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O ditador venezuelano Nicolás Maduro convocou um evento para o fim de julho, para formalizar mais cinco anos no comando do regime. Por conveniência, ele chamou o espetáculo de “eleição”. Como dono da festa, Maduro escolheu quem pode entrar. Ele escalou seus leões de chácara posicionados na Suprema Corte e no Conselho Eleitoral Nacional para conter os penetras.
O pouco que resta de oposição na Venezuela foi barrado na porta.
María Corina Machado, a mais relevante entre todos, ficou de fora. Quem não se lembra do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva recomendando que ela parasse de chorar e indicasse um nome para substituí-la no bailinho de Maduro? Sem alternativas, ela indicou Corina Yoris. Maduro também vetou.
O impensável. O Itamaraty soltou uma nota queixando-se do amigo de Lula. O próprio Lula também se queixou da falta de participação de opositores.
O nível de abandono dos venezuelanos os deixa vulneráveis a qualquer aceno. Só isso explica como a oposição não consegue enxergar o jogo de cena de Lula e outros líderes esquerdistas da região que “condenaram” as ações de Nicolás Maduro
A oposição venezuelana se encantou. Viu nas palavras brasileiras uma chance de conseguir um ingresso para o show de Maduro. Machado e sua sobressalente Yoris correram para o X para agradecer o apoio do petista. A senhora Yoris chegou a dar uma entrevista ao jornal Folha de S. Paulo na qual diz que “Lula pode incentivar a democracia na Venezuela”.
O nível de abandono dos venezuelanos os deixa vulneráveis a qualquer aceno. Só isso explica como a oposição não consegue enxergar o jogo de cena de Lula e outros líderes esquerdistas da região que “condenaram” as ações de Nicolás Maduro. A nota do Itamaraty foi construída em comum acordo com os venezuelanos. A resposta “furiosa” da chancelaria chavista também foi parte da combinação.
Lula, Celso Amorim e o PT não dão a mínima para María Corina Machado, Corina Yoris ou qualquer outro opositor venezuelano. Lula entrou em campo para ajudar Maduro a legitimar sua “democracia relativa”. E a reação desesperada dos opositores tende a colaborar.
Quem são os líderes escalados para ajudar a validar o simulacro de eleição de Maduro? Além de Lula, o colombiano Gustavo Petro, que também “fez críticas”, faz parte do grupo de suporte ao chavismo.
Quando a oposição considera que a dupla é isenta e que tem compromisso com a democracia (sem que seus discursos não tenham efeito prático algum) essa mesma oposição prepara o argumento para que Lula e Petro ratifiquem a vitória de Maduro.
“Mas o que a oposição poderia ter feito?”, alguém pode (e deve) perguntar.
Muito menos para fazer mais. Bastava dizer: “Muito obrigado, presidente Lula, por sua manifestação ainda que tardia. Esperamos que esta seja uma mudança de rumo de sua política exterior marcada até agora pelo alinhamento com o regime e passe a cobrar mudanças que vão muito além da ‘preocupação’. A primeira delas é reconhecer que Maduro não joga limpo. A segunda é se redimir e entender que o simples fato de María Corina Machado não ser a candidata já é a evidência de que a ‘eleição’ é um circo”.
Obviamente isso não é possível no mundo real. Mas o que não é possível mesmo é o pessoal acreditar que Lula está do lado deles. Coitados.
Não existe fim para ditadores que não a morte, o exílio ou a prisão. Maduro não está disposto a nenhum deles
O pessoal se esquece de que Lula usou o aparato da Odebrecht para pagar campanhas de Hugo Chávez e Maduro. Que o petista foi garoto-propaganda deles e que, de volta ao poder, tem trabalhado para reabilitar o regime de Maduro.
A cegueira tem impedido de enxergar que não existe eleição. Que o papel da oposição é meramente figurativo e que Nicolás Maduro não vai sair. Não existe fim para ditadores que não a morte, o exílio ou a prisão. Maduro não está disposto a nenhum deles.
Não conseguem ver que, ainda que María Corina Machado fosse habilitada, a “eleição” sob as regras e os métodos de manipulação de Maduro não significa nada.
É horrível falar assim. Parece desmerecer quem está lutando pelo restabelecimento da democracia na Venezuela. Não é isso. Trata-se do desalento de ver que está em curso uma luta desigual não apenas em forças, formas, mas em regras.
Maduro seguirá no poder. Só não vê quem não quer.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos