Quem acompanha a atividade parlamentar apenas pelas redes sociais deve ter a impressão de que alguns se afogam – enquanto outros surfam – em um mar de novidades. No Facebook, no Twitter e no Instagram os deputados alimentam seus seguidores com polêmicas e levam ao limite a desconstrução da imagem tradicional de um político. É o espírito do tempo; é o que rende visibilidade. Mas, postagem não é requerimento, curtida não é coautoria e comentário não é aparte. A atividade parlamentar tem sua arena oficial própria e para acessá-la temos que digitar outro endereço em nosso navegador que não o das redes sociais.
O repositório formal das ações dos parlamentares são os sistemas de proposições legislativas. E, ali, olhando para os deputados federais e estaduais do Paraná, entre protocolos, assinaturas e pareceres, para decepção dos novidadeiros, está tudo muito parecido com o que tem sido nos últimos anos.
Os problemas reais, tais como segurança, mobilidade, previdência, emprego e tributos, continuam ocupando muito mais espaço formal na atividade política que as espumas que têm entupido o debate público, como o fantasma da doutrinação comunista e a censura a exposições de arte.
Não que o processo legislativo não esteja refletindo a clivagem direita/esquerda que tem motivado os debates online, mas nos parlamentos, com os freios e o tempo próprio do processo legislativo, as discussões e as divisões acontecem ao redor de temas mais sólidos.
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Em Brasília, deputados paranaenses já apresentaram 97 projetos de lei, desconsiderados dessa conta os requerimentos. Na relação, há pouca espuma. Entre as propostas estão questões relativas à segurança de barragens, a direitos do consumidor, saúde, violência contra a mulher e diversos outros assuntos.
Na Assembleia Legislativa, a situação é similar: temas de muito destaque nas redes sociais não reverberam tanto na arena formal. Com isso, está tudo meio parecido com o que era no passado. Inclusive com os mesmos vícios.
Os problemas que saltam aos olhos são a insistência dos parlamentares em querer criar benefícios para setores específicos e em transformar qualquer assunto, por menor que seja, em objeto de regulação. Nenhuma novidade nesse ponto.
Se depender de boa parte dos legisladores paranaenses, o estado em breve não mais arrecadará ICMS e IPVA. Cada deputado, com argumentos e justificativas que lhes parecem razoáveis, pede que setores com os quais têm relação sejam isentos de pagamento dos tributos estaduais. Porque enfrentam muita chuva e intempéries nas estradas, é justo que os representantes comerciais não paguem IPVA dos veículos que usam para trabalhar; porque as igrejas têm imunidade tributária, os prédios anexos aos locais de culto que também pertençam à igreja não devem pagar ICMS de água, luz, telefone e gás.
As micro-obrigações também continuam sendo um gênero comum de projetos de lei na Assembleia Legislativa. Em 2019, há alguns bons exemplos: o deputado Rodrigo Estacho (PV) quer obrigar as escolas estaduais a afixarem cartazes sobre a importância da reciclagem do lixo. Já o deputado Galo (Podemos) propôs a proibição da confecção e utilização de tapetes ou similares com imagens dos símbolos do Estado do Paraná.
Se na era das redes sociais os vícios dos parlamentares continuam os mesmos, as virtudes também não mudaram.
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Um momento de destaque da Assembleia Legislativa em 2019 foi quando o deputado novato Soldado Fruet (Pros) forçou o governo a reconhecer que o projeto de reestruturação administrativa que encaminhou ao Legislativo sob o argumento da economicidade e da redução da máquina pública, na verdade aumentava os gastos correntes do estado.
Após a divulgação de um estudo feito pelo gabinete do deputado, o governo se comprometeu a corrigir a proposta para que ela, de fato, trouxesse economia na gestão da máquina pública.
As redes sociais sem dúvidas são fundamentais para que os parlamentares atuem na dimensão retórica do mandato, mas isso diz muito mais respeito a seu sucesso de votos e à consolidação de sua imagem pública que, de fato, ao trabalho para o qual foi escolhido. O que os deputados publicam, importa; mas o que eles assinam e protocolam deveria importar muito mais.