Entre os seus grandes triunfos na campanha contra o desenvolvimento do Brasil, o aparato ambientalista-indigenista internacional pode alinhar a chamada Moratória da Soja.
A Moratória é um acordo internacional estabelecido em 2006 entre grandes tradings e empresas envolvidas no comércio de grãos, bancos e ONGs representadas pelo Greenpeace, WWF-Brasil e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), para evitar a comercialização de grãos oriundos de áreas do bioma Amazônia desmatadas após 2008.
Pelos produtores, assinaram a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e a Associação Brasileira dos Exportadores de Cereais (ANEC). O monitoramento é feito por plataformas que empregam imagens de satélite e abrange propriedades com mais de 25 hectares.
Inicialmente estabelecido por um prazo de dois anos, o acordo passou a ser renovado anualmente, mas, em 2016, foi renovado indefinidamente, sem prazo estabelecido.
A Moratória foi estabelecida após uma virulenta campanha do aparato “verde-indígena”, na qual o Greenpeace desempenhou um papel-chave com a divulgação do relatório Eating up the Amazon (Devorando a Amazônia), afirmando que a expansão do cultivo da soja era um dos principais fatores causadores do desmatamento no bioma Amazônia.
Com um método que lembra o dos gângsteres de Chicago nas décadas de 1920-30, os ambientalistas lançaram a denúncia
Assim, com o apoio de cartéis e bancos, passaram a oferecer a devida “proteção”, que foi aceita pelos produtores receosos de mais problemas, com o apoio do então governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, um dos maiores sojicultores do país.
Um problema é que a Moratória tem sido aplicada à revelia do Código Florestal de 2012, o qual permite o desmatamento de até 20% das propriedades privadas situadas no bioma Amazônia. Segundo a Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja), apenas no Mato Grosso, a aplicação da Moratória estaria acarretando prejuízos anuais de R$ 32 bilhões.
Em boa hora, o setor produtivo resolveu reagir. Em junho, a Assembleia Legislativa de Rondônia aprovou uma lei proibindo a concessão de quaisquer tipos de benefícios, inclusive fiscais, a empresas participantes de acordos internacionais restritivos, como a Moratória da Soja. O governador do estado, Marcos Rocha, sancionou a lei em julho.
Em setembro, a pedido da Aprosoja e com a aprovação da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) instaurou um inquérito administrativo para apurar uma possível manipulação do mercado vinculada à Moratória.
Em 9 de outubro, uma lei semelhante foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Mato Grosso e agora será submetida ao governador Mauro Mendes, que já se manifestou publicamente contra a moratória. Iniciativas semelhantes estão sendo articuladas no Pará e no Tocantins. Parlamentares do Amazonas, Roraima e Maranhão já se mobilizam em torno do assunto.
Sem surpresa, a Abiove (que representa as tradings Cargill, Bunge, ADM, AMaggi e Cofco) e a ANEC se manifestaram, afirmando que o ataque à Moratória será prejudicial à imagem do Brasil no exterior e poderá afetar as vendas do agronegócio.
O presidente-executivo da Abiove, André Nassar, diz que a aprovação da lei no Mato Grosso poderá levar a uma migração de empresas para outros estados: “Em Mato Grosso o impacto pode ser muito grande. É o Estado com maior capacidade de processamento de soja, com muitos investimentos das nossas empresas lá, e também empresas de biodiesel. Perder o incentivo fiscal pode colocar em risco a operação das empresas (Estadão, 11/10/2024).”
Seu colega da ANEC, o diretor-geral Sérgio Mendes, faz coro: “Nestes 18 anos de vida, [a Moratória] aparece como o único programa em curso que se revelou capaz de evitar o desflorestamento, segundo estudo conduzido por grupo mundial de cientistas avalizado por Oxford [sic]. Essa é uma conquista do Brasil, onde o produtor brasileiro teve papel preponderante na sua efetivação porque revelou-se capaz de cumprir regras internacionais de preservação. Opor-se a esses 18 anos de luta nos parece um risco enorme, capaz de comprometer a imagem do país, de grande provedor de alimento para o mundo que, em última análise, é nossa verdadeira vocação [sic].”
Por sua vez, o ex-governador Blairo Maggi, hoje presidente do conselho da Abiove, entende que a Moratória já não se justifica: “É um acordo que existe, comercial. É um pedido, e até uma obrigação que os bancos fazem sobre as empresas que tomam dinheiro no sistema financeiro e exportam essa mercadoria para o exterior... Lá atrás, foi feita essa moratória da soja, um acordo privado para segurar um pouco o desmatamento. Depois, veio o Código Florestal. Eu não vejo, hoje, mais necessidade de termos esse protocolo. Mas... não é uma vontade nossa, é uma exigência do mercado (Olhar Direto, 09/09/2024).”
O diretor técnico da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Bruno Lucchi, reforça: “O objetivo dela era ter segurança de que a produção em área desmatada não seria comercializada ou exportada. Na época se justificava um controle como este, pois ainda não tinha o CAR (cadastro ambiental rural) e o atual Código Florestal, que foi estabelecido em 2012... A moratória vai além da lei e engessa toda a propriedade. No bioma amazônico o produtor pode abrir 20% da área e preservar 80%. Pelo código, o produtor que só abriu dez, pode abrir mais dez, mas pela moratória ele fica impedido de comercializar a produção, o que vai além da lei.”
Em boa medida, a oportuna contestação dos produtores brasileiros à agenda da aliança entre os cartéis de grãos, o sistema financeiro e as ONGs, encontra um paralelo na luta dos produtores europeus contra o “Pacto Verde” (Green Deal) da União Europeia, voltado para restringir a produção agropecuária no bloco, nos termos da Agenda 2030 de “combate às mudanças climáticas” – na prática, uma agenda de redução de alimentos e, em última análise, de população.
Ou seja, os produtores brasileiros (e sul-americanos) e europeus têm muito mais em comum do que poderiam pensar os que se limitam a ver a questão como uma mera disputa entre protecionismo e livre comércio.
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