A epidemia de coronavírus provocou um efeito surpreendente no Brasil. Mesmo com as 4.119 pessoas que tiveram a morte confirmada ou sob suspeita de terem sido provocados pelo vírus chinês, a média de óbitos diários nos 23 primeiros dias de abril foi 13% menor que em março. Isso significa que em comparação com o mês anterior, 411 vidas foram poupadas por dia, conforme o sistema unificado de cartórios de registro civil. Isso quer dizer que apesar do impacto da pandemia, no período morreram 9.460 pessoas a menos no Brasil.
É para comemorar? Não. Deveria servir para causar uma certa vergonha em nós brasileiros. Os dados carecem de amadurecimento e demandarão uma análise mais profunda que eles sugerem de imediato.
Mas não há como pensar que o fato de as pessoas terem sido obrigadas a reduzir a circulação tem um impacto direto sobre o fenômeno. Os brasileiros estão se matando menos. Seja na carnificina do trânsito – que em 2019 contabilizou 40.721 mortes –, seja pela violência que no ano passado registrou 41.635 assassinatos.
Somadas, as duas fontes de mortes "não naturais" alcançaram no ano passado a cifra de 83.356 vidas perdidas. Uma média de 226 por dia. Uma tragédia que a Covid-19, ainda bem, ainda não foi capaz de superar no Brasil.
São várias as razões que fazem o vírus chinês mais assustador que o problema brasileiro. Uma delas é o fato inegável de que ninguém é capaz de saber até quando estaremos à mercê dele e quantos sucumbirão à pandemia. Outro ponto é subjetivo. Talvez os brasileiros já tenham assimilado a ideia de que a morte no trânsito ou pela violência é algo tão presente que ela já faz parte das estratégias e sobrevivência que cada um adota no dia a dia, que se tornaram tão corriqueiras como fazer um check-up ou vacinar contra a gripe.
A reclusão vai acabar, o coronavírus estará sob controle, mas nós brasileiros seguiremos nos matando. A afirmativa pode estar errada? Sim. Mas há mais chances que não.
O mundo já dá sinais de cansaço com as medidas de isolamento social. Os sinais são cada vez mais evidentes no mundo digital – que se tornou a ágora dos tempos de confinamento – e no mundo real, onde lojas fechadas, ruas vazias e desemprego em alta estão levando as pessoas que não têm mais como pagar as contas ou aluguel, estão cada vez mais driblando a ameaça do coronavírus. E os governantes precisam encontrar uma resposta.
No Brasil, as buscas no Google sobre o fim da "quarentena" decolaram. Dados analisados pela consultoria Bites indicaram o crescimento das pesquisas por informações sobre uma possível data para o fim do confinamento no Brasil. A maioria das pessoas ansiosas pelo fim das restrições de circulação reside principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo, conforme informou o gerente de relações governamentais da Bites, André Eler.
Mais do que um efeito demográfico, a origem das pesquisas no Google vem de estados onde os governadores até agora foram mais rigorosos com as restrições de circulação. Mas mesmo eles já não conseguem mais segurar o discurso do "fique em casa".
Tanto no Rio de Janeiro, quanto em São Paulo, os governadores iniciaram um relaxamento gradual das medidas de restrição de circulação de pessoas e abertura do comércio. Em várias partes do mundo, manifestações de rua estão se multiplicando pedindo a flexibilização do isolamento social ou até mesmo o seu fim.
Os brasileiros já estão saindo mais de casa, mesmo com o coronavírus em alta. Um efeito natural, provocado pela circulação maior de pessoas, será o aumento no número de casos e de mortes por Covid-19. Mas também pelo "vírus brasileiro". Contra este último, infelizmente, não há nenhuma previsão de vacina ou remédio no horizonte.
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