Joaquim Barbosa disse na semana passada que o Brasil é pobre demais para políticas liberais. “Não sou favorável a posições ultraliberais num país social e estruturalmente tão frágil e desequilibrado como o Brasil, com desigualdades profundas e historicamente enraizadas”, disse o juiz em entrevista.
É a ideia bem comum de que o liberalismo só dá certo em países ricos – já países vulneráveis como o Brasil precisam de um Estado forte que resgate os pobres.
Um argumento contrário a essa ideia tem mais de 1 bilhão de habitantes. É a China. A China viveu nas últimas décadas a maior redução de miséria da história do mundo. E fez isso adotando políticas liberais e ‘ultraliberais’.
Quando Mao Zedong morreu, em 1976, a China era muito mais pobre e “estruturalmente frágil” que o Brasil. Tinha 930 milhões de habitantes, dos quais 600 milhões eram miseráveis. Entre 1959 e 1961, 30 milhões de chineses haviam morrido na maior crise de fome do século 20. Sem fábricas de fertilizantes, agricultores disputavam fezes dos vizinhos para usar como adubo.
Quando Deng Xiaoping baixou tarifas de importação de 100% para 5% e abriu o país ao lucro, à livre iniciativa e à instalação de fábricas estrangeiras, a China iniciou uma onda de prosperidade que retiraria mais de 500 milhões de pessoas da miséria em três décadas. A pobreza extrema caiu de 63% da população em 1981 para menos 10% em 2004.
Não foi via Estado de Bem-Estar social que a China propiciou esse milagre. O país tem leis trabalhistas muito menos rígidas que as do Brasil e cobra mensalidade na maioria das escolas públicas. Até tem um programa similar ao Bolsa Família, o “bidao”, que começou em 2001, bem depois que a pobreza começou a despencar. O que salvou os chineses da miséria foi o aumento da produtividade e o crescimento econômico.
Hoje, o salário médio pago pela indústria chinesa já supera o do Brasil e do México e se aproxima dos salários recebidos na Grécia e em Portugal. A produtividade chinesa está ultrapassado a do Brasil, como mostra esse gráfico da revista Economist:
Não que programas de transferência de renda não tenham seu valor. Podem tirar as pessoas da chamada “armadilha da pobreza” – quando os pobres estão tão famintos, sujos e desesperados que não conseguem um emprego, e por isso continuam famintos, sujos e desesperados.
Mas até mesmo os principais apoiadores do Bolsa Família (como Marcos Lisboa e Ricardo Paes de Barros) repetem que o aumento da produtividade e o crescimento econômico são os motores mais importantes de redução de pobreza. “A melhor política social hoje é conquistar ganhos de produtividade”, costuma dizer o economista Ricardo Paes de Barros.
Joaquim Barbosa discorda. “Evidentemente, elas [as políticas liberais] não são solução para a grande miserabilidade que é a nossa marca de origem e que nós, aparentemente, insistimos em ignorar”, disse ele.
Não, Joaquim. O Brasil não é pobre demais para ser liberal. É pobre, e justamente por isso precisa de políticas liberais.
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