Ao atacar os carros, os vândalos acreditam atingir a influência de Elon Musk.| Foto: Allison Robbert/EFE/EPA/POOL
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Nesta semana, enquanto carros da marca Tesla, de Elon Musk, ardiam em estacionamentos das concessionárias ou eram vandalizados pelas ruas dos Estados Unidos, dois astronautas que estavam há nove meses presos na Estação Espacial Internacional voltaram para casa, pode-se dizer, de Tesla. Uma operação sensacional que colocou fim a meses de apreensão e riscos.

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A cápsula Crew Dragon, desenvolvida pela empresa Space X, do também dono da montadora de carros elétricos, pousou na costa da Flórida exatamente como previsto e com a tripulação em segurança.

Poucos tiveram a experiência de fazer uma viagem espacial. Mas muitos sabem o que é estar a bordo de um Tesla. Para quem já esteve atrás do volante de um, assistindo o carro fazer literalmente tudo (e melhor) que um motorista humano, fica mais fácil compreender como Musk e seus engenheiros conseguiram superar, em vários aspectos, as agências espaciais estatais.

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Mas nessa semana de tantos contrastes envolvendo a Tesla, sua irmã SpaceX e seu dono, ficou mais evidente como a profunda polarização social está empurrando as pessoas para o obscurantismo e reações primitivas. 

Gente que até o ano passado, a despeito de não ir muito com a cara de Musk, via os veículos da marca Tesla como símbolo de sustentabilidade e progresso, agora não só torcem o nariz como, em casos extremos, danificam carros como resultado de distorções morais, ideológicas e psicológica de quem projeta no objeto a imagem do inimigo.

O ódio e a ignorância impedem as pessoas de refletir que os carros que estão sendo vandalizados são de pessoas comuns – muitos deles eleitores do partido Democrata e tão rivais de Donald Trump e Elon Musk.

Com medo do vandalismo como “manifestação política”, muitos donos de Tesla estão colando adesivos em seus carros para explicitar suas posições políticas contrárias às do bilionário. Quem faz isso espera não ter seu carro marcado com uma suástica – o símbolo preferido dos manifestantes, que curiosamente se autoproclamam antifascistas.

Comparações com o nazismo e o holocausto são sempre indevidas. Mas, como os vândalos recorreram aos símbolos da época, não é demais lembrar que quem escolheu a estratégia de estampar uma marca para definir o seu inimigo foram exatamente os nazistas. 

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Logo após a invasão da Polônia pelas tropas de Adolf Hitler, em 1939, os judeus de diversas localidades daquele país foram obrigados a usar um “distintivo” que denunciasse a sua condição. Anos depois, a prática foi disseminada e todo judeu que vivia nas áreas invadidas por Hitler tinha que ter costurada em sua roupa uma estrela amarela.

A projeção do ódio aos objetos também esteve presente nos tempos sombrios que antecederam a perseguição sistemática dos judeus na Europa. Em novembro de 1938, uma noite de vandalismo direcionado as sinagogas e aos negócios e casas pertencentes aos judeus foi o primeiro ato explicito da fúria provocada pela propaganda antissemita do regime nazista que demonizava a comunidade judaica transformando-a em bode expiatório de todas as mazelas da época.  

Os paralelos históricos da Alemanha nazista e o vandalismo do presente são uma extrapolação, quero ressaltar. Mas eles servem para nos ensinar algo. Embora o contexto e a escala difiram significativamente, o mecanismo subjacente de projetar ódio sobre objetos associados a um grupo ou indivíduo detestado apresenta uma semelhança perturbadora. 

Essa associação simbólica, quando combinada com intensa polarização política, pode levar à desumanização do alvo e à justificação de atos destrutivos que não se limitam às propriedades.

A escolha de protestar contra objetos, em vez de direcionar a raiva diretamente ao indivíduo ou à entidade que se opõe, revela aspectos importantes da psicologia social e política.

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No caso da Tesla, seus carros tornam-se sinônimos de Elon Musk e de suas ações políticas. 

A psicologia por trás do protesto contra símbolos sugere que o ato de vandalismo contra a Tesla não se trata meramente de causar dano financeiro a Musk, mas a qualquer um que tenha se “associado” a ele. Ainda que seja pelo simples fato de comprar um carro.

A expressão de oposição política e ideológica por meio da violência (algo que pode ser até entendido como terrorismo) ignora o fato de que o carro que está sendo destruído não é mais do Elon Musk

Ele foi comprado, quase sempre em longos financiamentos, por indivíduos que não têm absolutamente nada a ver com o fabricante. Ainda que possam ser seus simpatizantes.

Ao atacar os carros da Tesla, os vândalos acreditam atingir a influência de Elon Musk. E quanto mais as ações da Tesla caem, mais críticas são feitas e mais fogo é tocado nas ruas, eles acreditam que a estratégia violenta é o caminho da vingança. Mas a história nos ensina que a desumanização começa frequentemente com o ataque simbólico e a destruição de seus bens.

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