Nada poderia ser mais desolador para o Rio Grande do Sul e o seu povo do que a coreografia montada pelos governos diante da tragédia trazida pelas cheias. É mais um dos grandes momentos na história da simulação de atividade no Brasil – o esporte mais praticado pelas autoridades públicas deste país para fingirem intensa operosidade, eficácia e consciência quando, na verdade, não estão fazendo nada.
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O presidente da República se desloca pessoalmente para o teatro de guerra. Tira foto olhando pela janela do helicóptero para o desastre que se vê abaixo. Veste um colete de quem está na linha de frente das operações de socorro, como se fosse entrar na água dali a um minuto para salvar alguém. Leva treze ministros com ele para sua visita ao estado, não menos que treze, mais os presidentes da Câmara e do Senado, para o papel de papagaio de pirata em coletiva de imprensa. Leva junto, até mesmo, um incompreensível Edson Fachin – pelo jeito, agora, também o STF tem de ter o seu representante nesse tipo de coisa. Somados, produziram três vezes zero em matéria de serviço útil. Chegaram mudos e foram embora calados, provavelmente para não voltar mais.
Ninguém está dando a mínima para a calamidade. O que interessa é saber se Lula “ganha” ou “perde”.
Os analistas políticos se admiram da genialidade de Lula em perceber que tinha acontecido uma tragédia e que seria bom para a sua imagem ir, pessoalmente, até o Rio Grande do Sul carregando consigo aquele cardume de peixes graúdos – quanto mais peixe graúdo, na estratégia de comunicação do governo, maior é a aparência de que estão todos trabalhando para salvar a população gaúcha.
É este, na visão geral, o grande desafio que as enchentes trazem para o governo Lula: como fica a sua imagem. Ninguém está dando a mínima para a calamidade. O que interessa é saber se Lula “ganha” ou “perde”. São as ideias fixas de um governo sem povo, de um partido sem apoio e de um presidente que não pode caminhar 50 metros em nenhuma rua do país que preside. Fora do perímetro urbano de Brasília, dos Palácios do Planalto e da Alvorada e dos regabofes da nobiliarquia local, o mundo não existe. Quando ele tem o mau gosto de aparecer, como no caso das enchentes do Rio Grande, a reação automática é pegar o controle remoto e apertar na tecla “desliga” – ou seja, jogar em cima do público a ficção de que está fazendo o seu dever. Não está fazendo nada que preste, e há indícios de que esteja atrapalhando.
A contribuição da ministra do Meio Ambiente, por exemplo, foi dizer que a culpa pelo desastre é de Bolsonaro. O presidente do Senado ofereceu a ajuda do seu “corpo técnico” – vai mandar o encanador da casa para o Rio Grande, talvez? A Receita Federal anuncia que as doações estrangeiras para as vítimas estarão isentas de imposto – que generosidade extrema, não? O Ministério da Justiça está absorvido na caçada aos divulgadores de fake news. O Tribunal de Contas da União teve a ideia de enviar o seu presidente na comitiva monumental de Lula ao local da tragédia; permanece um mistério qual poderia ser a utilidade, mesmo que indireta, da sua presença.
Até quando acerta o governo erra, ou acerta por linhas erradas. A ministra do Planejamento disse que o dinheiro da ajuda federal não chegará “agora”; o dinheiro dos cidadãos e empresas privadas chega todos os dias via pix. É razoável, porque ainda não há clareza para onde mandar a ajuda financeira, para quem e para o quê. Mas ninguém se lembrou de ponderar para a ministra que talvez não fosse a melhor hora para se dizer uma coisa dessas em público? É, como sempre, o clássico passeio ao acaso.
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