O presidente do Chile, Gabriel Boric, em visita esta semana à região de Tarapacá, na fronteira com a Bolívia, epicentro da crise migratória no país| Foto: EFE/Presidencia De Chile
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O Chile rodava redondo. Redondinho. Era um país cheio de bons exemplos para o continente. Mas uma parcela dos chilenos não estava feliz. Caiu no conto bolivariano, que dizia que o país bem-resolvido da região estava de mal a pior. Então, resolveu revolucionar. Em 2019, foram para as ruas e promoveram uma quebradeira sem precedentes. Sem identidade, sustentação e coragem, o governo de turno ficou engolfado. Aquele país-modelo, que todos invejavam na América Latina, caiu na armadilha e ficou com vergonha da sua imagem diante do espelho. Acreditou que era feio e resolveu mudar.

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Nos últimos quatros anos, o governo do Chile tentou emplacar uma nova Constituição – que foi redigida, mas rechaçada em um referendo popular – e tem marchado a passos largos rumo ao populismo de esquerda, embora seu presidente, Gabriel Boric, tenha demonstrado ter mais juízo que a maioria de seus pares esquerdistas da região. Talvez, por isso, Boric esteja sob fogo amigo.

A arma escolhida é a migração irregular.

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Assim como os cartéis mexicanos, as maras centro-americanas e o regime de Nicolás Maduro estimulam, financiam e instrumentalizam movimentos massivos de imigrantes com o objetivo de gerar instabilidade na vizinhança. Principalmente na fronteira sul dos Estados Unidos, os bolivarianos utilizam o sofrimento e o desespero de suas próprias vítimas contra os inimigos.

O Chile vive uma crise derivada da migração massiva de venezuelanos e haitianos, que penetram livremente as fronteiras do país vindos da Bolívia. No mês passado, Boric enviou as forças armadas para tentar conter a invasão. Mas a Bolívia segue de braços cruzados, servindo de trampolim para a entrada de centenas de pessoas que foram informadas de que no Chile encontrarão a prosperidade.

O líder cocaleiro e ex-presidente Evo Morales está por trás da violência de matriz étnica e sindical no sul do Peru, sonha em roubar um naco de terra do Chile e também mina a estabilidade no norte deste país. Insuflando separatismo e rebelião.

Para os padrões de Nicolás Maduro, Evo Morales e Daniel Ortega, Boric possivelmente não é suficientemente revolucionário. Por causa disso, o caos migratório pode ser apenas o início da sabotagem bolivariana. Se as coisas piorarem por lá, o arsenal contra ele pode incluir a volta dos “movimentos sociais” para as ruas e a implosão da segurança pública (o tráfico de drogas é política de Estado na Bolívia).

Mais ao norte, na Colômbia, a vice-presidente Francia Márquez gastou parte de uma entrevista para um dos principais meios de comunicação de seu país para defender que Cuba não é uma ditadura. Além disso, ela definiu com precisão o que vem a ser ditadura ou democracia para a esquerda latino-americana: “Uma ditadura e uma democracia não se medem apenas pelas eleições. Se medem pelas transformações sociais”.

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Ou seja, Francia entrega que para ela – e para muita gente que enche o peito para falar de democracia – o conceito é tão flexível quanto uma vara de bambu. Ganha significado conforme o lado para onde sopra o vento. Se o governo/regime é companheiro, é democracia. E das boas. Se o governo/regime não faz parte de sua visão revolucionária, é uma ditadura.

Parece simplista, mas não é. No ano passado, antes mesmo de tomar posse, Francia esteve no Brasil para oferecer sua voz para denunciar o risco de golpe no Brasil e proteger a democracia. Papo que deu uma camada de verniz a muita gente que pensa que “uma ditadura e uma democracia não se medem apenas pelas eleições. Se medem pelas transformações sociais”, para se olhar no espelho e se ver como o guardião ou salvador de algo que ganhou o nome de democracia, mas é algo bem diferente.

Na América Central, o salvadorenho Nayib Bukele está esmagando as gangues do país com prisões em massa, em presídios que têm gerado imagens cinematográficas, bem ao estilo de filmes do Batman. A mão forte de Bukele contra o crime está tocando fundo no coração dos direitistas em todo o continente. Muitos políticos querem ser como Bukele. Muita gente quer ser governada por Bukele.

Ninguém para pensar, entretanto, que o espetáculo do político-estrela de El Salvador tem vida curta. E o aprisionamento massivo está represando o problema. Os animais que ele colocou atrás das grades (sim, os mareros, como são chamados os membros das gangues, se comportam como bestas selvagens) não deixarão de ser o que são. Mais cedo ou mais tarde, eles voltarão às ruas sem que o populista Bukele tenha conseguido transformar a economia do país, direcionando-o para o desenvolvimento, combatendo a corrupção e civilizando as relações. El Salvador vai continuar sendo El Salvador e os bandidões seguirão sendo os bandidões.

Aliás, ao tratar como animais os animais das gangues locais, Bukele não dá sinais de que é afeto a comportamento civilizado. Pois, por mais que os mareros tenham assumido a violência primal como marca, o Estado não deve se tornar primitivo em seus atos. Mas Bukele está mitando. A bomba vai estourar e o resultado vai ser catastrófico.

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E a Argentina?

Como se não bastassem uma inflação de 102,5%, juros básicos em 75% e pobreza em 40%, a Argentina de Alberto Fernández está enfrentando uma seca histórica que levará à quebra de safra e redução crítica na sua pecuária. Estima-se que os prejuízos devem girar em torno de US$ 20 bilhões. É a prova de que nada que está ruim não pode piorar.