| Foto: Tibor Janosi Mozes/Pixabay
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No Brasil existe um vício de origem na maioria das pessoas que estão atordoadas, desiludidas ou até mesmo destroçadas com a vitória de Donald Trump. Em geral, elas votam em candidatos como Guilherme Boulos, Luiz Inácio Lula da Silva ou em suas versões espalhadas pelo país com a convicção de que estão escolhendo o que há de melhor no cardápio político do Universo. Para esse pessoal, não há muito o que fazer.

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Meu conselho é deixar que eles falem... falem... falem... Colocar para fora os sentimentos pode ajudá-los. Mas não fique muito por perto, invente um compromisso, uma chamada telefônica e dê no pé. O risco de contaminação do ânimo é elevado. 

Entre os que estão no limite de uma crise depressiva, provocada pela vitória do republicano de pele laranja e topete, está um tipo mais comedido que jura que faz o que faz pela defesa da democracia. É gente que não rosna e nem produz espuma no canto da boca ao tratar do resultado das eleições americanas. Sem nenhum tipo de indulgência, vítimas colaterais de uma leitura enviesada do mundo.

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O pecado original. No Brasil, as pessoas imaginam as eleições e a realidade dos Estados Unidos a partir da própria experiência de brasileiro, de telespectador da Globo News e, em alguns casos, com a experiência de campo na Disney, São Francisco ou Nova York. Pois bem, os Estados Unidos não são isso e os americanos muito menos.

Sentados em suas poltronas na Vila Madalena, em São Paulo, ou no Leblon, no Rio de Janeiro (apenas para citar de forma intencionalmente caricata duas praças brasileiras), esses brasileiros não têm como não se assombrar com a ascensão do fascismo na América. 

As notícias que chegam para eles em inglês ou transformadas em versões pela imprensa brasileira – que finge produzir conteúdo, mas apenas reescreve o que foi dito pela imprensa internacional – desenham um quadro aterrador, mas viciado. É uma visão dos Estados Unidos a partir das bolhas democratas de Washington, D.C. e Nova York.

É algo que não se explica pela surrada acusação de manipulação. A turma foi moldada com crença naquilo. Eles se sentem ungidos e defensores do que acreditam ser melhor. Do outro lado da fronteira que separa a “civilização”, quase exclusiva dos democratas (no caso brasileiros dos petistas), está a ignorância, a barbárie, o nazismo travestido dos republicanos (no caso brasileiro é a tal extrema-direita).

Com esse elemento quase religioso, eles contam a história que muita gente pensa que é a verdadeira.

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Assim, muita gente pensa que o mundo está novamente prestes a acabar. Exatamente como foi em 2016, quando Donald Trump venceu pela primeira vez

Se você estiver a fim de manter uma conversa saudável com eles, aqui vão algumas dicas. A primeira delas é muito simples. Será mesmo que nós, no Brasil, sabemos mais o que está acontecendo nos Estados Unidos que os próprios americanos? Por que tendemos a pensar que cerca de 72 milhões de pessoas, que representam mais da metade do eleitorado, são formadas por um bando de imbecis, fascistas e idiotas? Não é pretensão demais. Pergunte isso ao seu interlocutor.

Além disso, dê um passo além. Por que será que Trump cresceu em quase todos os condados dos Estados Unidos, quando comparado com 2020? Por que será que a sensacional Harris foi punida e o malvadão premiado?

Em cada pedacinho dos Estados Unidos, o eleitor tem a sua experiência individual, comunitária e regional. A combinação disso dá a ele um sentimento que não vai ser o que o New York Times, a CNN ou o Washington Post vão contar e os jornalistas brasileiros sempre papagaiar.

A experiência real vem combinada com os efeitos da inflação na vida das pessoas, os salários depreciados, os empregos – que embora em boom – quase sempre de baixa remuneração, o sentimento de injustiça que tomou conta de uma classe média (inclusive baixa) que se vê obrigada a pagar por tudo e todos e com cada vez menos retorno do Estado. 

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Pagar por tudo significa impostos cada vez mais pesados no orçamento familiar. Pagar por todos significa ver bilhões de dólares torrados em populismo paternalista para atenção – e até mesmo atração – de imigrantes ilegais.

Se alguém disser que o mundo vai acabar, que o Trump vai entregar a Europa para Putin e que a fome e a miséria tomarão conta do mundo, vale relembrar que: 1) Esses mesmos alertas foram feitos em 2016. O mundo não acabou. O mundo não ficou mais instável ou revolto. 2) Trump e Putin nutrem um caso de amor? Infelizmente sim. Isso é potencialmente perigoso, mas também pode ser produtivo.

Trump tem o potencial de ser a ponte para colocar um fim na guerra de agressão contra a Ucrânia. Espero que ela faça isso, garantindo a integridade do território ucraniano e criando barreiras de contenção às investidas russas. 3) Tirando a trapalhada de Trump e seus seguidores que ficaram choramingando com a derrota de 2020 e depois descambaram para a baderna da invasão do Capitólio, a administração anterior não tem nada que possa ser comparado com destruição da democracia, fascismo ou o que seja.

Na verdade, nem a quebradeira daquele 6 de janeiro de 2020 pode ter esse nome. Virou instrumento de propaganda para justificar os alertas fatalistas de 2016.

Por fim, pergunte ao seu amigo assombrado quem é o presidente do Brasil. O dólar chegou a bater em 6 reais. A culpa é da eleição do Trump ou do pessoal em Brasília que torra o orçamento como se os recursos fossem infinitos? Há mais de uma década, o PIB brasileiro é mais rastejante que barriga de cobra e a culpa é do Trump?

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Um bônus: apesar de Trump não ser culpado pelos erros dos inquilinos do Planalto, muito provavelmente ele terá um efeito positivo sobre seus possíveis acertos. Depois do massacre nas eleições municipais no Brasil e do furacão Trump que varreu os democratas, Lula e sua turma terão que mudar de rota. Como eles só pensam em 2026, terão que mudar a rota urgentemente. E isso pode ser bom para o Brasil. Avise para seu amigo que ele ainda vai agradecer à vitória de Trump.