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Cartaz com nomes de vítimas do atentado terrorista contra a AMIA, ocorrido no dia 18 de julho de 1994, em Buenos Aires.
Cartaz com nomes de vítimas do atentado terrorista contra a AMIA, ocorrido no dia 18 de julho de 1994, em Buenos Aires.| Foto: Enrique G. Medina/EFE

Às 9 horas e 53 minutos de dezoito de julho de 1994, um carro bomba mandou para os ares a sede da Associação Mutual Israelita de Buenos Aires (AMIA). Sob os escombros foram resgatados 85 corpos e 300 feridos. Passados trinta anos, o estrondo e a coluna de fumaça que pode ser vista de qualquer ponto da capital argentina ainda são presentes na vida de quem perdeu parentes e amigos. Mas também de uma sociedade que, até hoje, não conseguiu cobrar a conta daquele que, até os atentados de 11 de setembro de 2001, foi a maior ação terrorista das Américas.

Há farta documentação que prova que os autores do atentado foram os terroristas libaneses do Hezbollah, sob a coordenação de seus patronos do regime iraniano. 

Como método, vamos dizer assim, nem o Irã e nem os seus “paus-mandados” do Hezbollah assumem os atentados e assassinatos. Eles se regozijam em saber que todos sabem que foram eles, sem que precisem – como fazia o falecido Osama bin Laden, por exemplo, em anúncio formal.

Entre os documentos analisados pelos investigadores, há várias comunicações e manifestações de aliados e membros do grupo dando “indiretas” sobre sua capacidade de levar o terror para onde quer que seja.

A mais simbólica delas, apenas para citar a mais descarada de todas, foi feita em um ato público sete semanas antes do atentado em Buenos Aires. O sheik Hussein Fadlallah (1935-2010), que era reconhecido como o líder espiritual do Hezbollah, anunciou, em um sermão em uma mesquita de Beirute, que “A resistência tem muito oxigênio. O inimigo (Israel) disse que tem tentáculos grandes, mas os combatentes muçulmanos provaram, depois do assassinato de Abbas Mousawi, que suas mãos podiam chegar até a Argentina”.

O que Fadlallah queria dizer? Ao fazer memória a um outro atentado, ocorrido contra a Embaixada de Israel em Buenos Aires, em 1992, ele afirmava que a ação havia sido tomada em retaliação à morte de Abbas Mousawi - o primeiro secretário-geral do Hezbollah - em um bombardeio israelense. A pregação era em relação a outra “baixa” na organização. A prisão de Mustafa Dirani um importante líder militar da organização terrorista.

A Justiça da Argentina apontou uma série de responsáveis, cujos nomes jazem na lista vermelha da Interpol, sem que ninguém faça nada a respeito. O procurador federal Alberto Nisman – que “foi suicidado” em 2015 – liderou a fase crítica da investigação que apontou os nomes das autoridades iranianas envolvidas no atentado.

Algumas delas vagam pelo mundo sem serem importunadas, apesar das ordens de captura internacionais. Por exemplo, em 2011, o então ministro da defesa do Irã, Ahmad Vahidi, desembarcou na Bolívia para acompanhar eventos oficiais que celebravam a parceria militar entre os dois países. 

A notícia deu origem a protestos na Argentina. O governo da Bolívia se desculpou com os vizinhos e pediu para Vahidi voltar para casa. Simplesmente assim. Como país membro da Interpol, a Bolívia deveria ter prendido o procurado internacional. Mas a discussão passou por uma série de caminhos, como a “proteção diplomática” da autoridade iraniana.

O Brasil. Ah, o Brasil... Por aí não foi diferente. Na verdade, foi e é pior.

São fartas as referências ao Brasil nas investigações do atentado.

Os documentos judiciais sobre o atentado contra Amia mostram que havia um importante ramo de ação no Brasil, com pelo menos doze pessoas

Um dos telefones celulares usados, possivelmente para ordem de execução do atentado, era brasileiro e havia sido comprado em Foz do Iguaçu.

O acusado de coordenar as fases logísticas do atentado, o colombiano-libanês Samuel Salman el-Reda, tinha residência fixa em Foz do Iguaçu, no Paraná, onde viveu impunemente por anos depois do atentado. Quando seu nome aparece nas investigações, ele desaparece. Possivelmente escondendo-se no Líbano, sob a proteção do Hezbollah.

Segundo as investigações, o principal operador do atentado na Argentina foi o sheik Mohsen Rabbani, que na época era adido cultural na Embaixada do Irã em Buenos Aires. Em 2011, foi revelado que o irmão dele vivia em Curitiba atuando como um representante clandestino do regime. Fazendo-se de “embaixador de Rabbani”, ele coordenava o recrutamento de jovens brasileiros doutrinados no Irã, e cuidava do financiamento e funcionamento de centro islâmicos no Brasil. A religião é a cobertura que o Irã e o Hezbollah usam para proteger alguns de seus centros de recrutamento, fluxo de dinheiro e operações.

Em 2010, Rabbani esteve no Brasil para visitar o irmão e inspecionar as operações. Ele usava uma identidade falsa venezuelana, de acordo com fontes da Polícia Federal - que na época não puderam prendê-lo para “evitar problemas” diplomáticos com o Irã.

Há ainda farta documentação no processo que indica que o contrabando e comércio popular no Brasil foi usado como fonte de geração de receita local para o financiamento das operações. Isso para evitar que fluxos financeiros clandestinos levantassem suspeitas da preparação dos atentados.

O Brasil se nega a reconhecer o Hezbollah como organização terrorista. No geral, as autoridades se escondem atrás do argumento de que o Brasil segue a lista da ONU. Mas há quem diga: para quê melindrar o Hezbollah e atrair ao Brasil um problema que não é nosso? 

Desde os atos terroristas do Hamas contra Israel, em outubro passado, muita gente na esquerda, sobretudo militantes mais radicais, perderam a vergonha e passaram a exibir suas camisetas e bandeiras. Além de fazer discursos não só em favor dos terroristas palestinos, mas também do Hezbollah.

Passados 30 anos do atentado da Amia, o Brasil não só ignora o seu papel como base logística e financeira do terrorismo, como passa a tolerar ser um celeiro de propaganda e apologia de organizações terroristas. Sob o argumento de “resistência”, recorrem à mais covarde das formas de violência política: o terror.

Não deveria ser muito difícil repudiar o terrorismo como método de ação. Isso foi muito claro nos anos de 1980, quando os próprios terroristas se deram conta de que o terrorismo não é uma tática palatável.

Mas perdemos algo pelo caminho e o terrorismo está sendo justificado e, mais do que isso, banalizado.

Conteúdo editado por:Aline Menezes
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