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Jogos de Guerra

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Coluna semanal com reportagens exclusivas sobre assuntos militares, indústria bélica, forças armadas, zonas de conflito e geopolítica, com o jornalista Luis Kawaguti. Assista também à live semanal no canal do YouTube da Gazeta do Povo.

Logística da guerra

Ataque à base militar no oeste da Ucrânia foi tentativa de cortar linha de suprimentos

A base militar de Yavoriv foi alvo de ao menos 30 mísseis disparados por aeronaves russas entre 5h e 6h deste sábado. (Foto: Reprodução / YouTube)

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O ataque à base militar ucraniana de Yavoriv, cerca de 15 quilômetros distante da fronteira da Polônia, foi uma tentativa da Rússia de desorganizar as linhas de suprimento de armas enviadas pelo Ocidente à Ucrânia. O bombardeio ocorreu um dia após o presidente americano Joe Binden anunciar a disponibilização de mais US$ 200 milhões (R$ 1 bilhão) em ajuda militar para a Ucrânia.

A base militar foi alvo de ao menos 30 mísseis disparados por aeronaves russas entre 5h e 6h deste sábado (0h e 1h no horário de Brasília). Ao menos 35 pessoas morreram e 134 ficaram feridas.

Yavoriv fica a 50 quilômetros de Lviv, a maior cidade do oeste do país, que vem servindo como porta de saída para milhares de refugiados para a Polônia e a Eslováquia.

Segundo a Rússia, a base atacada neste domingo era usada para o treinamento de “mercenários” e para a estocagem de armas envidas pelo ocidente. Antes do ataque, a Rússia havia afirmado aos Estados Unidos que “enviar armas não é apenas um movimento perigoso, é uma ação que faz desses comboios alvos legítimos”, segundo o chanceler adjunto da Rússia, Sergei Ryabkov.

A instalação militar, que ocupa uma área de mais de 300 quilômetros quadrados, era conhecida na Ucrânia como Centro Internacional de Manutenção da Paz e Segurança. Antes da guerra, o local era utilizado para exercícios militares envolvendo forças da Ucrânia e da Otan (aliança militar ocidental).

Combatentes internacionais

Não há notícia até o momento que a Ucrânia esteja usando mercenários na guerra contra a Rússia. No entanto, Moscou poderia estar se referindo a combatentes da legião internacional - cidadãos de países como Inglaterra, Escócia, Irlanda, Portugal, Alemanha e Estados Unidos que viajaram de forma voluntária para defender a Ucrânia.

Eles não recebem pagamento por seus serviços, pelo contrário, viajam por ideologia e com os bolsos cheios de dinheiro para adquirir armamentos e pagar por suas despesas. É possível encontrá-los praticamente em cada esquina de Lviv. O governo do presidente Volodymyr Zelensky tem incentivado a participação deles. A legião internacional teria recebido mais de 20 mil combatentes nos últimos dias.

A base de Yavoriv poderia estar sendo usada como centro de treinamento para parte desses voluntários, informação que não foi negada nem confirmada pelas autoridades ucranianas. A prefeitura de Yavoriv disse que não poderia afirmar se os mortos e feridos eram ucranianos ou estrangeiros “para não dar informações para o inimigo”.

O governo americano afirmou que não havia militares americanos atuando na instalação desde o início da guerra. Porém, é notório que a Ucrânia recebeu ajuda de militares de forças especiais americanas e britânicas desde 2014, quando separatistas russos dominaram as províncias de Luhansk e Donetsk. Eles atuavam como consultores, auxiliando as forças ucranianas para resistir contra uma eventual ofensiva russa.

Ainda não está claro nesta guerra se unidades de comando e forças especiais do Ocidente estão ou não operando sem identificação em apoio às forças ucranianas.

Logística de armas

Os Estados Unidos e seus aliados europeus têm enviado armas antitanque e antiaéreas para auxiliar as forças ucranianas mesmo antes do início da guerra. A ajuda militar americana à Ucrânia no ano passado foi de mais de US$ 1 bilhão. Segundo o jornal New York Times, só na semana passada foram enviados mais de 17 mil desses armamentos de forma sigilosa para território ucraniano.

