O candidato do PMDB à prefeitura de Curitiba, Rafael Greca, acredita que a bicicleta está presente no DNA cultural do curitibano e diz ver no veículo de duas rodas uma ferramenta para transformar a cidade em um amplo espaço de educação para a vida e para a urbanidade. “Um mundo novo está sendo inaugurado pelas pernas de quem pedala”, avalia.
Greca, que já foi prefeito da capital, considera que o automóvel individual é gerador de impactos desfavoráveis na vida da cidade, enquanto a bicicleta é saudável, ocupa menos espaço e não polui.
Para ele, entretanto, uma rede de ciclovias só faz sentido se for democrática, oferecendo segurança tanto para a classe média quanto para os trabalhadores da Região Metropolitana. ”Por isso que eu acho que nós devemos ter a cada ano 150 quilômetros de ciclovias até chegarmos a um horizonte de até 600 quilômetros de rede metropolitana”, propõe. “Eu imagino as ciclovias com 2,2 metros de largura, sinalizadas e protegidas, sempre que possível do lado direito da mão de tráfego”, explica.
Greca é o segundo entrevistado na série do blog Ir e Vir de Bike com os candidatos à prefeitura de Curitiba. Confira a entrevista na íntegra:
Pessoalmente, você acredita no uso da bicicleta como meio de transporte? Qual o papel que terá a bicicleta na sua administração, caso seja eleito prefeito de Curitiba?
Greca: A bicicleta é uma alternativa importante como meio e transporte porque quem pedala não polui. Ela também pertence à memória cultural dos filhos e netos de imigrantes europeus. Eu me recordo da fascinação que causava nos meus olhos de menino passear nas cidades de Santa Catarina nos tempos de férias e ver que a cidade inteira ia e vinha de bicicleta.
Eu acho que a bicicleta é uma alternativa importante, inclusive agora, acrescida da possibilidade de inclusão do motor elétrico. Ela se transforma em uma oportunidade importante para a cidade e em instrumento de mobilidade urbana. Cada bicicleta na rua é um carro a menos, cada bicicleta na rua é menos gás metano saindo do escapamento dos carros.
O meu programa de governo prestou atenção nessa tendência e começou a ser construído a partir da ideia da bicicleta elétrica com a idealização dos pinheiros de luz, nos quais serão plugadas as bicicletas elétricas.
Sou candidato a prefeito já com 55 anos – eu já fui prefeito. Eu não tenho direito de barrar aos jovens tudo o que de anseio e de esperança eles têm em relação ao futuro de Curitiba. É meu dever abrir aos jovens as perspectivas de futuro e criar um horizonte novo. Horizonte, em grego, quer dizer “até onde se enxerga”. E eu tenho a alegria de poder enxergar um pouco mais longe que os outros.
Quando e onde foi a última vez que você pedalou?
Eu pedalava bastante enquanto moço, antes de me casar. Depois eu tive um processo de artrite reumatóide e fui engessado, fiquei proibido de pedalar e engordei. Daí a bicicleta ficou só na memória. Mas eu gostava muito de andar de bicicleta e andava por toda Curitiba. Eu era piá do Alto do São Francisco, quando ia tomar banho no rio Bariguí, eu ia de bicicleta. Na chácara, nós andávamos de bicicleta. Eu tinha uma Caloi vermelha.
Você foi prefeito da capital entre 1993 e 1996. Qual o seu legado para a ciclomobilidade e qual a sua avaliação sobre a atual condição da cidade para quem pedala?
Na época eu insisti muito nas ciclovias. Eu lembro que eu consegui implantar a ciclovia do São Lourenço, passando pelo Bosque do Papa, que o Jaime [Lerner, seu antecessor] já tinha feito. Fizemos a ponte coberta e fizemos a ciclovia chegar até o Parque Iguaçu.
Depois que deixamos a prefeitura, houve a ocupação irregular da chamada Vila Pantanal e a ciclovia do Parque Iguaçu foi tomada pela ocupação, o espaço tornou-se inseguro e perdeu-se o traçado que chegava até o zoológico. Esse espaço todo de ciclovias que a cidade possuía, chegava a 114 quilômetros [atualmente são 118]. Nem todas foram feitas por mim. O prefeito Saul Raiz começou, o prefeito Jaime Lerner também fez nos seus vários mandatos.
Hoje, você deixaria seus filhos, netos ou sobrinhos irem pedalando para o colégio? Como homem público, estimularia a família curitibana a fazer o mesmo?
