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Esta semana soubemos pela imprensa que assessores do Ministério da Justiça receberam na sede do ministério a mulher de um conhecido traficante do Comando Vermelho no estado do Amazonas – o Tio Patinhas, preso em 2022 e condenado em outubro passado a mais de 31 anos de prisão por tráfico de drogas, participação em organização criminosa e lavagem de dinheiro. A mulher, cuja alcunha é sugestiva, “Dama do Tráfico”, assim como o marido já foi condenada pela Justiça, a 10 anos de prisão por atuar na lavagem de dinheiro do tráfico, mas aguarda em liberdade o julgamento de recursos. Ela foi recebida em Brasília como presidente da Associação Instituto Liberdade do Amazonas (ILA), uma ONG de defesa dos direitos dos presos. Segundo a polícia civil do Amazonas, a ONG atua em prol dos detentos ligados ao Comando Vermelho. A organização também seria financiada com dinheiro do tráfico. Coisa muito linda.
O que era já ruim, fica ainda pior. A viagem foi custeada com recursos públicos, ou seja, pagos por você e por mim, e todos os brasileiros que pagam impostos. O Ministério dos Direitos Humanos pagou as passagens de ida e volta entre Manaus e Brasília e também diária para que a Dama do Tráfico participasse de um evento de combate à tortura no dia 6 de novembro no Distrito Federal. O ministério de Silvio Almeida confirmou o pagamento em nota, esclarecendo que pagou as despesas de todos os participantes do evento.
O que interessa é tachar tudo aquilo que não lança aplausos e incensos a Lula e sua trupe de fake news.
Pode piorar? Claro que sim! E é justamente esse o ponto que mais nos interessa. Na defesa de seu braço-direito Flávio Dino, que poderá em breve ser colocado em uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente petista em terceiro mandado usou as palavrinhas mágicas que usa sempre que quer tentar desmentir algum escândalo: fake news. Em suas contas nas redes sociais, Lula escreveu que "As acusações infundadas contra o ministro Flávio Dino são irresponsáveis. Presto, também, todo meu apoio ao amigo Dino e contra quem promove ódio e fake news" (grifo meu).
De tanto ser usado e reusado, nem sempre paramos para pensar no que, de fato, significa o termo fake news – ou o que certos grupos querem que ele signifique. Na verdade, ainda há muita discussão em torno do que define algo como fake news, em especial no que se refere à estrutura de distribuição de uma informação falsa. Embora existam aqueles que veem qualquer notícia ou informação falsa como sendo uma fake news, outros – e me incluo entre eles – só consideram algo como fake news quando há a real intenção de usar uma informação sabidamente falsa em proveito próprio ou contra o oponente, ou seja, quando a pessoa que divulga a informação sabe que se trata de algo falso, mas mesmo assim a divulga porque tem algo a ganhar com isso.
Uma notícia ou informação verdadeira jamais poderia ser chamada de fake news. A menos que estejamos em uma distopia
Essa distinção é importante porque evita que conteúdos que as pessoas divulgam ou repassam com boa-fé, sem saber que se trata de algo errôneo, algo sem comprovação ou mesmo outros tipos de conteúdos como opiniões e posicionamentos divergentes, possam ser enquadrados na mesma categoria das mentiras estrategicamente criadas por grupos de marketing para promover uma pessoa ou ideia (ou prejudicar o concorrente).
Mas mesmo ainda existindo divergências sobre como caracterizar uma fake news, em ao menos um ponto todos parecem concordar: uma fake news é essencialmente algo falso (fake). Uma notícia ou informação verdadeira jamais poderia ser chamada de fake news. A menos que estejamos em uma distopia – aquelas sociedades ficcionais, que deveriam ficar apenas no reino da imaginação. Numa distopia até faz sentido chamar de fake news a verdade e de verdade as mentiras: no reino das fantasias, tudo é permitido; então esse tipo de estratégia não causaria espanto.
O problema é que não estamos em meio a uma novela orwelliana: é no Brasil real que um presidente e seus ministros tentam chamar de fake news uma matéria jornalística devidamente comprovada e fartamente documentada, incluindo pelo personagem principal, a tal Dama do Tráfico, e até o próprio governo, que admitiu a veracidade de todas as informações divulgadas. Assessores do Ministério da Justiça receberam a Dama do Tráfico, que foi à Brasília com as despesas pagas pelo Ministério dos Direitos Humanos. Os fatos são esses, comprovados, e não questionados nem mesmo pelo governo. Ainda assim, eles usam o termo fake news para se referir à matéria. Como assim?
Muito simples. Se para quem estuda o assunto definir fake news é trabalhoso, para Lula, seus ministros e apoiadores, é muito, mas muito fácil. Fake news no dicionário do lulopetismo – e de qualquer governo autoritário, seja de direita, esquerda ou centro – é toda reportagem, matéria, artigo, comentário, opinião, sinal de fumaça ou qualquer forma de expressão que ouse questionar a santidade dos membros do governo ou aponte que há algo de podre no reino do Planalto.
No caso da Dama do Tráfico e de tantos outros escândalos que já aconteceram e ainda vão acontecer, não importam os fatos, imagens, dados, comprovação, muito menos a verdade. O que interessa é tachar tudo aquilo que não lança aplausos e incensos a Lula e sua trupe de fake news. No grito, acusando reportagens sérias de fake news, eles querem calar qualquer voz discordante. Coisa bem típica das ditaduras. Alguma surpresa? Nenhuma.