No dia primeiro de julho, o Partido Comunista Chinês vai completar 100 anos. Em resumo, o século de história pode ser contado assim: participação em golpe, clandestinidade, uma guerra civil, tomada do poder, uma tragédia humanitária e política que combinadas deixaram um saldo de 70 milhões de mortes, uma ditadura que restringe as liberdades individuais e persegue minorias, a normalização das relações com o Ocidente, o chão de fábrica do planeta, a escravidão como vantagem competitiva, a ascensão econômica e a nova potência mundial.
Trata-se de um resumo intencionalmente rasteiro. Quem quiser saber um pouco mais sobre o PC chinês pode clicar aqui. O que importa, neste aniversário do Partido Comunista, é o esforço brutal de normalizar o regime aos olhos ocidentais. Pequim está torrando um dinheiro e tanto para passar uma mensagem: Somos uma democracia diferente daquela que vocês estão acostumados. Por favor, olhem para a gente com mais atenção. Aprendam o nosso modelo. Nos aceitem. São estas as mensagens evidentes que vêm do PCC.
O Partido Comunista Chinês chegou aos 100 anos querendo ser aceito. Não pense que é como um problema de fundo psicológico típico de quem busca aprovação. Pequim não está disposta a mudar nem um milímetro para que o mundo enxergue da forma como vê o regime. Sob o comando de Xi Jinping, a ditadura quer que o mundo mude para enxergar a China sob as lentes chinesas.
Pode parecer confuso ou exagerado, mas é algo que está acontecendo agora e todos estamos imersos neste processo de captura de elites – que inclui academia, meios de comunicação, políticos, grupos empresariais e uma série de outras criaturas que somente o darwinismo é capaz de explicar tamanha capacidade de adaptação.
A imagem que ilustra esta coluna é um bullying antigo que é aplicado ao presidente Xi. O bacanérrimo Winnie-the-Pooh teve sua imagem associada à de Xi Jinping, por causa de uma fotografia na qual Xi aparece, em 2014, ao lado do então primeiro-ministro japonês Shinzo Abe em um aperto de mãos nada empolgante e que os opositores chineses compararam aos personagens criados pelos britânicos Alan Alexander Milne e Ernest Howard Shepard.
Pobre Ursinho Pooh.
Mas Xi se sentiu ofendido. Como assim o líder supremo de um regime com aspirações de se tornar a principal potência mundial poderia ser comparado a um personagem tão doce? Seus censores entraram em ação e toda e qualquer referência ao urso e seus amigos foi banida do país. Winnie-the-Pooh virou uma espécie de uigur dos desenhos animados.
Quando o pessoal da animação South Park, em uma crítica à servidão da indústria de entretenimento dos Estados Unidos frente aos desejos do PC chinês, fez referência ao personagem Pooh, a série também passou a ser proibida.
Nas últimas semanas, vimos o embaixador chinês em Brasília escalar teóricos do comunismo para lecionar sobre a “normalidade” da democracia chinesa. Ou a democracia ao estilo chinês. Também lemos artigos de funcionários formais e informais do regime. Uma lista de defensores de um conceito curioso de que a China é uma democracia diferente.
Uma democracia tão diferente, mas tão que não tolera nem o peludinho Winnie-the-Pooh.
Mas o Partido Comunista Chinês se esforça para que arbitrariedades sejam vistas como coisas normais. Muita gente já entende e aceita o regime com a mesma normalidade com que olha as horas em um relógio de pulso ou no celular. Nem todo mundo se convenceu pelo bolso, o regime se esforça em mudar a percepção. Parece difícil, mas não é impossível.
Se Xi não fosse tão inseguro, ele abraçava o Pooh, como parte do esforço de vender uma imagem irreal de seu regime. Mas Xinnie-the-Pooh é ameaçador demais.