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J.R. Guzzo

J.R. Guzzo

Deputado preso

Supremo não pode ser ao mesmo tempo vítima e juiz de Daniel Silveira

Segurança reforçada em frente ao Supremo, em Brasília, após a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) por divulgar um vídeo com discurso de ódio contra os integrantes da Corte.
Segurança reforçada em frente ao prédio do STF, em Brasília, após a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) por divulgar um vídeo com discurso de ódio contra os integrantes da Corte. (Foto: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo)

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Digamos que o deputado federal Daniel Silveira, do Rio de Janeiro e da primeira linha da direita nacional, tenha cometido crimes fora de série – tão graves que não deixam nem sequer a possibilidade de fiança por parte do acusado. Mas o deputado não cometeu crime nenhum, nem fora de série e nem de qualquer outro tipo, e muito menos foi pego em flagrante. O que fez foi um vídeo de 20 minutos falando o diabo dos ministros do STF – no qual, entre uma pilha de ofensas pesadas, deixa claro que ficaria muito feliz se todos eles levassem uma surra. É opinião, pura e simples. Pode ser opinião da pior qualidade, mas é isso – opinião.

De qualquer jeito, mesmo que Silveira tivesse praticado algum crime definido como hediondo, esses que vão do racismo e da prática de tortura ao terrorismo e o tráfico de drogas, só poderia ser julgado e punido pela Câmara dos Deputados – e não preso pela polícia de madrugada por ordem de um ministro do STF, com o aval de seus dez colegas. Eis aí um erro em estado puro e sem atenuantes.

É simples. No artigo 53 da Constituição Federal está escrito, da maneira mais clara possível, que os mandatos dos parlamentares brasileiros são invioláveis; podem até ser cassados, caso o plenário achar que romperam com as suas obrigações por qualquer razão que seja, mas é só o Congresso que pode fazer isso.

No caso do deputado Silveira, especificamente, a Comissão de Ética, e em seguida o plenário da Câmara, podem considerar que as suas palavras caracterizam injúria aos ministros do STF, ou incentivo à violência, ou afrontam à conduta que um parlamentar é obrigado a seguir; podem achar que ele se conduziu de maneira desastrosa e que, por isso, merece ser punido com a suspensão ou a perda do seu mandato.

Tudo bem – mas o STF não tem nada a ver com isso. Pode ser vítima e, nessa condição, apresentar suas queixas. Mas não pode ser juiz.

O Estado de Direito no Brasil, num caso possivelmente único no resto do mundo, vem sendo agredido de forma sistemática e deliberada por um dos três poderes constitucionais – o Judiciário, que é justamente aquele que tem por dever principal garantir que as leis do país sejam respeitadas e que os dois outros poderes obedeçam a Constituição em cada um de seus 250 artigos.

A prisão arbitrária e ilegal do deputado Silveira é apenas mais um chute no pau da barraca da democracia brasileira. Para resumir a opera: há dois anos inteiros, desde março de 2019, o STF conduz um inquérito policial inteiramente fora da lei, sem indiciados, sem um crime específico a apurar, sem prazo para terminar, sem direito de defesa para os acusados – uma aberração perpétua em que o STF age como vítima, polícia, promotor e juiz ao mesmo tempo, e que vem sendo usada para perseguir quem desagrada qualquer dos onze ministros, pela razão que for. A conversa de que esse aleijão jurídico serve para “defender a democracia dos seus inimigos” é apenas e unicamente isso – conversa.

Um Congresso Nacional e um Poder Executivo que ficam o tempo todo de quatro diante desse Judiciário, em nome das “instituições”, da “harmonia entre os poderes” e da paz universal, não estão apaziguando nada, nem ninguém, com o seu comportamento. Só têm deixado o STF com um apetite cada vez maior.

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