Se houvesse segurança, sim. Se o colégio não fosse muito longe, também sim. Eu tenho um pouco de medo da barbárie do trânsito e da forma como os motoristas ainda tratam os ciclistas. Por isso que eu acho que nós devemos ter a cada ano 150 quilômetros de ciclovias e ciclofaixas até chegarmos a um horizonte de até 600 quilômetros de uma rede metropolitana.
Eu acho muito importante que os operários e os trabalhadores também sejam estimulados a usar a bicicleta, porque cada bicicleta na rua é mais saúde, menos doenças provocadas pelos gases dos escapamentos e, ao mesmo tempo, nós teremos mais urbanidade também. Mas é claro que os ciclistas também têm que respeitar as regras.
Seu plano de governo registrado no TRE fala em faixas exclusivas para circulação de bicicletas e bicicletas elétricas. Seu plano apresentado aos ciclistas cita a construção de 600 quilômetros de vias cicláveis. Como viabilizá-las? Quais são suas estratégias, planos e metas para tornar o trânsito de Curitiba mais amigável ao uso da bicicleta?
Eu acho que a cidade não precisa ser governada, a cidade precisa ser educada. Esse pensamento não é meu, é do Sócrates, filósofo que fundamentou a Pedagogia. A minha visão é de que nós podemos avançar e propor o novo. O rumoroso e numeroso movimento pela ciclomobilidade merece atenção mesmo que não votem em mim.
Eu imagino as ciclovias com 2,2 metros de largura, sinalizadas e protegidas, sempre que possível do lado direito da mão de tráfego para não mexer no alinhamento das estações tubos – o que exige investimentos altos. E fazer uma coisa digna e decente. Também podemos estimular, nos domingos, ruas onde o povo ande de skate e de bicicleta.
O ex-prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa, ao ser questionado sobre a retirada das áreas de estacionamento na capital colombiana para implantação de ciclofaixas, fez o seguinte comentário: “Estacionamento não é responsabilidade minha, é um problema privado. Eu também não digo onde você guarda sua roupa. O estacionamento não é um direito adquirido em nenhuma Constituição do mundo, ao contrário do direito de ir e vir”. Você concorda com essa interpretação?
Concordo. Enrique é um homem inteligente e um humanista. Eu o conheci em um seminário de prefeitos que ocorreu na Itália, em 2007. Ele é um homem muito interessante. Não há outro jeito, se você quer impor a ciclofaixa, alguma coisa tem que se mover no mundo. O automóvel individual, quando ainda é para o uso de cinco pessoas, ainda é aceitável. Mas o automóvel individual é gerador de impactos desfavoráveis na vida da cidade. O egoísmo anda de automóvel.
Desde 2009, cerca de 80 ciclistas morreram em acidentes nas ruas da capital. O que pretende fazer para reduzir essas estatísticas?
As ciclovias protegidas, educação para o trânsito e a intensificação do papel educativo da Setran e também a substituição dos radares traiçoeiros por lombadas eletrônicas, transformando a cidade em um amplo espaço de educação para a vida, para a urbanidade, para a civilização, longe dessa barbárie de uma gente aflita, estressada, angustiada, fazendo mal para todo mundo. Isso não é urbano e não é curitibano.
Você se comprometeria em exigir da Setran uma fiscalização efetiva, com autuação de motoristas que colocam ciclistas em situações de risco, a exemplo da CET de São Paulo?
Não tenha dúvida. Porque a proteção da vida é o primeiro dever do prefeito. E cuidar das pessoas é o principal dever da prefeitura.
Pretende implantar um sistema público de aluguel de bicicletas, a exemplo de São Paulo, Rio de Janeiro ou mesmo Toledo, no interior do Paraná?
Sim. De bicicletas e de carrinhos elétricos, tipo os Pompeus, os Twizers ou mesmo os DocDocs do Jaime Lerner se ele os puser em funcionamento. A minha cabeça é de profunda simpatia por tudo o que inove no espaço urbano.
Eu acho que, depois que eu deixei de ser prefeito, a cidade perdeu o seu compromisso com o futuro. Eu até quero voltar a ser prefeito para devolver Curitiba ao futuro. Vejo com tristeza a cidade ser transformada em uma grande metrópole só naquilo em que as metrópoles têm de pior, não naquilo que as metrópoles têm de melhor.
Enquanto deputado estadual e deputado federal, você apresentou algum projeto de lei ou emenda parlamentar voltada à questão da ciclomobilidade e ao estímulo do uso da bicicleta como meio de transporte?
Não. Não porque não me ocorreu. Eu trabalhei como deputado federal no Estatuto das Cidades. Ali sim se contempla a ideia das ciclovias, mas esse conceito é mais recente, não é um conceito daquele tempo em que eu fui deputado federal, o que já faz quase dez anos.
