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Eu sei que muitos vão dizer que um povo culto acompanha a política, discute política, participa de mobilizações e é exigente em relação aos governantes. E vão dizer também que, se a população não se envolver com a política e dela não participar, os governantes terão a vida facilitada e os malandros continuarão se elegendo e pilhando a nação.
A jornalista política Lúcia Hippolito dizia que, se você não gosta de política, saiba que será governado por quem gosta... e muito! Ela queria alertar para a realidade brasileira, em que políticos fracos, de baixa cultura e/ou corruptos se elegem e se reelegem com assustadora regularidade, e muitos nela enriquecem. Depois, reclamar não resolve; afinal, nós os colocamos lá. Lúcia estava certa.
Volta e meia me cobram para, em meus comentários no rádio e artigos de jornal, falar de política, criticar políticos e citar nomes. Meu foco é economia, finanças, administração, negócios e incursões pelo mundo da filosofia. Leio e estudo sobre Ciência Política e Sociologia, mas o cotidiano da política, as brigas, as fofocas, os interesses individuais e as mentiras definitivamente me afastam.
A práxis política brasileira não trata de ideias, valores e fins, mas de pessoas, meios e interesses, sendo muitas vezes uma luta indecente por poder e dinheiro
O espetáculo da política diária é medíocre e, na média, o nível intelectual e moral dos partidos e dos políticos é deprimente. Minha disposição para não centrar o foco na política diária vem de algumas razões. Entre elas, vejo a política separada em dois grupos; não é um esquema científico, mas uma forma de olhar o assunto.
Um grupo trata de ideias, valores e fins, e é o lado nobre da Ciência Política. O outro grupo trata de pessoas, meios e interesses, e é focado na orgia política diária, permeada por vasta sujeira moral. A práxis política brasileira, vista por esse ângulo de dois grupos, não trata de ideias, valores e fins, mas de pessoas, meios e interesses, sendo muitas vezes uma luta indecente por poder e dinheiro.
Um amigo, eleitor de Alckmin, me disse estar indignado com a possibilidade de ele virar o vice de Lula na eleição presidencial, e argumentou que Alckmin tem um histórico de acusações graves contra o PT e contra Lula. Eu lhe disse: “algum dia você acreditou que a práxis política não é um jogo de interesses, conchavos e alianças espúrias?” O político tem dois objetivos prioritários: chegar ao poder, e manter-se no poder. Em uma eleição, o foco é ganhar a disputa. Dilma, com a sinceridade tosca que lhe é peculiar, disse aquela famosa frase: “Se preciso, faremos o diabo para ganhar a eleição”.
Claro que os candidatos podem ter suas crenças e seus programas, mas a prioridade é ganhar a eleição. Não é preciso dizer que toda generalização é imperfeita. Há candidatos competentes, honestos e com elevada cultura. Mas sejamos francos: eles não são a maioria.
A Sociologia tem por finalidade a explicação científica dos fatos da vida social, e a Política (com inicial maiúscula, quando ciência) diz respeito ao funcionamento do Estado e à arte de governo. Nesse esquema, o poder se define pelos meios de ação à disposição do governante eleito, logo, a eleição faz parte do sistema. O problema é que muitos não têm escrúpulos nem limites na ânsia de vencer.
O político tem dois objetivos prioritários: chegar ao poder, e manter-se no poder
O exercício do poder se faz por meios de ação pelos quais o governante determina os atos do governo e impõe direitos e obrigação à população, sob a regra da lei (nas democracias) ou sob o mando da força (nas ditaduras). Nesse jogo, a briga política diária é a parte pobre do sistema, enquanto as doutrinas, as ideias, as formas de funcionamento do Estado, do governo e do poder constituem o aspecto nobre e inteligente da política.
Por fim, não me considero um especialista nas entranhas, movimentos e acordos da briga diária dos partidos e seus políticos, a ponto de impor aos outros minhas análises dessa parte (que está no grupo dois a que me referi).
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos