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Foto aérea de região de mineração ilegal no estado de Roraima, 12 de maio de 2020
Foto aérea de região de mineração ilegal no estado de Roraima, 12 de maio de 2020| Foto: Chico BATATA / GREENPEACE / AFP

É verão na Amazônia! Ou o início da estação seca, para ficar bem claro para os incautos que pensam que a região vive uma monotonia climática. O oposto é o “inverno amazônico”. A estação que é demarcada por chuvas torrenciais.

O verão amazônico oferece as condições para a temporada das queimadas e derrubadas. Com os números de focos de incêndio e as clareiras vistas desde o espaço também começa a comoção pela destruição da maior floresta tropical do planeta.

É algo que realmente faz todo sentido. Por que continuar desmatando a Amazônia? Ano após ano, justamente nessa mesma época, o mundo volta a prestar atenção na floresta. Pena que, no geral, a reação se foca nos sintomas e não nos problemas.

Um grupo de congressistas americanos já reagiu prevendo a catástrofe. No início de junho enviaram uma carta para seus pares brasileiros pedindo providências para evitar o aumento do desmatamento. Em seguida, um grupo de 29 instituições financeiras firmou um documento entregue ao governo brasileiro sinalizando a intenção de retirar seus investimentos do país caso o Brasil não mude suas políticas em relação a Amazônia.

A tática do boicote segue o rastro das queimadas, mas funciona?

De longe. Bem de longe da floresta, os seus defensores acreditam no conto que diz que a Amazônia é um paraíso que oferece as mais perfeitas condições para quem nela vive nela extrair da natureza sua subsistência. O chamado extrativismo.

Desde Chico Mendes, governos são influenciados por ongueiros e seus financiadores a acreditar que a base do desenvolvimento sustentável é o extrativismo. Já se passaram três décadas do assassinato do líder seringueiro e o movimento ambientalista ainda mantém o discurso quase inalterado.

Apesar dos bilhões de dólares despejados na região, em nome do desenvolvimento sustentável, a área desmatada na Amazônia dobrou no mesmo período. Ou seja, mesmo com 30 anos de intensas campanhas de preservação, a floresta perdeu a mesma quantidade de árvores que nos 500 anos anteriores, quando ninguém prestava a menor atenção para floresta.

Isso quer dizer que o ambientalismo foi 100% ineficiente? Claro que não. Se nada tivesse sido feito, o estrago teria sido muito maior. Mas achar que a estratégia está correta pode desperdiçar chances que garantam o futuro da floresta e de seus milhões de habitantes.

Da mesma forma que a Amazônia não foi protegida, os amazônidas não alcançaram o almejado desenvolvimento. Basta um passeio pelos principais bairros de Belém ou Manaus, por exemplo, para constatar a precariedade das redes de coleta de esgoto. Uma "imersão" nas áreas periféricas das duas maiores capitais da região revela o grau de pobreza e falta da infraestrutura. Pelo interior, o quadro é ainda mais tenebroso.

No ranking do saneamento, as capitais amazônicas ocupam posições retardatárias quando comparadas com as demais de fora da região. Manaus coleta apenas 12% do esgoto produzido por seus 2,1 milhões de habitantes. Taxa semelhante à de Belém (13%) que tem uma população de 1,5 milhão de pessoas. Nas últimas posições estão Macapá, com 10%, e Porto Velho, com 5% de coleta.

Quando o assunto é Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), fica evidente o preço que a população local paga pelo subdesenvolvimento que é imposto em nome de uma suposta preservação ambiental. Dos dez municípios brasileiros com pior IDH do Brasil, oito estão no bioma amazônico e os outros dois dentro da chamada Amazônia Legal.

Quando é que o mundo vai se incomodar com a precariedade da vida na Amazônia?

A tragédia do coronavírus na região deveria ter servido para demonstrar exatamente isso. O dado mais recente indica que a taxa de mortalidade pela Covid-19 por grupo de 100.000 habitantes na região norte é onze vezes maior que a medida na região Sul, 50% maior que a do Nordeste e quase o dobro da taxa nacional.

O subdesenvolvimento amazônico ampliou o poder do coronavírus.

Propor boicotes para os produtos amazônicos ou brasileiros é o mesmo que virar as costas para região e para as pessoas que nela vivem. A criminalização das atividades econômicas legais, colocando-as no mesmo escaninho daquelas feitas fora da lei, tem um efeito paradoxal. Afeta apenas quem atua sob as regras da lei. Bandidos não ligam a mínima para o boicote.

A Amazônia precisa de mais produtores na legalidade. Mais empresas investindo em produtos legais. Quanto mais prêmio for oferecido para quem atua na regra, mas atraente será produzir dentro da lei.

Os congressistas americanos, os investidores europeus e os editores estrangeiros não fazem a menor ideia de que quem cumpre a lei na Amazônia abre mão do uso de pelo menos 80% de sua propriedade. De forma grosseira seria como dizer para uma corretora que ela só pode operar com 80% dos recursos que tem em sua carteira. Ou dizer para o editor do The York Times só poderia imprimir suas notícias em uma fração de 2/10 de cada página. Soaria bizarro.

Mas quem cumpre a lei na Amazônia se submete a isso e não ganha prêmio algum por gerar benefícios globais pela imobilização de se capital. Nem ele. Nem a sociedade amazônica, nem o Brasil são compensados por isso.

Mas na hora que a fumaça sobe no verão, o mundo inteiro quer entregar para os produtores legais, para a sociedade amazônica e para o Brasil a fatura pela "destruição da floresta".

Na década passada, o Brasil colecionou anos seguidos de redução brutal nas taxas de desmatamento. Mostrou para o mundo que era possível produzir com baixo impacto. Mas ao invés do país e os produtores serem premiados, eles receberam uma segunda penalidade. ONGs e governos estrangeiros dobraram a pressão. Alguns propuseram moratórias para produtos brasileiros e outras lançaram uma campanha pelo desmatamento zero.

Imagine o produtor que a vida inteira cumpriu a lei, mantendo muito mais que 80% de área preservada em suas propriedades ficando impedido de ampliar sua área produtiva, prevista na lei mais restritiva da Terra, porque os iluminados de Brasília, Nova York ou Oslo resolveram dobrar a aposta pela "preservação da floresta".

Todo o esforço de trazer novos produtores para um pacto sob um novo modelo de produção ficou sob risco pelo ativismo ambiental sem limites.

Mais devastador que as motosserras é o sectarismo. O verão chegou e com ele virá a gritaria. A Amazônia perderá mais uma oportunidade e tudo voltará ao normal com as próximas chuvas. Pobre Amazônia.

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