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A frase acima está grafada em uma bandeira que, durante a revolução que resultou na independência dos Estados Unidos, flamulava diante das tropas continentais que lutaram contra as forças britânicas. Inspirada em uma ilustração publicada em 1754, em um jornal de Benjamin Franklin, o pavilhão traz uma cascavel pronta para o bote sobre os dizeres do título desta coluna, que em português significam “Não pise em mim”.
O corpo da serpente tinha 13 gomos, em referência à quantidade de colônias que existiam na América e que viriam a dar origem aos Estados Unidos, depois da guerra que teve como gatilho o abuso da coroa sobre os colonos cada vez mais esmagados por impostos extorsivos.
Os americanos acabaram de declarar os seus impostos. Todo dia 15 de abril é a data limite para ajustar as contas com o fisco. Um ajuste amargo para muitos, em um país que oferece cada vez menos em retorno para aqueles que pagam seus impostos. Um acerto de contas intragável quando se vê que o Estado, cada vez mais sob a influência populista, premia quem não contribui.
Na mesma semana em que milhões de americanos enviaram suas declarações de impostos e muitos deles tiveram de meter a mão no bolso para pagar impostos adicionais aos já retidos, eu me deparei com uma cena que resume uma contradição americana.
Em muitas partes dos Estados Unidos, nos chamados “estados ou condados santuário”, imigrantes ilegais são muito mais bem tratados que norte-americanos pobres, nascidos e criados no país
Um Ford Explorer 1995, caindo aos pedaços, foi estacionado bem em frente à calçada onde esperava por uma pessoa. Uma mulher de uns 20 anos desceu, ajustou as calças, e sem olhar ao redor, contornou o carro e abriu a porta de trás do veículo, de onde tirou uma daquelas cestinhas com um bebezinho de poucos meses.
Sua camiseta sem mangas expunha uma tatuagem preta sobre sua pele alva. Uma bandeira dos Estados Unidos (a atual), envolta por rosas e algumas outras coisas que não dava para entender.
Depois de pegar a criança, ela tirou um pacote de comida com a marca de uma rede fast food de comida mexicana, trancou o carro e foi até o interfone do prédio ao lado. Era uma entrega de comida. Com um bebê recém-nascido em uma cestinha, ela estava trabalhando para um aplicativo de entrega, como é o iFood no Brasil.
Ela entregou a comida nas mãos do cliente, que a saudou e brincou com o bebê. Depois, ela virou as costas, caminhou até o carro, abriu a porta, instalou o dispositivo com a criança no assento traseiro e foi embora.
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Enquanto o carro partia, vi que a placa de seu carro era nada menos que a Bandeira de Gadsden, como é o nome formal do símbolo revolucionário da cascavel e o mote “Não pise em mim”.
Não faço ideia do nome dela. Se ela cuida sozinha daquele bebê, que é a sua companhia na jornada de delivery, se tem marido, ou se tem e se ele também está no trabalho. Mas uma coisa é certa: no dia 15 de abril, ela declarou seus impostos. Ou pelo menos deveria tê-lo feito.
O símbolo da placa de seu carro, embora tenha sido malandramente transformado pelos esquerdistas em sinônimo de racismo, é uma expressão original americana de descontentamento com o peso do Estado sobre a vida dos cidadãos. Peso este manifestado, entre várias coisas, pela cobrança de impostos pesados.
Apesar de ser mulher e pobre, ela é branca. Um fator que faz com que a rede de proteção social não seja tão generosa como as minorias. E não se trata apenas de “raça”. Em muitas partes dos Estados Unidos, nos chamados “estados ou condados santuário”, imigrantes ilegais são muito mais bem tratados. Em Nova York, por exemplo, a prefeitura local está torrando uma fortuna em diárias de hotel para abrigar milhares de ilegais que desaguaram na cidade durante a atual crise migratória.
Enquanto as mães norueguesas ganham até um ano de licença-maternidade remunerada, os impostos da entregadora americana – que leva seu bebezinho de porta em porta em sua atividade de delivery – pagam pela defesa da Noruega
Os defensores da imigração ilegal como instrumento benéfico para a economia dos Estados Unidos citam números estratosféricos. Quase sempre verdadeiros, mas são um recorte da realidade. Por mais que contribuam muito, os ilegais consomem muitos recursos públicos. Um estudo apresentado no Congresso dos Estados Unidos mostrou que os ilegais são um sorvedouro de dinheiro público. Seja por meio de benefícios, seja pela sobrecarga nos sistemas públicos como as escolas.
A injustiça tributária tem reflexos do outro lado do Atlântico. O ex-presidente Donald Trump já denunciou diversas vezes a falta de compromisso dos europeus com a sua própria defesa. Na última delas, em fevereiro, ele cometeu o disparate de dizer que, se reeleito, deixaria a Europa à própria sorte diante de uma Rússia cada vez mais agressiva. Trump se queixa do fato de os Estados Unidos investirem sozinhos na defesa da Europa mais do que a soma de todos os aportes dos outros 29 membros.
Suponho que, em um primeiro momento, Trump nem se queixava de colocar tanto dinheiro na defesa da Europa, mas do fato de muitos dos países não cumprirem o compromisso de investir 2% de seu PIB em defesa. Enquanto as mães norueguesas ganham até um ano de licença-maternidade remunerada, os impostos da entregadora americana – que leva seu bebezinho de porta em porta em sua atividade de delivery – pagam pela defesa da Noruega, que tem Vladimir Putin em seu pescoço.
Os Estados Unidos têm uma conta natural a ser paga pelo seu poder e influência. Mas está cada vez mais evidente para o cidadão americano o abuso do mundo em relação a esse papel
Enquanto franceses, alemães, italianos, espanhóis, dinamarqueses e holandeses, por exemplo, se jactam de suas universidades gratuitas para seus cidadãos e veem com desprezo os grosseirões da América, os impostos de pessoas como a entregadora e seu bebezinho financiam a segurança dessas nações, que não cumprem com sua cota de participação na Otan. Enquanto a entregadora certamente não conseguiu ir para uma universidade por causa das altas mensalidades, os afortunados europeus conseguem dar educação grátis, pois lhe sobram recursos. Afinal, são os rudes da América que pagam as contas da Otan.
Há um ressentimento crescente nos Estados Unidos diante de um mundo que lhes transfere a fatura de seus problemas. Os Estados Unidos têm uma conta natural a ser paga pelo seu poder e influência. Mas está cada vez mais evidente para o cidadão americano o abuso do mundo em relação a esse papel. Seja por meio da explosão da imigração ilegal, seja pelo patrocínio do Estado de bem-estar social dos europeus.
O mote Don’t tread on me nunca foi tão atual. Para o bem e para mal.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos