A ministra Cármen Lúcia vai deixar como a realização mais comentada da sua carreira de jurista a criação da censura temporária – começa na hora do seu despacho e só dura até “a segunda-feira”, ou o dia seguinte às eleições de 2022. Como a Constituição proíbe a censura no Brasil, e o STF queria censurar a exibição pública de um vídeo sobre a tentativa de assassinato do ex-presidente Jair Bolsonaro, a ministra resolveu essa dificuldade aplicando sua doutrina de violação provisória da lei.
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Disse, na ocasião, que a censura é um pecado inaceitável – mas naquele caso, só naquele caso, ela iria aceitar que o vídeo fosse censurado. A liberdade de expressão poderia prejudicar a candidatura de Lula na reta final da campanha, e no entender do Supremo isso causaria danos irreversíveis ao interesse nacional. Aí, em condições “excepcionalíssimas”, Cármen proibiu a exibição de um vídeo que não tinha um átomo de notícia falsa, ou de “desinformação”, ou de “ódio” – a não ser ódio contra o próprio Bolsonaro.
Sabe-se bem o que aconteceu com a censura “excepcionalíssima” de Cármen Lúcia – está durando até agora, e seu plano “A” é que continue para sempre. O STF e o seu departamento policial toleram a liberdade de expressão nos órgãos de imprensa, na maior parte do tempo. Mas estão cada vez mais convencidos de que as redes sociais são um mal a ser reprimido com censura, inquérito, prisão, bloqueio de contas bancárias, “desmonetização” e o que mais houver no seu paiol de munição.
O motivo é óbvio: a internet é hoje o grande espaço que os brasileiros usam para falar e ouvir, e o regime não gosta do que é falado e ouvido ali. Na verdade, o seu maior medo são as redes sociais. Ali, bem ou mal, certo ou errado, se expressa a vontade popular do Brasil como ele é na realidade – é a voz da maioria, e não há nada que deixe o governo Lula, o STF e os seus sistemas de apoio mais transtornados do que a maioria. O resultado dessa neurose é a obsessão de criar leis para “regulamentar” as redes e impor o que os cidadãos podem ou não podem dizer nelas.
A ida da ministra Cármen Lúcia para o TSE, hoje transformado numa chefatura de controle das eleições é uma má notícia para a liberdade de expressão – e para as eleições. Em seu discurso de posse, ela só cuidou praticamente de um assunto: as fake news, e seus desdobramentos na forma de “mentira”, “ódio”, desinformação e por aí afora.
Não existe, na visão da ministra, nenhuma questão relevante para as eleições brasileiras que não seja o “uso” do voto, por parte dos eleitores, para eleger candidatos que mentem, odeiam e desinformam. A manifestação da vontade do povo não é mais, segundo Cármen e o seu roteiro, uma exigência constitucional, ou um momento de atividade democrática – é uma “ameaça da direita”. O TSE já está aparelhado para exercer funções de gendarmeria nas eleições – é de novo uma situação excepcionalíssima.
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