Você conhece a iniciativa do VotoLivre.org? Já votou? Se eleito, encamparia as propostas e enviaria à Câmara Municipal um projeto de lei semelhante, por iniciativa do Executivo?
Desconheço. Mas acho importante a consulta permanente à população, desde que exista meios para evitar fraudes. Sem dívidas a internet obriga as democracias repensarem os papéis dos colegiados ou dos parlamentos.
Hoje é muito mais ampla uma consulta que pode ser feita pela internet do que uma consulta à opinião de uma Câmara de Vereadores ou de uma Assembleia Legislativa. Temos que nos modernizar nisso. Tenho a ideia de realizar todo dia 29 uma consulta eletrônica, uma praça eletrônica, uma ágora eletrônica, como a da antiga Atenas.
O uso das bicicletas nas canaletas do ônibus expresso foi proibido em 1995, pelos decretos nº 696/95 e nº 759/95, durante sua gestão. Entretanto, apesar da proibição, as canaletas ainda são usadas como “grandes ciclovias informais”. Você se arrepende da decisão? Eleito prefeito, você a manteria?
Foi proibida por mim porque os meninos corriam risco de morte porque se agarravam nos ônibus biarticulados e isso era gravíssimo. Eu não proibi por ódio aos ciclistas, eu proibi por amor aos ciclistas, para protegê-los da morte.
Se elas fossem usadas sem risco, não haveria problemas, o problema é estabelecer o limite. O pessoal abusa e agarra na traseira do ônibus para não ter que pedalar. E isso é muito grave porque acaba culpando o motorista pela morte do ciclista. Imagine o que a Gazeta faria com o pobre motorista que matasse um ciclista que se agarrou na traseira do biarticulado.
Acho que, havendo as ciclofaixas, tem de se manter a proibição. Não dá para se admitir que as pessoas corram riscos. A gente não pode ser irresponsável. Mas pode haver dias em que as canaletas sirvam aos ciclistas.
Os decretos citados autorizavam apreensões das bicicletas, que só foram suspensas após o Ministério Público mover um processo administrativo por considerá-los inconstitucionais e sem amparo legal. Notícias da época indicam que, em apenas um mês de fiscalização, em setembro de 1995, a Prefeitura apreendeu 49 bicicletas, das quais apenas 22 foram devolvidas aos proprietários mediante o pagamento de multas. Já o total de apreensões, nunca foi oficialmente revelado. Como você avalia esse retrospecto?
Nem tenho conhecimento disso. Você acha que eu iria ficar com 30 bicicletas para mim? A medida coercitiva era necessária porque era uma medida didática. Na época havia repetidos casos de crianças sofrendo risco grave e acho que houve acidente pesado e foi por isso que eu tomei a iniciativa. Eu nunca fugi das minhas responsabilidades. Eu sempre fui um prefeito cuidador das pessoas. E a minha visão é de profundo respeito pela propriedade individual, pelas pessoas, mas eu acho que o dever do prefeito é também o de impedir um perigo maior. Perder a bicicleta é muito melhor do que perder a vida. Ou você acha melhor um ciclista morto, com a bicicleta de sua propriedade guardada em casa?
Eu faço a pergunta com base nos fatos e em notícias que pesquisei da época em que você foi prefeito. Você pensaria em fazer alguma regulamentação para o uso da bicicleta, como um cadastro municipal ou algo do gênero?
Você não pode apitar o jogo político pelo vídeo-tape. No tempo em que eu fui prefeito, eu não tinha o Código de Trânsito atual, que permite ao município intervir no trânsito. Quem podia era apenas o estado, por isso o MP teve o direito de me chamar a atenção. Eu não tinha dúvida, eu agia com o poder de mando porque eu estava investido do poder de mando.
Eu exerci a minha autoridade e sempre exercerei a minha autoridade. Eu não tenho medo de exercê-la. Se eu for eleito prefeito farei direito o meu ofício de prefeito. Eu não sou um banana!
Porque quem anda de bicicleta ou quem sonha em fazer isso com segurança, sem ter que com isso arriscar a própria vida, deve depositar seu voto em você?
Porque eu tenho experiência. Eu prometi duas Ruas da Cidadania e fiz oito. Eu prometi três postos de saúde 24 horas e fiz dez. Prometi resolver o problema da Vila Pinto e fiz o Bairro Novo, a Gleba da Ordem e as Moradias Santa Rita. Eu fui um prefeito superlativo perto daquilo que eu antes prometi. Imagine como eu vou ser agora…
Imagine que estamos em 31 de dezembro de 2016. Como você imagina que seria o título da matéria do Ir e Vir de Bike como o balanço da sua administração na área da ciclomobilidade?
“Curitiba inova e derrota a poluição”
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