É estranha a sensação de ter certa familiaridade com o palco de uma grande tragédia. Em março, enquanto participava do Tour d´Afrique, ficamos dois dias em Nairobi, há apenas três quarteirões do shopping Westgate, palco de um atroz atentado terrorista que deixou cerca de 70 mortos e centenas de feridos no último sábado (22).
No exato instante em que leio a notícia pela internet, ainda pela manhã, recebo uma mensagem do meu amigo italiano Marco, colega do TDA, questionando se aquele shopping é o mesmo em que estivemos há alguns meses. Sim, é exatamente o mesmo.
Vendo as fotos da tragédia, vou reconhecendo pontos familiares. Uma me chama mais a atenção: agentes armados caçam terroristas no interior da mesma bicicletaria em que comprei as câmaras de ar de 29”, que me permitiram chegar até a Cidade do Cabo de bicicleta.
Depois de dois meses pedalando pelos desertos do Egito e Sudão e enfrentando pedradas das criancinhas etíopes, foi na capital queniana que encontramos pela primeira vez alguns “luxos” da civilização ocidental. Era o primeiro shopping center de verdade, um dos símbolos do progresso econômico no Quênia. Lá, nos demos o direito a pequenos luxos como comer frango frito do KFC, tomar sorvete italiano e beber um chope gelado com os amigos.
Com internet wi-fi gratuita e de boa qualidade (dificilmente na África as duas coisas ocorrem simultaneamente), durante dois dias, a praça de alimentação do shopping virou uma espécie de escritório de coworking – com mais de 50 ciclistas de 15 diferentes nacionalidades espalhados pelas mesas, atualizando perfis nas redes sociais, postando fotos e conversando com as famílias pelo Skype. Lá passei horas narrando minhas aventuras e desventuras para minha esposa no Brasil.
O Westgate também nos ofereceu outras mordomias. Caixas eletrônicos com saque em dólares americanos ou shillings. O banheiro limpo e cheiroso era um verdadeiro oásis para quem passou semanas cavando buracos na areia feito gato ou se aliviando atrás de arbustos. A pia com espelho grande e bem iluminado era perfeita para se fazer uma barba bem feita.
No supermercado Nakumati, encontramos itens de primeira necessidade: papel higiênico, pomada para assaduras, xampu e sabonete. Ainda no mesmo critério, pude achar também uma garrafa de cachaça brasileira (Sagatiba), que comprei e guardei para preparar uma caipirinha na ocasião do meu aniversário de 30 anos, comemorado dali a alguns dias.
O Quênia foi um momento muito especial da viagem. Nos dois dias de descanso em Nairóbi, o shopping Westgate foi mais que a nossa sala de estar. Ali, nos sentimos em casa. Uma tragédia humana, como o massacre terrorista naquele local, por si só, choca. Mas ter algum tipo de laço afetivo com o local do episódio torna tudo ainda mais perturbador.
Julgamento do Marco Civil da Internet e PL da IA colocam inovação em tecnologia em risco
Militares acusados de suposto golpe se movem no STF para tentar escapar de Moraes e da PF
Uma inelegibilidade bastante desproporcional
Quando a nostalgia vence a lacração: a volta do “pele-vermelha” à liga do futebol americano
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS