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Levantou-se no Brasil nos últimos dias um imenso escudo de proteção ao ministro Alexandre de Moraes e o STF. O ministro, com o apoio integral dos colegas, proibiu com uma assinatura de computador que mais de 22 milhões de cidadãos brasileiros se expressem no X – e se alguém tentar, vai ter de pagar uma multa de 50 mil reais. É um ato de genocídio contra a liberdade de expressão no Brasil, o pior que já se cometeu na história deste país.
No regime hoje em vigor, entretanto, é obrigatório aplaudir de pé tudo o que vem do ministro Moraes e da “suprema corte”, como diz o presidente Lula. No caso, foi imposto o dogma de que esse ato de censura por atacado, que viola diretamente a Constituição, é na verdade uma grande conquista da democracia brasileira.
A esquerda, os intelectuais, os “especialistas” ouvidos pela imprensa que presta serviços ao governo e a maioria dos jornalistas fecharam automaticamente com Moraes
O ministro, por este entendimento das coisas, mostrou ao bilionário estrangeiro do X que isso aqui não é uma “terra de ninguém. Ele tem de obedecer às “ordens judiciais” – no caso, ordens de Moraes mandando que a plataforma censurasse perfis de gente marcada na lista negra da “extrema direita” nacional.
Musk não cumpriu a ordem, por ser ilegal, e fechou o escritório do X no Brasil, para seus funcionários não serem presos. Foi intimado, então, a nomear “em dois dias” um novo presidente, e não nomeou. Quem aceitaria um cargo já sabendo que vai para a cadeia ao assumir? Resultado: a plataforma foi expulsa do país por não cumprir “ordens judiciais”.
A esquerda, os intelectuais, os “especialistas” ouvidos pela imprensa que presta serviços ao governo e a maioria dos jornalistas fecharam automaticamente com Moraes. O ministro está certíssimo: onde já se viu um “bilionário americano” recusar-se a cumprir “ordens judiciais”? Como fica a “soberania nacional”? Isso aqui não é uma “terra de ninguém”. Somos uma das maiores democracias do mundo, e não podemos admitir “interferências” em nossos assuntos internos. E por aí se vai, sob o estandarte geral de que “decisão judicial se cumpre, não se discute”.
É mesmo? Pode ser, mas o próprio STF já tem, há quase 30 anos, posição formada sobre a questão. De acordo com a jurisprudência estabelecida, ninguém é obrigado a cumprir ordem ilegal, mesmo que tenha sido dada em sentença judicial. Ou seja: ordem judicial pode, sim, ser discutida.
No presente episódio, a ordem mandava o X aplicar censura – e a censura é ilegal no Brasil. Também não está claro, e isso há muito tempo, o que é realmente uma “ordem judicial” no Brasil de hoje. Na prática, toda a decisão de Moraes, de qualquer tipo e em qualquer circunstância, é “ordem judicial”.
Toda essa discussão sobre o caráter sagrado das “ordens judiciais” é obviamente insana. Justamente agora, na Venezuela, o STF de lá mandou prender o candidato da oposição nas últimas eleições que Nicolás Maduro roubou, e sem a menor preocupação em esconder que estava roubando.
Nem Lula – aliás, nem o ministro-de-fato Amorim – conseguiram aprovar essa prisão. Mas, na lógica das esquadras pró-Moraes e pró-STF, trata-se de uma “ordem judicial” e, portanto, nada mais correto, legal e democrático do que prender o candidato roubado. “Decisão da Justiça se cumpre, não se discute”, não é mesmo? Venezuela e Brasil: mais uma vez tudo a ver.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos