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José Pio Martins

José Pio Martins

Guerras e crimes

O custo da maldade humana

Baterias do Domo de Ferro, sistema israelense de proteção contra morteiros e foguetes inimigos. (Foto: Israel Defense Forces via Wiki Commons)

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Eu já estava com este artigo rascunhado quando eclodiu o ataque terrorista do grupo Hamas em Israel, que ceifou a vida de velhos, mulheres, crianças e jovens que estavam aglomerados em um show musical. Foi um ataque indiscriminado contra civis inocentes, muitos deles de outros países, inclusive do Brasil.

Embora imprecisas, estatísticas dão conta de que o mundo gasta até 20% do produto mundial com defesa, segurança e prevenção contra crimes e todo tipo de violência contra a vida e o patrimônio. Essa cifra gigantesca responde por uma parte da pobreza mundial, pois é dinheiro que falta para programas sociais.

A violência compõe uma lista enorme. Furtos, roubos, assassinatos por desavenças individuais, brigas de torcidas, disputas no mundo das drogas, conflitos raciais, disputas territoriais, guerras diversas, espionagem industrial, conflitos e mortes em confrontos religiosos e ideológicos, ou seja, é uma multidão de crimes derivados da loucura humana.

O mundo gasta até 20% do produto mundial com defesa, segurança e prevenção contra crimes e violência contra a vida e o patrimônio. Essa cifra gigantesca responde por uma parte da pobreza mundial, pois é dinheiro que falta para programas sociais

A violência e o extermínio de vidas humanas passaram a compor a rotina diária do mundo, a ponto de já não provocarem dor e comoção em alta escala. E quando desaparece a indignação diante do terror e da maldade, o mal se torna banal e rotineiro, e mais distantes ficam as soluções.

Lembro o caso de Adolf Eichmann, o nazista que comandou o sistema de transporte de judeus para os campos de concentração. Ele não participou da decisão de extermínio, mas foi o gestor competente do transporte de pessoas para a morte. Eichmann era inteligente e seu sistema de trens funcionava com eficiência.

Ao fim da guerra, Eichmann fugiu para a Argentina, e só em 1960 veio a ser capturado pelo Mossad, o serviço secreto israelense, quando então foi levado a julgamento em Jerusalém. Hannah Arendt, a grande filósofa judia que conseguiu fugir de Hitler, foi a Jerusalém para ver como era um monstro de perto.

No julgamento, Arendt ficou espantada ao notar que ali estava um homem normal, um burocrata cumpridor de ordens, e ela cunhou a expressão “a banalidade do mal”, título de um de seus livros. Adolf Eichmann apresentou-se diante do juiz como uma pessoa normal, a quem ensinaram a ser patriota e cumpridor das leis.

O século 20 foi o mais inventivo, mas foi também o mais violento. E foi um século curto. Começou com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e a Revolução Russa de 1917, e terminou em 1991 com o desmoronamento do império comunista soviético.

Zbigniew Brzezinski (1928-2017), estrategista de política externa que foi conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos na gestão de Jimmy Carter, entre 1977 e 1981, fez um relatório chamado As Megamortes, no qual listou 243 conflitos militares no século 20, que teriam resultado em 187 milhões de mortos. Esse número foi contestado porque nele constavam 20 milhões de mortos pelo regime comunista chinês de Mao Tsé-tung, de 1949 a 1976, quando relatórios posteriores informaram que os mortos eram 70 milhões. Assim, as megamortes seriam 237 milhões, das quais 50 milhões nas duas guerras mundiais e 100 milhões nos regimes comunistas ao redor do mundo.

Voltando o pensamento para o Brasil, nosso país chegou a 59,1 mil assassinatos por ano em 2017, sem que isso tenha se tornado o maior problema nacional. Esse número andou caindo para 40,8 mil mortes violentas em 2022, o que ainda é muito alto. É uma tragédia humanitária descomunal, que parece não causar mais perplexidade.

Quando desaparece a indignação diante do terror e da maldade, o mal se torna banal e rotineiro, e mais distantes ficam as soluções

As discussões sobre como reduzir as guerras levaram a várias propostas, uma delas relacionada com a expansão do comércio internacional. O próprio Karl Marx, ideólogo do comunismo, foi influenciado pelas ideias liberais de Manchester, na Inglaterra, onde, em um congresso, foi estabelecido que o livre comércio entre as nações suprime a razão para os países lutarem uns contra os outros.

No livre comércio, as nações se beneficiam dos produtos e tecnologias das outras nações e, assim, reduz-se a razão para a guerra. Quanto mais os países ampliarem o comércio multilateral, inclusive em investimentos e capitais, maiores serão as vantagens mútuas em favor do crescimento econômico e do desenvolvimento social.

Voltando ao ponto inicial, o destino de 20% de toda a renda mundial para prevenir, combater e punir os atos individuais e coletivos derivados da maldade humana é uma cifra assombrosa e significa um desperdício gigantesco de recursos e trabalho humano; logo, é uma das causas da manutenção da pobreza. Eis aí um grande desafio para todos nós.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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