Quando subiu à tribuna da Assembleia Legislativa do Paraná na terça-feira (9), antes de começar seu discurso, o deputado Ricardo Arruda (PSL) ajeitou os microfones da Casa e colocou outro em seu bolso, provavelmente conectado à câmera do assessor que o filmava. Ali o parlamentar já deu pistas de que sua plateia não estava em plenário, mas no Facebook. Naquela tarde, os deputados discutiam a possibilidade de pagar a data-base dos servidores estaduais, que desde 2016 estão sem reajustes. Nas galerias, um número não tão grande de grevistas impacientes pressionava os deputados.
Arruda fez um discurso desastroso na forma e no conteúdo. Debochando dos servidores que acumulam perdas salariais de cerca de 17%, o deputado recorreu à retórica utilizada em ataques nas redes sociais. Mas ali, sem a claque virtual, cada frase parecia uma piada sem timing nem graça.
Em sua fala, o parlamentar usou um apelo tão gasto quanto injusto: a de criar a ideia de que os professores da rede estadual de ensino são marajás com altos salários e baixa produtividade. A tática já foi utilizada por Beto Richa (PSDB), quando começou a suspender o pagamento do reajuste anual dos servidores, e não resistiu a uma análise atenta dos salários publicados no Portal da Transparência. Arruda disse que mostraria no telão da Assembleia o contracheque dos professores e exporia como são muito bem remunerados. Naturalmente ele não fez isso, porque essa tese sucumbiria diante dos fatos.
Numa lógica idiossincrática, o deputado sugeriu que apenas os servidores das forças de segurança do estado recebam o reajuste salarial. Para Arruda, sabe-se lá por qual critério – provavelmente o de nicho eleitoral –, esses, sim, são merecedores de aumento.
O discurso de Arruda, que estava sendo acompanhado também pelos servidores fora do plenário, revoltou a plateia real que forçou a entrada e lotou as galerias da Assembleia. A consequência do desastrado pronunciamento foi o acirramento dos ânimos na já tensa negociação entre servidores, governo e Assembleia – um resultado pouco louvável para o trabalho de um deputado da base do governo.
Esse episódio deixa claro dois limites do discurso radical quando se depara com a realidade. O primeiro deles é o fato de ser incapaz de resolver problemas. A tensão, os gritos e as polêmicas (essa palavra odiosa) dão conta de apresentar soluções aos problemas imaginários, criados para ser campo de batalha, mas nãos aos problemas de verdade. Diante do fato de os servidores pressionarem por um reajuste que é devido, o governo vinha adotando a compreensível postura da responsabilidade fiscal. Como já escrevi anteriormente neste espaço, os dois lados tem justas razões para agir como agem.
O governo sabe das consequências de dar calote no reajuste por mais um ano e justamente por isso vem dando à negociação ares de gravidade e responsabilidade que o assunto merece. Não imagino que as cabeças sérias do Palácio Iguaçu neguem a reposição por estarem convencidos de que estão negociando com barões do ensino público, como faz crer Arruda.
A segunda falha do discurso radical é a facilidade com que se torna incoerente. Arruda, que da tribuna agia como leão-de-chácara dos cofres estaduais, justificava seu posicionamento dizendo valorizar o dinheiro do imposto pago pelos paranaenses. Ora, se for de fato isso, em que momento desse raciocínio há espaço para que o deputado tenha tantos parentes nomeados em cargos em comissão do governo estadual? Elaine Arruda Nunes, irmã do parlamentar, recebe R$ 8,9 mil mensais no Departamento de Imprensa Oficial do Estado e Alessandra Arruda Nunes Morano, sua sobrinha, tem salário de R$ 9,6 mil no Instituto Paranaense de Ciência do Esporte.
Na gestão anterior, o filho e a esposa de Arruda também tinham cargos no governo do estado. Em 2018, aos 25 anos, o filho ocupou cargo de gerência na Agepar. Ao ser questionado sobre o fato, o deputado afirmou não ter interferido, só ter passado os e-mails e telefones de contato da vaga para que o filho enviasse seu currículo.
Se o exemplo de Arruda parece limitado para apontar os limites práticos do radicalismo, temos ainda a reforma da Previdência. Quem está sendo louvado pela aprovação do texto não é o presidente Jair Bolsonaro (PSL), que com seus arroubos erigiu barreiras à articulação, mas Rodrigo Maia (DEM), um membro nato da velha política, tida pelos radicais como a mãe dos males públicos. Como sabem os políticos, mesmo que finjam o contrário, não há soluções simples e unilaterais. Os assuntos públicos são resolvidos com diálogo, negociações e responsabilidade.
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