Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o presidente do Ibama, Rodrigo Antônio de Agostinho Mendonça.| Foto: Lula Marques/Agência Brasil
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Em algum momento do futuro próximo, o Brasil terá que encarar a necessidade de revisar os superpoderes atribuídos aos órgãos ambientais, a começar pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A eles, não deveria ser concedido o poder de veto absoluto sobre projetos e empreendimentos produtivos, como determina a rigorosíssima legislação ambiental nacional.

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A rigor, o seu papel deveria limitar-se a prognosticar os impactos socioambientais, exigir dos empreendedores, públicos e privados, medidas mitigadoras e compensatórias adequadas, além de acompanhar e cobrar a sua implementação, se preciso, judicialmente. 

As exceções à regra, nas quais se considerassem que os impactos negativos poderiam superar os benefícios socioeconômicos dos empreendimentos (casos que a experiência tem demonstrado serem raríssimos), poderiam ser julgadas por um colegiado interministerial específico, apto a avaliar a situação com um olhar mais equilibrado que o de tecnocratas que, não raro, colocam o zelo ideológico e o apreço por uma visão idílica do meio ambiente diante das evidências científicas e técnicas, do mero senso comum e do interesse público.

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Um dos incontáveis exemplos desse fundamentalismo ideológico disfarçado de “proteção” do meio ambiente ocorre em Mato Grosso, onde o Ibama está exigindo a realização de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima) para a dragagem do rio Paraguai, reduzido ao seu nível mais baixo pela seca extremada dos últimos anos.

Com isso, o transporte pelo rio em comboios de barcaças, de vital importância para a indústria de mineração do estado, está seriamente comprometido. Uma solução emergencial é o aprofundamento dos canais de navegação por meio da remoção parcial dos sedimentos do leito do rio em quatro trechos específicos entre Corumbá e Ladário, com a sua deposição em outros locais – ou seja, não se trata de uma dragagem padrão, na qual os sedimentos são totalmente removidos do rio.

Curiosamente, no final de julho, quando visitou Corumbá como integrante de uma delegação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o próprio presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, afirmou que não haveria obstáculos à operação. Porém, no início de setembro, o órgão retrocedeu e passou a exigir a realização de um EIA-Rima, que pode levar até dois anos para ser concluído.

Segundo a superintendente estadual do Ibama, Joanice Battilani, a equipe técnica do órgão entendeu que, apesar de tratar-se de uma hidrovia existente há séculos, haveria a necessidade de estudos ambientais mais aprofundados, pelo que até mesmo o presidente do órgão teve que submeter-se à decisão dos técnicos.

“A não ser que venham ordens superiores, da alta cúpula, envolvendo outros ministérios, o que está valendo agora é a decisão da Coordenação de Recursos Hídricos do Ibama, lá de Brasília. O DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) terá de fazer estes estudos amplos e isso não deve sair em menos dois anos”, disse ela ao Correio do Estado (09/09/2024). 

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Em resposta, um indignado deputado estadual Paulo Duarte (PSB), ex-prefeito de Corumbá, fulminou: 

“Alguns técnicos absolutamente radicais, que nunca vieram ao Pantanal e que estão no ar condicionado em Brasília estão impedindo este trabalho. Eu sou pantaneiro e sei que minha cidade depende da preservação do Pantanal. Não sou inconsequente de defender algo que possa prejudicar o bioma.

“Vamos apelar à Justiça. A mineração gera três mil empregos diretos aqui. É o segundo maior empregador de Corumbá, ficando atrás apenas da prefeitura. Se a gente não fizer essas intervenções no leito do rio a empresa mineradora (J&F) vai embora e toda essa gente vai perder o sustento. Seria uma tragédia para essa região”, enfatiza o parlamentar.

“A gente não pode abrir mão disso. No mundo inteiro são feitas intervenções de manutenção nas hidrovias, que são o meio mais barato e ecologicamente mais correto de transporte. Aqueles burocratas de Brasília precisam entender isso Correio do Estado (19/10/2024).”

De acordo com Duarte, somente com a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), Corumbá terá uma arrecadação anual de R$120 milhões, cerca de 12% do orçamento do município. Agregando-se outros impostos diretos e indiretos, o setor tem potencial para gerar R$810 milhões anuais em tributos aos cofres federais, estaduais e municipais, assegura ele, que também já foi secretário estadual da Fazenda e é auditor fiscal aposentado. 

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A alternativa ao transporte hidroviário para o escoamento do minério é a rodovia, mas o próprio Duarte observa a contradição dos burocratas “verdes”: “Se o Ibama lá de Brasília estivesse pensando na preservação, ele teria liberado essa intervenção, porque, na rodovia, centenas de animais morrem atropelados nessa região. É um cemitério, além do perigo para os outros motoristas. O transporte rodoviário é muito mais poluente do que o hidroviário, que agride menos o meio ambiente. Sem contar no perigo do ponto de vista das pessoas que trafegam na rodovia (Correio do Estado, 09/09/2024).”

Como se percebe, um caso típico de “dragagem cerebral” de militantes ideológicos encastelados no aparelho do Estado

Todavia, no imbróglio, não poderia faltar o dedo das ONGs ambientalistas e o apoio de uma coorte de cientistas-militantes. De acordo com a superintendente Battilani, a decisão do Ibama foi influenciada por uma carta aberta assinada por 37 pesquisadores do Brasil, EUA, França e Inglaterra, divulgada no final de agosto.

Na carta, os signatários consideram “extremamente temerário que haja operações de dragagem, mesmo que somente de manutenção, num ano de escassez hídrica excepcional, sem se ter possibilidade de previsão de como será o comportamento da próxima cheia no ano hidrológico de 2024-25”.

O documento é encabeçado pelo presidente da ONG Ecotrópica (Cuiabá-MT), Adalberto Eberhard, provável articulador da iniciativa. Eberhard é um veterano operativo do aparato ambientalista-indigenista internacional que opera no Brasil. Fundada e dirigida por ele desde 1989, a Ecotrópica tem vínculos com as ONGs The Nature Conservancy, Conservation International e WWF-Brasil, e tem recebido financiamentos da W. Alton Jones Foundation, Fundación Avina e Fundação O Boticário de Proteção à Natureza.

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Ou seja, mais uma vez, “ambientalistas de ar condicionado” que trabalham a milhares de quilômetros de distância, e com escasso conhecimento da realidade local, tomam decisões de cunho estritamente ideológico com potencial para provocar enormes prejuízos às comunidades diretamente afetadas. Outra vez, os superpoderes atribuídos ao Ibama atuando como obstáculos às atividades produtivas.

Até quando?