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O Twitter e o Facebook decidiram vetar a disseminação de uma série de matérias do jornal The New York Post, que publicou o conteúdo de mensagens privadas do filho do presidenciável Joe Biden que mostram o que podem ser as evidências do tráfico de influência e corrupção com a participação não só do filho, mas do próprio candidato. Além dos e-mails comprometedores, a publicação escancarou imagens de Hunter Biden drogado, fumando crack e em situações próximas a indigência. Um golpe abaixo da linha da cintura que teve a participação direta do operador de Donald Trump e ex-prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani.
Os executivos das redes sociais resolveram agir para proteger a democracia. Vetaram o compartilhamento e a abertura dos links do material do The New York Post. Um flerte com a censura que foi justificado como precaução perante um notícia com possibilidade de ser falsa e obtida a partir do trabalho de hackers.
Os donos das plataformas têm o direito de se valer desse papo furado para tomar suas decisões, mas precisam estar expostos, na mesma proporção, a um debate sobre o significado e a profundidade de seus atos.
Qual mandato lhes foi conferido para tal papel sobre a liberdade de expressão (que não é imune a consequências, sobretudo legais) e ao julgamento que cada cidadão pode fazer diante das notícias que lhe são apresentadas?
Não falta quem comemore o ato como a coroação de gestos, que já incluíram o veto a postagens do próprio presidente dos Estados Unidos, resistência da democracia. Algo não vai bem.
Há quatro anos, na reta final da campanha eleitoral de 2016, o comitê da democrata Hillary Clinton bateu de porta em porta dos jornais americanos tentando emplacar um dossiê-bomba contra o opositor Donald Trump.
O material produzido por um ex-agente da inteligência britânica havia sido encomendado pelos assessores de Hillary. A trama trazia, entre várias estripulias, detalhes picantes de encontros do candidato com prostitutas russas e relatos de cenas escatológicas que teriam sido fotografadas por espiões russos. Trump estava nas mãos de Putin.
Hillary Clinton estava com a eleição no papo. Para que os jornais penhorariam sua credibilidade com um documento sem pé nem cabeça para ajudar uma candidata que já estava eleita? Parece ter sido essa a avaliação para que o documento explosivo não tivesse sido levado à sério até o imponderável, naquele momento, acontecer. Trump venceu.
Uma onda de desespero tomou conta de muitos setores da sociedade americana. A imprensa foi um deles. Ainda na transição, o site BuzzFeed abraçou a missão de dar publicidade ao dossiê. A publicação veio com o alerta de que os jornalistas não sabiam se o que estava contido nele era verdade. Mas que era direitos dos americanos saberem os que estava contido nele.
Com as portas do inferno abertas, toda imprensa mundial embarcou na história que consumiu milhões e milhões de dólares dos contribuintes americanos em investigações que chegaram à conclusão de que o dossiê era fajuto e só serviu para inflamar a política americana.
Qual é a diferença entre o dossiê da Hillary Clinton contra Donald Trump e o vazamento dos arquivos de Hunter Biden, o filho problema do candidato democrata? O documento dos democratas prometeu fotos e nunca as mostrou. Relatou eventos que jamais foi capaz de comprovar. Inventou histórias de enrubescer a sociedade americana sem jamais mostrar um elo de conexão com a realidade.
O sensacionalista The New York Post publicou os documentos. Expôs abusivamente a decadência pessoal de Hunter Biden. Postou um flagrante em que ele fuma um cachimbo de crack. Arquivos copiados de um laptop que o filho do presidenciável deixou em uma oficina e jamais voltou para recuperar. Os originais, informa o jornal, foram entregues ao FBI.
Ambos são peça do mesmo jogo sujo. Mas qual é o jogo que está sendo jogado fora do campo eleitoral?
O que fez a imprensa americana, e agora as plataformas de mídia social, oscilarem entre a responsabilidade, permissividade e agora a censura em torno de informações tão horrorosas sobre os presidenciáveis no limiar as eleições presidenciais?
Não tem nada a ver com democracia. São negócios e preferência política.
Nada de estranho nisso. É do jogo. Mas o desonesto é travestir de altruísmo em defesa da democracia. Os cidadãos merecem que as coisas sejam chamadas pelo nome que elas têm. Merecem. Apenas merecem.