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A Prefeitura de Curitiba terá de explicar ao Ministério Público do Paraná (MP-PR) porque deixa de aplicar a lei de trânsito na fiscalização e multa de motoristas que dirigem desrespeitando ou ameaçando ciclistas nas ruas da cidade.

Nesta semana, o MP-PR instaurou um procedimento administrativo interno para apurar eventual ilegalidade na omissão da Prefeitura e da Secretaria Municipal de Trânsito (Setran). A situação estaria manifestada pela não aplicação dos dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) que garantem a proteção dos usuários de bicicleta.

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O procedimento, que tramita no Centro de Apoio das Promotorias de Justiça de Habitação e Urbanismo, atende à representação proposta pela Associação de Ciclistas do Alto Iguaçu (CicloIguaçu). O pedido de providências da entidade tem como base matéria publicada pelo Ir e Vir de Bike que mostra que, em um universo de 2 milhões de multas aplicadas pela autoridade municipal de trânsito entre 2009 e 2011, apenas 4 — 0,0002%, ou, dois milionésimos do total — foram para punir motoristas que desrespeitaram ciclistas.

Neste mesmo período, entretanto, cerca de 80 ciclistas morreram vítimas de acidentes nas ruas da cidade, coroando Curitiba como a 6ª capital mais perigosa do país para quem pedala.

De acordo com o Sistema de Dados Operacionais do Corpo de Bombeiros do Paraná, entre 2009 e 2011 Curitiba contabilizou mais de 1,4 mil acidentes de trânsito que resultaram em ciclistas feridos e hospitalizados, uma média de 9 acidentes por semana, mais de um por dia.

Na comparação com as outras capitais da região Sul, a capital paranaense é de longe a mais violenta e concentra 67% dos acidentes fatais (36 mortes em 2010), seguida por Porto Alegre (9) e Florianópolis (2).

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Trâmitação

Segundo a assessoria de imprensa do MP-PR, o procedimento foi instaurado e, em breve, a Prefeitura e a Setran devem ser noticiadas oficialmente para se manifestarem acerca da representação. Ouvidas as partes, dependendo da conclusão do promotor, poderá ser aberta uma investigação, um inquérito civil público ou proposta uma ação judicial.

O pedido de providências pede a adoção, por parte do MP-PR, de toda e qualquer medida judicial e extrajudicial que coaja a administração pública municipal a cumprir e fazer cumprir a lei que garanta a segurança e preservação da vida de quem pedala.

Precedente paulista

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Em fevereiro deste ano, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) instaurou procedimento semelhante para apurar a omissão da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) na aplicação das leis de proteção aos ciclistas no trânsito.

A ação foi proposta pela jornalista e cicloativista Sabrina Duran, do blog Na Bike.

Entretanto, antes da conclusão do processo, a CET implantou a Campanha Pró-ciclista e passou a multar, amparada pelo CTB, os motoristas que se aproximam demais dos ciclistas, que ultrapassam de forma perigosa e sem reduzir a velocidade e que não dão preferência às bicicletas em conversões à direita. Apenas no primeiro mês de campanha, a CET aplicou 91 multas — média de três por dia.

As multas variam de R$ 53,20 (infração leve) a R$ 574,62 (infração gravíssima), além da aplicação de pontos na carteira de habilitação.

A fiscalização tem como parâmetro três artigos do CTB: o 169 (infração leve), que rende multa de R$ 53,20 e três pontos na carteira do motorista que “dirigir sem atenção ou sem os cuidados indispensáveis à segurança”; o 197 (infração média, multa de R$ 85,13, mais quatro pontos), que penaliza quem “deixar de deslocar, com antecedência, o veículo para a faixa mais à esquerda ou mais à direita, dentro da respectiva mão de direção, quando for manobrar”; e o 220 que, entre outras coisas, penaliza o motorista que “deixar de reduzir a velocidade” ao se aproximar de manifestações, cortejos, ou ao “ultrapassar ciclistas” (infração grave, cuja multa é de R$ 127,69, mais cinco pontos).

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A CET também reforçou a fiscalização de outras duas regras do CTB: o artigo 181, que considera multa grave estacionar em faixas destinadas a pedestres, ou em ciclovia e ciclofaixa (multa de R$ 127,69 e cinco pontos na carteira); e o artigo 193, que também proíbe o trânsito de veículos sobre ciclofaixas e ciclovias (infração gravíssima, cuja multa é de R$ 574,62, mais sete pontos).

Enquanto isso, em Curitiba…

Antes mesmo de ser notificada pelo MP-PR, a Setran já informou, em resposta a um pedido de informações formulado pelo blog com base na Lei de Acesso à Informação (nº 12.527/2011), que “já está sendo estudada uma forma ou quais os casos em que o artigo nº169 do CTB poderia ser aplicado”.

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Ao mesmo tempo, o documento responde de forma esquiva e lacunosa para demonstrar suposta dificuldade na aplicação efetiva das normas de trânsito. Aquelas mesmas normas, regidas pelo mesmo CTB, que são legalmente aplicadas pelo órgão competente de São Paulo.

O ofício, assinado pelo secretário de Trânsito Marcelo Linhares Frehse, usa o tecnicismo na tentativa de descaracterizar a “ultrapassagem” para justificar as chamadas “finas educativas” e a não aplicação do artigo 220 para coibir essa prática criminosa. Ao mesmo tempo, o documento revela profundo desconhecimento do CTB e da própria realidade das ruas ao afirmar que “a bicicleta em princípio transita junto a guia”.

“Porra! Esses ciclistas querem agora que eu comece a multar motoristas?!?”, teria dito o secretário ao comentar o pedido de informações, segundo fontes no blog de dentro da própria Setran.

Cabe aqui responder: não, Sr. Secretário. O que os ciclistas pedem é apenas que a lei seja aplicada como determina o próprio Código nos incisos I, II, VI, e VII do artigo 24º.

Mas, a partir deste momento, quem pede explicações é o Ministério Público. E sua resposta, certamente, terá de ser melhor qualificada e mais bem embasada que a que foi enviada a este ciclista-blogueiro.

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Mas, ao invés de buscar novas desculpas ou estratagemas jurídicos para se omitir, a Setran deveria seguir o exemplo da CET e assumir de uma vez seu papel, atribuindo aos agentes o dever de fiscalizar e fazer cumprir as leis de trânsito.

Neste caso, a escolha é entre poupar trabalho ou poupar vidas. É certo que, mais cedo ou mais tarde, a Justiça e o MP farão com que as coisas funcionem como realmente devem ser. Entretanto, seria muito mais digno se essa iniciativa partisse da própria Setran.

Clique aqui e lei a íntegra da representação do MP-PR

Clique aqui e leia as justificativas da Setran para a não aplicação do CTB

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