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O tal do “rito” é o que menos importa nas revelações sobre Moraes
| Foto: Andressa Anholete/SCO/STF

Mais uma vez a vida política brasileira se joga numa discussão em que todos falam, falam e falam. Mas, cada vez,  se fala o menos possível daquilo que realmente deveria estar sendo falado. O jornalista Glenn Greenwald, com o apoio de gravações obtidas por meios legais, revelou em reportagem publicada na Folha de S. Paulo que o ministro Alexandre de Moraes usou a máquina do TSE para instruir decisões tomadas por ele próprio no STF. Desde então formou-se um intenso debate na imprensa, também entre advogados e no meio dos gatos gordos do governo para se determinar o que menos interessa na história toda: se houve ou não alguma ilegalidade nas ações do ministro, do TSE e do STF.

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Juristas, penalistas, especialistas, fora os esquadrões de “enfrentamento” aos “ataques” contra o judiciário, chegaram à conclusão majoritária que até uma criança com dez anos de idade podia ter - não há, ou não se pode dizer que há, nada de errado com nada do que o ministro fez. Tanto barulho para se dizer isso? O STF, e Moraes acima de todos os outros, sempre têm razão. É a cláusula mais “pétrea” da única Constituição que está valendo de fato no Brasil de hoje.

Vieram, dessa vez, com uma conversa sobre “o rito” – algo como falar sobre a roupa do padre, mas não sobre o que ele fez durante a missa. O “rito” das ações de Moraes, dizem, deveria ter sido este, deveria ter sido aquele, e mais a maçaroca que sempre sai do patuá jurídico. E daí? Com rito ou sem rito, o ministro, e os colegas cuja preocupação principal é concordar com ele em tudo, fazem há pelo menos cinco anos o que bem entendem no comando real da justiça brasileira. 

Nenhuma decisão que Moraes tomou foi contestada até hoje, e nem vai ser, por um motivo muito simples: ele tem razão não porque tem a lei a seu lado, mas porque tem a força. Quem precisa de “rito”, ou de qualquer outra tapeação do mesmo pesqueiro, quando a razão armada lhe dá suporte? Texto e espírito da lei, jurisprudência, precedentes – nada disso serve, no mundo das realidades, quando é a força que decide.


 A Constituição é um caderno em branco em que os ministros vão escrevendo a cada dia a regra que lhes convém

Alexandre de Moraes não fez o que as gravações revelam porque era legal – fez porque pode fazer. É cômico ficar debatendo se o TSE tem “poder de polícia”, se o ministro não podia “oficiar a si próprio”, se o tráfico de conversas entre quem acusa e quem julga faz parte do processo legal, e por aí afora. Nada disso faz sentido quando o Poder Público no Brasil, como um todo, permite, passivamente, que o STF seja hoje em dia a Grande Árvore Envenenada da justiça nacional. Sabe-se bem o conceito básico do direito: qualquer procedimento que começou com uma ilegalidade torna ilegais todas as decisões que derivaram dele, assim como uma árvore envenenada só pode produzir frutos contaminados por seu próprio veneno. 

O inquérito perpétuo do STF (já está aberto há cinco anos, e não tem data para acabar) sobre “fake news”, “atos antidemocráticos” e “ataques ao STF” é integralmente ilegal. Também é ilegal o inquérito do ministro Moraes sobre o “golpe do 8 de janeiro”. As centenas de decisões saídas de ambos, em consequência, são todas ilegais – estão envenenadas pelo veneno original.

É isso que vem ao caso: o Brasil, para atender os interesses do governo Lula, dos magnatas que o apoiam e das organizações de esquerda, no arco que vai do PT à CUT, do Psol ao MST, vive num regime sem lei. Quem faz a lei é o STF, em parceria com os seus sócios do governo. A Constituição é um caderno em branco em que os ministros vão escrevendo a cada dia a regra que lhes convém no momento. O incesto procedimental entre STF e TSE, trazido à luz pelas gravações, é a tomografia da situação. Pior que ela é a doença.

Conteúdo editado por:Liana Nunes
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