Na semana passada, os deputados estaduais do Paraná protagonizaram a segunda temporada de sessões parlamentares no palco da Ópera de Arame. Tal como fizeram os vereadores de Curitiba, em 2017, os deputados se isolaram na casa de espetáculos para uma performance grotesca. Com a Polícia Militar na plateia, na bilheteria e nos camarins, os parlamentares encenaram uma sessão plenária, que, apesar do jeito de ensaio, teve resultados concretos, o principal deles a aprovação de uma reforma na Previdência dos servidores estaduais.
Apesar de a faceta um tanto absurda do teatro ensejar uma análise simplória de acusação ao governo, aos deputados ou aos sindicalistas que invadiram o plenário da Assembleia Legislativa – a depender do ponto de vista do acusador – é importante entendermos o caminho que fez da política local esse triste espetáculo.
Nos últimos anos – especialmente após a crise fiscal que assolou os estados brasileiros – o gasto com servidores ativos e inativos do estado tem crescido em ritmo superior ao da receita. Especialmente durante a gestão do ex-governador Beto Richa (PSDB), o Palácio Iguaçu insistiu na narrativa de que esse crescimento era derivado de aumentos salariais irresponsáveis concedidos aos servidores públicos. Houve até uma tentativa patética de distorcer dados públicos para insinuar que era comum que professores recebessem salários maiores que prefeitos no interior do Paraná.
Essa tese desconsidera o fato de que, especialmente no Executivo, o aumento na despesa com pessoal não tem apenas relação com aumentos salariais, mas também com a expansão da oferta de serviços públicos, conforme demanda da população. Lembremos que a maior parte dos servidores ligados ao Executivo são professores e policiais.
Outro dado que evidencia a fragilidade dessa narrativa em que Richa insistiu – e que deixou herdeiros no Palácio Iguaçu – é a média salarial no Poder Executivo. Enquanto funcionários da Assembleia Legislativa recebem, em média, R$ 10 mil; do Tribunal de Justiça, R$ 11 mil; do Ministério Público, R$ 18 mil; e do Tribunal de Contas, R$ 22 mil; o salário médio no Executivo é de R$ 5 mil.
Não é justo nem razoável, portanto, que tratemos os servidores públicos do Paraná como marajás.
Acontece que essa retórica na qual os governantes vêm insistindo há um tempo gerou forte animosidade na relação com os servidores. A partir dessas provocações o diálogo foi ficando cada vez mais inviável, os acordos mais distantes, e a desconfiança virou a tônica da relação entre o governo do Paraná e seus servidores.
A esse movimento quase subjetivo, somaram-se fatos objetivos: o não pagamento dos reajustes salariais devidos, a cicatriz deixada pela Batalha do Centro Cívico, em 29 de abril de 2015, o abismo que se abriu entre as carreiras dos diferentes poderes e o fim de benefícios aos servidores, entre eles a licença-prêmio, extinta no Executivo, mas mantida no Tribunal de Justiça e em vias de ser recriada para o Ministério Público.
O último ingrediente nesse caldo de intolerância ente o governo e os servidores é uma excessiva subserviência da Assembleia Legislativa ao governo do Paraná. Ao aprovar em apenas 15 dias uma reforma que tem efeitos práticos na vida das pessoas – sem abrir possiblidade para discussões – a Assembleia impede que as vozes moderadas falem. E aí só resta o grito aos que se sentem prejudicados. Ao contrário do que a maioria dos deputados quer fazer crer, a negociação e a participação de opiniões divergentes não são um detalhe no processo legislativo.
Todo esse percurso levou os sindicalistas a encararem com normalidade a invasão da Assembleia Legislativa. Não há como negar, nem como aceitar, as cenas de violência causadas pelos manifestantes na semana passada.
Diante de todo esse contexto, governo e Assembleia precisaram, mais uma vez, recorrer ao triste expediente de votarem questões relevantes fora da sede do Poder Legislativo, sob ostensiva proteção da Polícia Militar. Que a sessão tenha acontecido num dos mais charmosos palcos da cidade, é um detalhe triste, mas que evidencia que se os processos decisórios forem apenas encenações para cumprir exigências legais, os atos públicos perdem legitimidade.