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Uma grande quantidade de armas fornecidas pelos Estados Unidos, pela Turquia e por países da União Europeia após o início da guerra da Ucrânia já estão nas mãos de combatentes em Kiev. A coluna Jogos de Guerra analisou imagens verificadas, produzidas nos últimos três dias na capital ucraniana, e constatou que os foguetes antitanque são o principal tipo de armamento estrangeiro que pode dificultar o avanço russo sobre a capital.
As imagens mostram dois tipos principais de foguetes: o M72 LAW e o Javelin, ambos de fabricação norte-americana.
O primeiro é o que se chama no jargão militar de “arma antitanque leve”. Ele é capaz de disparar um foguete de 66 mm não guiado, ou seja, o atirador mira em um blindado e dispara diretamente nele. Uma vez que o foguete é lançado, sua trajetória não pode ser corrigida. Essa arma é uma versão evoluída da conhecida “bazooka”, usada na Segunda Guerra. Ela começou a ser usada por forças americanas na década de 1960.
Os M72 estão sendo distribuídos para um grande número de combatentes em Kiev - desde militares profissionais a membros das forças de defesa territoriais e da legião internacional de voluntários. Uma de suas grandes vantagens é poder ser disparada das janelas de prédios e casas. Isso dá mais proteção ao atirador e dificulta que as forças russas identifiquem de onde está partindo o ataque.
O segundo tipo de arma antitanque é o Javelin, um lançador de mísseis portátil. Diferente do que ocorre com o M72, o projetil do Javelin é guiado por um sistema de infravermelho. Assim, quando o atirador coloca o alvo na mira, sua posição é armazenada no míssil. Basta então que o combatente puxe o gatilho para que a ogiva dispare e se guie sozinha até o alvo.
O míssil não atinge o blindado em uma trajetória reta, ele normalmente manobra no ar e atinge o veículo de cima para baixo - em uma área onde normalmente a blindagem dos carros de combate é mais vulnerável. Ele também pode ser usado contra aeronaves que voam a baixa altitude - como helicópteros e drones.
A vantagem para o combatente é que ele pode disparar o foguete e procurar abrigo imediatamente, mesmo antes do míssil atingir o alvo.
A arma se tornou tão popular nesta guerra que circulam pelas mídias sociais ucranianas imagens de uma santa segurando um lançador de mísseis Javelin.
Esse tipo de arma já vinha sendo fornecido pelos Estados Unidos à Ucrânia desde 2018. No início deste ano, com a grande concentração de tropas russas na fronteira da Ucrânia, a Grã-Bretanha também enviou um grande carregamento.
Os ucranianos também já possuíam outros tipos de RPG (sigla em inglês para granada impulsionada por foguete), com operação similar à do M72. Eles são usados com certa eficiência para atacar veículos blindados de transporte de tropas. Mas, diferente do Javelin, não são muito efetivos contra tanques pesados.
Nas fotos que retratam a infantaria ucraniana, militares aparecem portando todos esses lançadores de foguetes, além de submetralhadoras, fuzis e metralhadoras leves do tipo Kalashnikov.
Mas não é possível ter uma ideia completa do armamento que está sendo usado pelos combatentes. Isso porque as autoridades militares ucranianas limitam o acesso de jornalistas às suas tropas e as fotos enviadas por aplicativos de mensagens nem sempre podem ter a veracidade comprovada.
Linhas de suprimento da Ucrânia
Só na semana passada, os Estados Unidos e a Otan infiltraram na Ucrânia mais de 17 mil armas antitanque, especialmente os Javelins e M72, segundo o jornal americano New York Times. Elas chegaram em grandes aviões cargueiros à Polônia e à Romênia e seguiram por rotas terrestres, que são mantidas em sigilo, até serem entregues em Kiev e nas principais frentes de batalha.
