No dia 9 de outubro de 2001, falecia Roberto Campos, aos 84 anos, um mês após o atentado terrorista contra as torres gêmeas do World Trade Center e o Pentágono. Graduado em Filosofia no Brasil e em Economia nos Estados Unidos, com mestrado também em Economia feito em Nova York, Roberto Campos fez carreira como diplomata, embaixador, ministro, senador, deputado e escritor, sempre reconhecido até por seus mais renhidos adversários com um intelectual de alto nível.
Homem de cultura enciclopédica, um dos mais preparados economistas da história do Brasil, visionário e futurista que enxergava à frente de seu tempo, sua habilidade com a escrita e com a fala o fazia temido por seus debatedores. Roberto Campos confessava que, quando jovem, nutria certa simpatia por algumas ideias de tendência socialista, como a capacidade do governo de promover o desenvolvimento, resolver a pobreza e reduzir as desigualdades sociais.
Com o passar do tempo, ele percebeu que os políticos e a burocracia estatal, ao retirarem gorda fração da renda nacional sob argumentos humanitários, primeiro tratam de pagar a si mesmos, criam mordomias e vantagens pessoais, incham as estruturas burocráticas e se dedicam a produzir regras para infernizar a vida do cidadão e do empreendedor, e desprezam a racionalidade econômica.
Roberto Campos tentou convencer o presidente Getúlio Vargas que era insano o Brasil não produzir petróleo (a Petrobras iniciou suas atividades em 1954) e ser dependente de importações do produto
Durante a Segunda Guerra Mundial e depois dela, como diplomata na embaixada brasileira em Washington, Roberto Campos se tornara encarregado de obter licenças de exportação de mercadorias, máquinas, equipamentos, combustíveis e outros produtos para o Brasil. Nessa tarefa, ele ficou horrorizado com a vulnerabilidade brasileira em relação aos suprimentos internacionais, inclusive petróleo.
Vendo que o Brasil literalmente pararia caso os suprimentos internacionais fossem interrompidos, ele se angustiava por não sentir eco em sua pregação a favor da abertura internacional e atração de investimento estrangeiro. Ao contrário, os nacionalistas passavam o tempo xingando o mundo e propondo o fechamento da economia nacional, sob aplausos de boa parte do eleitorado.
Em certo momento, Roberto Campos tentou convencer o presidente Getúlio Vargas que era insano o Brasil não produzir petróleo (a Petrobras iniciou suas atividades em 1954), ser dependente de importações do produto e ainda depender de empréstimos bancários internacionais para pagar as importações – portanto, uma dupla vulnerabilidade –, enquanto rejeitava investimento estrangeiro para produzir em território nacional.
Ele dizia que as passeatas, os discursos e a gritaria sob o slogan “o petróleo é nosso” eram uma insanidade. No início dos anos 1950, como membro da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos e, mais adiante, escrevendo o plano de governo de Juscelino Kubitschek junto com Lucas Lopes, Roberto Campos tentou convencer Juscelino que o mundo houvera mudado e que as ideias socialistas não faziam mais sentido (se é que algum dia tiveram algum). Juscelino era difícil de ser convencido de qualquer coisa.
Curiosamente, Roberto Campos foi um dos idealizadores da criação da Petrobras, como uma estatal de petróleo, mas sem monopólio e com a participação de capital privado. Tanto é que Vargas enviou ao Congresso Nacional a proposta para a criação da Petrobras sem o monopólio. Quem criou o monopólio estatal foi o parlamento, e Vargas sancionou.
Como membro da embaixada brasileira, Roberto Campos participou da conferência de Breton Woods, em 1944, na qual foram criados o padrão-dólar, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, e o que viu ali o levou a sugerir a criação de um banco de desenvolvimento. Assim foi feito com a criação, em 1952, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), do qual se tornou presidente no governo Juscelino.
Quando indagado por que se tornara um liberal em economia, Campos respondia que sua experiência no serviço público e na diplomacia internacional o levou à desilusão com o governo, pela precária conduta moral e baixa capacidade gerencial
Os governantes e os políticos achavam Roberto Campos ousado e muito internacional, e foi somente em 1964, quando Castelo Branco o nomeou ministro do Planejamento, que ele conseguiu emplacar um amplo conjunto de reformas econômicas que permitiram tirar o Brasil da inflação vinda do período Jânio e João Goulart, e preparar o caminho para o crescimento robusto ocorrido a partir de 1968.
Por sua reconhecida sabedoria econômica somada à competência técnica, vários governos lhe atribuíram funções e tarefas. A experiência internacional de Roberto Campos foi ampliada nas funções de embaixador do Brasil nos Estados Unidos, durante o governo João Goulart, e embaixador na Inglaterra, no período de Ernesto Geisel. Retornando ao Brasil, em 1982, ele se elegeu senador pelo estado de Mato Grosso e duas vezes deputado federal pelo Rio de Janeiro, sempre fiel na pregação em defesa da liberdade, dos direitos individuais, da democracia política e da economia de mercado.
A América Latina, segundo Campos, não se cansa de eleger esquerdistas inimigos da racionalidade econômica, financeiramente imprudentes e amantes de políticas públicas erradas
Quando indagado por que se tornara um liberal em economia, ele respondia que sua experiência no serviço público e na diplomacia internacional o levou à desilusão com o governo, pela precária conduta moral e baixa capacidade gerencial. Ele era pessimista quanto à América Latina, que, segundo dizia, não se cansava de eleger esquerdistas inimigos da racionalidade econômica, financeiramente imprudentes e amantes de políticas públicas erradas.
Como membro do Congresso Nacional que aprovou a Constituição de 1988, Roberto Campos se dizia angustiado com o texto constitucional que, segundo ele, iria atrasar o desenvolvimento do Brasil. Em homenagem a Roberto Campos, nesses 20 anos de sua morte, encerro com um desabafo feito por ele na seguinte frase: “O governo não passa de um aglomerado de burocratas e políticos que almoçam poder, promoção e privilégios, e somente na sobremesa pensam no bem comum”.
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