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Leonardo Coutinho

Leonardo Coutinho

Brasil, América Latina, mundo (não necessariamente nesta ordem)

Ásia

A agressividade da China tem explicação: o país está mal e corre contra o tempo

Trabalhador em fábrica em Wendeng, no leste da China (Foto: EFE/EPA/XINHUA/Guo Xulei)

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Trago uma péssima notícia para os chinalovers. A China já atingiu ou está próxima de atingir o pico. Isso significa uma redução dramática do seu crescimento e um aumento substancial de seus problemas internos e externos. A ascensão da China como potência global deixou uma marca indelével no cenário mundial. Embora ela esteja longe do colapso, é importante ressaltar que a China está a anos-luz do boom que a tirou da indigência proporcionada pelo comunismo.

Motor do rápido crescimento chinês, a economia está em franca desaceleração. Depois de atingir uma taxa de crescimento anual de 14% em 2007, a China só desceu a ladeira. Em 2019, pré-Covid, registrou 6% de crescimento do PIB. Durante a pandemia, os números ficaram abaixo de 2%.

A ladeira da economia chinesa é tão íngreme que no primeiro trimestre de 2022 o crescimento medido foi de 0,4%. Nesta semana, o Partido Comunista divulgou o que, segundo eles, é uma “retomada do crescimento”: o “impressionante” 6,3% de crescimento para os primeiros meses de 2023, mas omitindo que é em relação ao resultado pífio do período anterior. A economia chinesa soluçou, mas praticamente não saiu do lugar e tampouco dá sinais de que reverterá a tendência de estabilização em níveis bem modestos de crescimento anual.

A taxa de desemprego entre jovens de 16 a 24 anos atingiu o nível recorde. É hoje de 21,3%.

O fosso chinês é ainda mais profundo. A produtividade da indústria chinesa tem caído a uma velocidade constante nos últimos 15 anos. Isso significa que os chineses estão gastando cada vez mais e produzindo menos por hora de trabalho. Aquela China barata não existe há tempos. O mercado interno chinês está mais guloso, e o mundo entendeu que não dá para ficar dependente da “fábrica chinesa” e está buscando novas fontes de produção. Essa combinação é um problema. Um enorme problema.

Como se não bastasse, a China está diante de uma catástrofe demográfica. Sua população está envelhecendo. Até 2050, a China perderá 200 milhões de adultos em idade ativa – uma população próxima à do Brasil somente de idosos, que se somarão aos que já estavam fora do mercado. Em três décadas, projeta-se que 35% da população terá mais de 60 anos. A China não terá braços suficientes para ser a China “fábrica do mundo” tal como conhecemos.

As consequências fiscais e econômicas não podem ser definidas com outra palavra que não seja devastadoras. Os atuais 10% do PIB que a China despende com saúde e previdência deverão consumir cerca de 30% da economia. O quadro só será diferente se o Partido Comunista deixar os milhões de velhinhos sem assistência, para morrerem à míngua.

A crise chinesa se reflete na urgência com que o regime abandonou a fantasia vestida por Deng Xiaoping no final dos anos 70 e que por 40 anos ludibriou o mundo – a China estava se abrindo economicamente e politicamente e abraçaria valores como democracia, defesa dos direitos humanos e a liberdade de mercado.

As reações chinesas às críticas sofridas durante a pandemia de Covid-19 deixaram claro o jogo chinês. Os líderes do país mostram que a China não está disposta a mover um centímetro de sua marcha rumo ao futuro glorioso que lhe é devido pelo mundo. Ou seja, a China avisou que não vai se adaptar ao mundo. Pelo contrário, caberá ao mundo mudar para que se adeque ao que é a China. Eles subiram várias notas no nível de agressividade nos campos político e diplomático e elevaram muitíssimo a temperatura, ao mostrarem que estão dispostos a ir para guerra caso alguém atravesse o seu caminho.

As tensões no Mar do Sul da China e em Taiwan mostram os movimentos que os chineses estão coordenando para criar a impressão de que são invulneráveis. Que chegaram à maturidade, em todos os aspectos – inclusive no da defesa.

O que acontece é que o dragão está nervoso. Encurralado. Os chineses sabem, melhor do que qualquer um, o que o futuro lhes reserva. E por isso estão tão ativos ou até raivosos, pode-se dizer. O avanço chinês sobre a África e a América Latina já se explicava pela necessidade de garantir terras agricultáveis, pastagens e água para produção de comida.

Mas, com um horizonte de escassez de mão de obra se aproximando, Pequim – que já corria para garantir o máximo de controle de recursos naturais e terras – agora acelera o passo para garantir um certo nível de controle sobre quem, em um futuro não muito distante, possa trabalhar barato para suas empresas, que expandirão suas atividades na África e América Latina.

Os movimentos precisam ser rápidos, pois Pequim tem que aproveitar a ilusão de que eles são os salvadores que injetaram bilhões de dólares em países quebrados ou totalmente endividados com a China, ou simplesmente lugares como o Brasil – onde as elites políticas, acadêmicas e produtivas já foram capturadas pelos bons lucros que a relação com a China oferece.

A China tem pressa. Sabe que se não for agora, pode não ser nunca mais. Por mais improvável que possa parecer, a China está em vias de declínio. Não será hoje. Nem será amanhã. Mas 2050 não está tão longe assim.

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