O genial político inglês Winston Churchill, falecido em 1965 com 91 anos, dizia que “não existe opinião pública; existe opinião publicada”. Ou seja, grande parte das crenças e opiniões das pessoas não resulta de estudo, conhecimento e convicções fundadas no trabalho de observar, pesquisar e estudar, mas resulta de informações e análises feitas nas publicações faladas, escritas e televisionadas.
Significativa parte das opiniões das massas é formada por jornalistas e especialistas utilizados pelos meios de comunicação; e, como o ser humano é uma criatura antes emocional do que lógica, muito do que se compreende e se pensa sobre o mundo está eivado mais de paixões que de realidade factual devidamente estudada.
Em uma aula, mostrei material aos alunos sobre o desenvolvimento da ciência e filosofia na Idade Média e a contribuição dos povos árabes às descobertas e ao progresso da ciência e da vida intelectual. Falei também da contribuição dos mulçumanos à filosofia e à ciência e à construção de uma rica cultura islâmica.
Os sábios mulçumanos tinham enorme apreço pela filosofia de Aristóteles e, em certa medida, ajudaram a reabilitar o prestígio do filósofo grego que, hoje, é considerado um dos grandes gênios da humanidade
O Islã significa submissão à vontade divina, e é a religião originada na missão de Maomé (570-632 d.C.), que proporcionou também identidade cultural e unidade política a seus povos. Maomé pregava que a busca de conhecimento por meios racionais aproxima o homem da sabedoria divina, e dizia: “a busca do saber e da ciência é obrigação de todo mulçumano” – muçulmano é quem pratica a religião islâmica.
Com base nessa filosofia, o Islã incentivou o progresso científico por longo período que vai até o século 12. Os sábios mulçumanos tinham enorme apreço pela filosofia de Aristóteles e, em certa medida, ajudaram a reabilitar o prestígio do filósofo grego que, hoje, é considerado um dos grandes gênios da humanidade, e andou meio esquecido durante séculos.
Há também o caso de Al-Kindi, que viveu no século 9.º, nascido na região de Kufa, atual Iraque, e se notabilizou como um homem de grande talento na filosofia, matemática, medicina e música. Al-Kindi se antecipou ao filósofo Immanuel Kant (1724-1804) em uma questão importante: a possibilidade do conhecimento e os limites da capacidade humana de conhecer.
Al-Kindi se perguntou como o intelecto humano pode conhecer a essência das coisas se pelos sentidos só é possível perceber que elas existem. Essa indagação se constituiu na afirmação de Kant quanto à impossibilidade do conhecimento total das coisas, pois o homem tem somente os sentidos para captar a aparência (que ele chamou de fenômeno), nunca a “coisa em si” em sua totalidade. Para Al-Kindi, a inteligência e a razão são as ferramentas que recolhem as apreensões feitas pelos cinco sentidos e elaboram as leis das propriedades essenciais e acidentais da coisa.
Outro feito notável dos árabes para o progresso da ciência se deu na matemática. Os gregos eram bons na geometria, mas o mundo deve aos árabes a evolução do conhecimento na álgebra (palavra árabe), trigonometria, noção de logaritmos e a formidável invenção do zero. Tanto a invenção do zero quanto a organização das operações matemáticas por meio dos algarismos arábicos estão entre as mais importantes invenções da humanidade. Você já pensou se o mundo dispusesse somente dos algarismos romanos? Tenho a impressão de que isso teria atrasado o progresso da ciência e da tecnologia.
Na filosofia, vale lembrar o filósofo Abu Ali Huceine ibne Abdala ibne Sina (980-1037 d.C), nascido no Uzbequistão e falecido no Irá, que no mundo ocidental ficou conhecido por seu nome vertido para o latim: Avicena (talvez uma corruptela de Ali Sina). O mundo conseguiu preservar 240 tratados escritos por Avicena, em torno de 150 deles sobre filosofia e 40 em medicina, os quais se tornaram material didático na formação médica por muitos séculos.
Se o mundo conseguisse reduzir os confrontos e as brigas entre os povos e trocasse suas experiências e descobertas, a humanidade poderia estar em situação muito melhor
Outro que merece citação no campo da filosofia, física, medicina, direito e outras ciências é Averróis (1126-1198 d.C), nascido em Córdoba, região da Andaluzia, que era a Espanha mulçumana. Averróis foi um dos atores que fizeram Córdoba se tornar um ponto de propagação da ciência e filosofia árabes no Ocidente. Ele foi também importante comentador das obras de Aristóteles e divulgador do pensamento aristotélico no Ocidente, contra a vontade da Igreja, que condenava, se não toda ela, ao menos parte da obra de Aristóteles.
A mensagem que quero transmitir é que, se o mundo conseguisse reduzir os confrontos e as brigas entre os povos e trocasse suas experiências e descobertas, a humanidade poderia estar em situação muito melhor. Se todos os países fizessem um pacto para compartilhar suas pesquisas e descobertas científicas, apesar de suas diferenças políticas e religiosas, a vida dos quase 9,4 bilhões de habitantes que o planeta terá em 2050 poderia ser bem melhor, menos sofrida e com menos tragédias, e talvez com mais paz.
Há alguns anos visitei a Universidade de Pisa, na Itália, e me empolguei com um curso superior de graduação ofertado por ela chamado “Ciência da Paz”. A matriz curricular era de uma beleza admirável e de enorme utilidade. Esse é um curso que valeria ser espalhado pelo mundo, em todas as culturas, e certamente ajudaria as nações e seus povos a se entenderem melhor, com menos conflitos, respeitadas suas diferenças.
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