Uma fonte militar disse a este colunista que praticamente todas as unidades de defesa de Kiev estão sendo mandadas para pontos secretos na cidade, onde as “armas da Otan” estão sendo distribuídas. Elas são levadas então escondidas em carros de passeio até cada bolsão de resistência, onde serão utilizadas.
De acordo com o New York Times, cerca de 70% dos US$ 350 milhões em ajuda militar prometida à Ucrânia por Washington em 26 de fevereiro já estão no país. A maioria dos armamentos em questão estava guardada em depósitos militares americanos na Alemanha.
Outro equipamento militar que vem sendo infiltrado pela Otan em território ucraniano é o drone Bayraktar TB2, produzido pela Turquia. Ele tem o tamanho de um automóvel e vem sendo usado na Ucrânia de forma eficiente para atacar comboios de blindados.
Mas, segundo analistas, os ucranianos não podem contar para sempre com esse alto fluxo de armamentos para dentro do país, especialmente se o conflito se transformar em uma guerra de longa duração. Isso porque a tendência é que as forças russas passem a lançar ataques contra as linhas de suprimento ucranianas.
As armas necessariamente têm que entrar por via terrestre por vários motivos. O primeiro é que a Rússia já controla quase todo o litoral da Ucrânia e luta para conquistar as principais cidades portuárias, como Mariupol e Odessa. Além disso, a esquadra Russa patrulha o Mar de Azov e o Mar Negro. Ou seja, a entrada por mar está praticamente descartada.
A Rússia também domina o espaço aéreo e é altamente improvável que um avião cargueiro ucraniano ou estrangeiro conseguisse pousar incólume na Ucrânia - até porque a maioria dos aeroportos do país foi bombardeada nos primeiros dias de guerra.
Além disso, é relativamente fácil rastrear (e obter provas materiais) da origem de um carregamento de armas transportado em uma aeronave. Os países patrocinadores poderiam ser rapidamente reconhecidos, acusados e possivelmente arrastados para a guerra.
Já o transporte por via terrestre cai em um território mais cinzento. As armas são deixadas por aviões cargueiros em aeroportos próximos da fronteira da Polônia e da Romênia com a Ucrânia.
Não há muitas informações sobre como o material cruza a fronteira, mas isso pode acontecer tanto em veículos com características civis pelas principais rodovias, como pelas centenas de trilhas e de pequenas estradas da região de floresta que caracteriza essas fronteiras.
O que se sabe é que os russos estão tentando descobrir que rotas são essas. Um indício disso é que são constantes os sobrevoos de aeronaves russas e de seus aliados bielorrussos próximo da fronteira polonesa.
Nas cidades ucranianas de Lviv e Lutsk, próximas da Polônia, as sirenes de ataque aéreo são constantemente acionadas por essa movimentação - elas tocam indicando a aproximação de aeronaves ou mísseis, independente de o avião estar preparando um ataque ou fazendo reconhecimento e vigilância.
Além disso, ao servir de base para a entrada de armamentos na Ucrânia, a Polônia e a Romênia se colocam em uma situação altamente perigosa. O presidente russo, Vladimir Putin, já afirmou que se souber que qualquer país abriga aeronaves ucranianas de combate, considerará que esse país entrou na guerra ao lado da Ucrânia.
Até agora, a Otan tem conseguido evitar esse cenário afirmando que as armas enviadas são de defesa e não armamentos estratégicos - como mísseis de grande porte, aviões ou blindados, que poderiam influenciar definitivamente no desfecho da guerra.
Porém, não se sabe até quando a Rússia ficará numa posição passiva em relação à inserção de armas ocidentais na Ucrânia. Analistas dizem que Moscou pode começar a atacar a qualquer momento os carregamentos de armamentos que forem identificados em solo ucraniano.
O maior risco é que um país da Otan seja arrastado para o conflito na esteira desses ataques. O desfecho disso pode ser previsto até por quem não está muito ligado no assunto da guerra: um conflito abrangendo toda a Europa e possivelmente o mundo.