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J.R. Guzzo

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Atuação da PGR e do STF prova que Justiça brasileira está entre a demência e o desvario

manifestantes em Brasília
OAB e PGR querem oferecer acordo para quem foi preso no acampamento diante do quartel e não participou de invasão na Praça dos Três Poderes. (Foto: Renan Ramalho/Gazeta do Povo)

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Foi enfim solta pelo ministro Alexandre de Moraes, após oito meses de prisão fechada, a última presa por participação nas depredações do dia 8 de janeiro em Brasília. Sua prisão durante este tempo todo vai ficar como ponto de referência de um dos momentos mais infames na história do Judiciário brasileiro – a negação de justiça, pura e simples, para os que foram presos neste episódio infeliz.

Em nenhum momento o STF, que assumiu o comando do caso como se fosse uma delegacia de polícia, aplicou a eles as regras elementares da lei penal brasileira. Foram tratados, desde o primeiro minuto, como presos políticos – sem direito à defesa plena por seus advogados, sem direito às garantias legais devidas a acusados primários, sem direito às prerrogativas mínimas que a lei oferece para qualquer criminoso.

Como é o caso de tantas vítimas da repressão aos atos de baderna contra os edifícios dos Três Poderes, a mulher solta depois de oito meses no cárcere é uma acusada primária, sem nenhum tipo de antecedente criminal, tem ocupação conhecida e residência fixa – ou seja, pelo que determina a lei, teria de ter sido solta após umas poucas horas de detenção. Jamais poderia ficar presa esse tempo todo.

É um momento de demência, do qual não se conhece precedentes, no Brasil ou em qualquer democracia minimamente séria do mundo.

O ministro Moraes, que age ao mesmo tempo como vítima, policial, promotor e juiz desse e centenas de outros casos, acusa essa senhora, junto com a PGR, de associação criminosa armada e “golpe de Estado”. Pior: ela queria usar “substância inflamável” para “implantar um governo militar” e depor o “governo legitimamente constituído”. Como seria materialmente possível, para um bando de pessoas que não tinham sequer um estilingue, e invadiram o Palácio do Planalto com cadeirinhas de praia, carrinhos de bebê e gente que vendia algodão doce, derrubar o governo do Brasil? Não eram eles que tinham os tanques de guerra e os caças a jato; a força armada estava exatamente do lado contrário.

Também não se sabe por que essa senhora foi solta, se cometeu todos aqueles crimes de lesa-pátria – nem se há alguma prova contra ela, e nem porque teve de esperar oito meses para a polícia, o Ministério Público e o ministro Moraes chegarem à conclusão de que deveria sair da cadeia. Por que, enfim, terá de usar tornozeleira eletrônica ou ficar em casa à noite – e por que não pode se comunicar pela internet? Se ela é esse perigo todo, não deveria continuar presa? Nada, em nada disso, faz qualquer nexo legal, ou meramente lógico. Ao contrário: as decisões dos ministros e da PGR, transformada em prestadora de serviços do STF, estão transformando a Justiça superior brasileira num desvario cada vez mais descontrolado.

Nada, talvez, comprove com tanta clareza essa marcha rumo à insensatez quanto a decisão de Alexandre de Moares, originada na PGR, de permitir que 1.156 denunciados pelo 8 de janeiro não respondam a julgamento. Todos eles foram soltos porque a PGR, segundo ela própria diz em documento escrito, não encontrou provas de que tivessem cometido qualquer crime. Fim do caso, então? Não no Brasil do STF – nem um pouco, aliás.

Para não responderem a processo, os 1.156 denunciados terão de confessar, num prazo de 120 dias, que cometeram os crimes pelos quais estão sendo acusados. Como assim – que crimes? Como o sujeito vai confessar um crime que o próprio acusador está dizendo, oficialmente, que ele não cometeu? É um momento de demência, do qual não se conhece precedentes, no Brasil ou em qualquer democracia minimamente séria do mundo. Você não fez nada – mas tem de confessar que fez, para não ser processado. É isso, hoje, a Justiça brasileira.

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