Veja só que coisa extraordinária: o presidente da República está sendo acusado de faltar com o decoro. É de se ter um frouxo de riso. Falta de decoro? E desde quando alguém já imaginou que a palavra “decoro”, como está definida no dicionário, possa ter alguma relação com a vida política brasileira?
Temos uma Câmara dos Deputados onde pelo menos um terço dos membros (há cálculos que falam em 40%, ou mesmo mais que isso) está respondendo a algum tipo de denúncia criminal. Temos um senador com nove ou dez processos nas costas, outro que foi pego em flagrante de extorsão ao telefone e outros que só não estão numa penitenciária porque têm “imunidades parlamentares” – ou seja, a licença de praticarem crimes sem serem presos.
Temos um presidente do Supremo Tribunal Federal que foi reprovado duas vezes no concurso para juiz de direito. Temos os políticos metendo a mão num fundo eleitoral que tem bilhões de reais roubados do contribuinte. Temos, temos, temos. Falta de decoro? Vão passear.
Seria uma beleza, naturalmente, que os nossos homens públicos, a começar pelo presidente da República, tivessem uma conduta nota 10. Mas não têm – e muitos não seriam capazes nem de reconhecer o conceito de “decoro”, mesmo que topassem de cara com ele numa esquina. O que fica francamente esquisito é cobrar bom comportamento só do presidente. Parece aquela palhaçada que agora colou nos jogos de futebol: os locutores de rádio e televisão que, para cumprir regras de correção política dos estádios, ficam reprovando gravemente o palavreado da torcida, sobretudo em relação ao goleiro do time visitante. Adianta alguma coisa? E, no fundo, quem é que está ligando?
O presidente Bolsonaro, em seu último surto de nervos, falou algumas barbaridades contra os jornalistas que o interrogavam. Isso não se faz. É óbvio que não se faz. Não porque os jornalistas mereçam algum tratamento especial – jornalistas, na verdade, não merecem coisa nenhuma. Também não se trata, no caso, de uma reação justa ou compreensível diante de uma imprensa que, francamente, jamais foi imparcial em relação a Bolsonaro, e nunca será – ao contrário, trata o presidente da República como se ele fosse um delinquente de rua.
Enfim: ouvindo os insultos, ou coisas muito parecidas, que os jornalistas fazem frequentemente a Bolsonaro, muitas pessoas devolveriam na mesma moeda e na mesma hora. Acontece, e é aí que está o problema, que o presidente não é “muitas pessoas”. Ele é o presidente da República, Santo Deus, e o cidadão que se dispõe a ocupar esse cargo não pode, simplesmente não pode, achar que tem o direito de sair por aí dizendo o que lhe der na telha. Não tem “sangue de barata”, e outras bobagens? Então não vá ser presidente e pronto. Ninguém é obrigado.
Bolsonaro está 100% errado, porque não pode fazer o que faz. Ficar com essa história de “decoro”, ao mesmo tempo, é 100% hipócrita.
Governo quer limitar uso de armas por policiais e vincular verbas federais a novas normas
O que vem por aí após a prisão de Braga Netto e a repercussão da entrevista de Lula; assista ao Entrelinhas
Quais são os estados brasileiros que mais retornam impostos para o bem-estar da população
Aeroporto de Porto Alegre volta a operar com extensão total da pista
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS