Em todas as oportunidades que têm para agir de acordo com a realidade orçamentária do estado do Paraná, o Ministério Público Estadual e o Tribunal de Justiça decepcionam. Das ilhas de prosperidade onde habitam parecem não ver um orçamento anual cada vez menos capaz de garantir a prestação de serviços básicos à população. Na ação perdulária mais recente, o Procurador-Geral de Justiça, Ivonei Sfoggia, enviou à Assembleia Legislativa um projeto de lei que recria a licença-prêmio, extinta em outubro.
Eis o contexto: o governador Ratinho Junior (PSD) enviou ao Legislativo uma proposta para extinguir a licença-prêmio dos servidores do Executivo. O projeto levou de carona a Assembleia Legislativa e o Ministério Público, que, por não terem legislação própria regulamentando o benefício, usavam a norma do Executivo, que foi revogada. Para garantir o benefício aos seus, o MP o incluiu no Regime Jurídico dos Servidores do Ministério Público do Estado do Paraná, que foi encaminhado na segunda-feira (25) para análise dos deputados estaduais.
Se a proposta for aprovada, membros e servidores do Ministério Público e Tribunal de Justiça serão os únicos no Paraná a terem direito ao benefício da licença-prêmio. A média salarial no MP é de R$ 18 mil e no TJ, R$ 11 mil.
A situação fica ainda menos justificável sob argumentos republicanos ao olharmos para o funcionamento do benefício. A licença-prêmio dá aos servidores o direito de três meses de licença remunerada a cada cinco anos de trabalho. Caso o benefício não tenha sido gozado, no momento da aposentadoria ou desligamento do órgão, o servidor recebe a compensação financeira. A condição para ter acesso ao benefício, no caso do MP, é não ter mais de cinco faltas não justificadas ao longo de cinco anos. O nome completo do benefício é, afinal, licença-prêmio por assiduidade. O estado está premiando servidores que recebem R$ 18 mil por mês pelo extraordinário fato de não faltarem injustificadamente ao trabalho. Ou pelo menos não mais de cinco vezes a cada cinco anos.
Por ser praticamente indefensável, especialmente em momentos de crise fiscal, é que a licença-prêmio é um benefício em extinção – na verdade, em transformação. Em 1996, a União a substituiu pela licença-capacitação, que prevê que para gozar do benefício o servidor deve ter feito um curso de aperfeiçoamento reconhecido como de interesse pelo governo. Esse foi o mesmo caminho trilhado pelo governo do Paraná.
A inciativa do Ministério Púbico gerou críticas públicas na Assembleia Legislativa. Algo incomum de acontecer, já que os deputados raramente estão dispostos a comprar briga com juízes e promotores. Hussein Bakri (PSD), líder do PSD, foi à tribuna da Alep criticar a proposta.
“Tenho um profundo respeito pelos membros do MP, que exercem um papel importante na vida do Paraná, mas eles precisam fazer uma reflexão sobre esse gesto. Foi uma surpresa desagradável, afinal recém saímos de um processo em que acabamos com a licença-prêmio dos poderes. Portanto, é uma proposta extemporânea e desprovida de qualquer bom senso. Como vamos privilegiar uma classe em detrimento das demais? Não se trata de o MP ter orçamento próprio ou não. Agora, é a hora de todos darem sua parcela de contribuição e sacrifício para ajudar o país. Sou totalmente contrário a esse projeto”, afirmou.
O presidente da Assembleia, Ademar Traiano (PSDB), já deu pistas de que o projeto não será aprovado com facilidade na Casa.
“Eu acho que não há ambiente. É importante que se diga que a cultura hoje no Plenário da Casa é de não aprovarmos mais matérias dessa natureza. Nesse momento não deve ir à apreciação”, disse.
Essa resistência dos demais poderes – especialmente o Judiciário – em acompanhar os esforços de redução de gastos tem incomodado o governo do Paraná desde a gestão de Beto Richa (PSDB). O ex-secretário da Fazenda, Mauro Ricardo Costa – que cunhou o termo ilhas de prosperidades – tentou reduzir os repasses com a proposta de retirar o Fundo de Participação dos Estados (FPE) do cálculo de distribuição do bolo orçamentário reservado aos poderes. A medida não prosperou. Ao enviar a primeira versão do orçamento de 2020 à Assembleia, o governador Ratinho Junior tentou repetir a estratégia, mas, novamente, a resistência foi forte e a ideia não prosperou.