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Leonardo Coutinho

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Tecnologia

Parece o PT ou o PCdoB, mas é o ChatGPT: como a inteligência artificial retrata ditadores

Página de login da plataforma de inteligência artificial ChatGPT, em apresentação em Pequim na última quinta-feira (9) (Foto: EFE/EPA/WU HAO)

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Resolvi fazer ao ChatGPT, a plataforma de inteligência artificial que está na crista da onda, a mesmíssima pergunta sobre alguns líderes mundiais: “Fulano de tal é um ditador?”. A estratégia foi simples. Busquei nomes bem fáceis para dar uma ajuda para o ChatGPT, que ao que consta ainda está em fase de aprendizagem. Comecei perguntando por Omar al-Bashir, que foi o manda-chuva do Sudão entre 1989 e 2009. “Omar al-Bashir é um ditador?”

“Sim”, disse o ChatGPT. Além da resposta categórica, a plataforma ofereceu bastante contexto sobre a destruição institucional, autoritarismo, violação aos direitos humanos e tudo mais que um ditador pode fazer para destruir as liberdades para se manter no poder.

Mais um teste fácil. Agora era com Paul Biya, que está no poder em Camarões desde 1975, quando assumiu o posto de primeiro-ministro; depois, em 1982, pulou para a cadeira de presidente e nunca mais a deixou. “Paul Biya é um ditador?”

“Paul Biya é amplamente considerado um ditador devido a seu estilo autoritário de governança e seu domínio do poder a longo prazo.” Como assim, “amplamente considerado”? O perfil elaborado pelo ChatGPT vem recheado de definições como “o governo de Biya tem sido caracterizado pela falta de liberdade política e repressão das vozes da oposição” ou “o governo também tem sido acusado de abusos de direitos humanos, incluindo o uso de força excessiva contra manifestantes, restrições à liberdade de expressão e reunião, e a tortura e maus-tratos de presos políticos”, mas mesmo assim os algoritmos não cravaram “sim”.

Resolvi então fazer um teste bem óbvio. “Teodoro Obiang é um ditador?” Antes de ir à resposta, é importante lembrar quem ele é. Obiang está no poder na Guiné Equatorial desde 1979, quando instaurou uma ditadura marcada por corrupção, perseguições políticas e violação aos direitos humanos. A resposta do ChatGPT foi idêntica à pergunta sobre Biya. “[Teodoro Obiang] é amplamente considerado um ditador devido a seu estilo autoritário de governo e seu domínio do poder a longo prazo.”

Dá para fazer uma pergunta ainda mais fácil de ser respondida pelo ChatGPT? Dá. “Kim Jong-un é um ditador?”

Para a inteligência artificial, o malucão atômico que lidera o país-prisão chamado Coreia do Norte “tem sido acusado de inúmeros abusos de direitos humanos, incluindo repressão política, tortura, trabalho forçado e assassinatos extrajudiciais”. Entretanto, o perfil alerta para algo muito importante:

“Dadas a falta de liberdades políticas e a natureza altamente centralizada do governo norte-coreano, muitos especialistas consideram Kim Jong-un como um ditador. Entretanto, é importante notar que a situação na Coreia do Norte é complexa, e as opiniões sobre seu estilo de liderança variam”.

Parece que o ChatGPT se alimenta das notas do PT e do PCdoB.

E o Daniel Ortega, o companheirão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da ex-presidente Dilma Rousseff e do deputado federal Guilherme Boulos? Ortega venceu um simulacro de eleição depois que ele mandou prender todos os candidatos concorrentes. Não satisfeito, ordenou o espancamento e a prisão de centenas que foram às ruas protestar. Ele também mandou fechar igrejas e prender padres e bispos que fizeram críticas ao seu “estilo de governo”. Recentemente, retirou a cidadania de opositores e os enviou para o exílio.

Então, ChatGPT, Daniel Ortega é um ditador?

“Daniel Ortega é o atual presidente da Nicarágua, e está no poder desde 2007. Embora tenha sido inicialmente eleito em uma eleição democrática, seu governo foi acusado de tendências autoritárias, e ele tem enfrentado críticas por ter reprimido os partidos de oposição, a sociedade civil e a mídia independente.”

Mais adiante, o ChatGPTfaz um alerta: “Embora alguns tenham rotulado Ortega como um ditador, a situação na Nicarágua é complexa, e as opiniões sobre seu estilo de liderança variam”.

Realmente, o ChatGPT deve se alimentar das notas do PT e do PCdoB.

As respostas revelam mais que uma debilidade do mecanismo que, por meios de programações e algoritmos, vai buscar as informações em fontes disponíveis na internet. Um sinal de que ou os programadores indicam caminhos bem amigáveis para a imagem de ditadores, ou há uma profusão de informações que tingem de rosa e cobrem de purpurina a biografia de autocratas.

O chinês Xi Jinping acabou de ganhar mais um mandato de cinco anos. Vamos ver o que o ChatGPT acha dele. A pergunta foi a mesma. A resposta foi um primor.

“Algumas pessoas caracterizam seu estilo de liderança como autoritário, pois ele supervisionou uma repressão à dissidência e implementou políticas que limitam a liberdade de expressão na China. Entretanto, a classificação ou não de Xi Jinping como ditador é uma questão de debate e interpretação.”

Para arrematar, o ChatGPT termina o perfil com o seguinte destaque:

“Em última análise, como caracterizar o estilo de liderança de Xi Jinping é uma questão de interpretação e opinião política”.

Parece que, além de se alimentar das notas do PT e do PCdoB, a plataforma também tem aprendido sobre a fluidez do conceito de democracia com os porta-vozes do regime chinês.

O teste incluiu o venezuelano Nicolás Maduro, os líderes cubanos (Fidel Castro, Raúl Castro e Miguel Diaz-Canel), o russo Vladimir Putin e o bielorrusso Alexander Lukashenko. Todos foram tratados com a complacência da zona cinzenta do é, pode ser, mas depende de quem vê. Fala de “estilo de governo” e de “contexto político e social complexo” para julgar melhor cada caso.

O ChatGPT parece no fundo um estudante que está aprendendo com aqueles professores de história, youtubers ou economistas de sindicato que fazem sucesso nas redes sociais. A questão é que o “estudante” em questão logo vai ser professor. E será isso aí que ele vai ensinar para pessoas reais.

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