebook e Twitter.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]