Entre essas armas estão lança-mísseis portáteis Javelin, capazes de destruir blindados pesados e até mesmo helicópteros de ataque russos, e foguetes antitanque M72 (a evolução da bazooka da Segunda Guerra). Também estão sendo fornecidos mísseis antiaéreos Stinger, que podem ser usados para abater aeronaves que operam em baixa altitude.

O envio desse tipo de armamento, considerado de “defesa”, ocorreu ao logo de diversos conflitos do século passado, sem deflagrar conflito direto entre as grandes potências.

Por exemplo, na Guerra do Vietnã (1955-1975), a União Soviética forneceu armamentos de defesa para os vietnamitas combaterem os americanos. Quando a União Soviética enfrentou o Afeganistão (1979-1989), os EUA enviaram mísseis portáteis aos afegãos, que dificultaram a ação dos soviéticos. Mas, em nenhum momento isso levou a um confronto direto entre Moscou e Washington.

Acredita-se que esses armamentos estejam entrando na Ucrânia por via terrestre, pelas fronteiras da Romênia e da Polônia. Segundo o Wall Street Journal, só no sábado sete aviões cargueiros militares vindos de países da Otan pousaram no aeroporto de Rzeszow, no sul da Polônia. Não está claro como eles estão cruzando a fronteira e se realmente foram estocados em Yavoriv.

“Provavelmente a inteligência de Moscou apontou que essa base de treinamento ucraniana bem próxima da fronteira da Polônia deveria ser um ponto de recebimento de armas. Não temos como afirmar se estava acontecendo ou não, mas faz sentido pela posição geográfica. É uma maneira de mostrar que ele não vai hesitar em fazer esse tipo de bombardeio quando ele tiver um alvo na Ucrânia que ele ache que seja legítimo e compensador”, afirmou o analista militar e coronel da reserva do Exército Brasileiro, Paulo Roberto da Silva Gomes Filho.

Por isso, o ataque à base ucraniana e também bombardeios realizados no fim de semana contra as cidades de Lutsk (cidade na fronteira com a Polônia que é parte da principal rota rodoviária para Kiev) e Ivano-Frankivsk (fronteira com a Romênia) vêm sendo interpretados por analistas como uma advertência dos Russos à Otan.

Os comboios cobertos de sigilo que estão levando esses armamentos para diversas frentes de batalha na Ucrânia podem, a partir de agora, passar a ser alvo constante da aviação russa caso sejam identificados pela inteligência do país.

Os EUA e a Otan já sabiam que a janela de oportunidade para colocar essas armas em solo ucraniano estava se fechando, pois mais cedo ou mais tarde a Rússia começaria a bombardear as linhas de suprimento da Ucrânia.

O que não se sabe é se Moscou pretende desestabilizar a logística ucraniana somente com bombardeios ou se pode tentar capturar cidades e territórios no oeste do país.

Frente oriental

Enquanto começa a atacar linhas de suprimento no oeste ucraniano, a Rússia parece iniciar neste fim de semana importantes ofensivas no leste e no norte do país.

Militarmente, a mais importante ocorre na parte mais oriental da Ucrânia. Segundo relatório de inteligência britânico divulgado neste domingo (13), forças russas começam a avançar para o sul, a partir da cidade de Kharkiv, e para o norte, a partir de Mariupol. Caso elas se encontrarem na região central do país, todas as tropas ucranianas que formam uma linha de contenção dos separatistas russos instalados em Luhansk e Donetsk desde 2014 ficarão cercadas.

Se esse cenário começar a se concretizar, possivelmente o exército ucraniano terá que se retirar mais para oeste para não ser encurralado. Isso daria à Rússia uma vitória de grandes proporções na frente oriental.

Já em Kiev, ao norte, a Rússia busca um objetivo mais político do que de relevância militar. Tropas de quatro exércitos começam a fechar um cerco em volta da capital. Segundo fontes ligadas à legião internacional que combate em Kiev, tropas blindadas de reconhecimento russas já estão em choque contra os defensores da capital.

Contudo, a cidade ainda deve passar por muitos dias de bombardeios pesados antes que a Rússia lance seu ataque principal.

Essa situação estratégica de momento parece apontar que um cessar-fogo ainda parece muito longe de se concretizar.

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