Como é bom poder falar mal do presidente.
Eu conheço gente, que desde o impeachment de Dilma Rousseff, não faz outra coisa na vida. São pessoas que acordam e dormem ruminando vinganças, mágoas e ressentimentos, e não passa um dia sem que elas exerçam nas redes sociais o seu direito de perseguir e odiar, ao mesmo tempo em que dizem que o amor vai vencer. Elas falam e escrevem o que querem, sem qualquer censura. E é assim que tem que ser.
Nestes dias mesmo um jornalista, ex-colunista da “Folha de S.Paulo”, autor da Companhia das Letras, auto-exilado em Paris, em suma, um intelectual defensor da democracia, postou um vídeo declarando o seguinte:
“Eu ia ficar feliz com o dia em que a gente matasse Bolsonaro, seus quatro filhos e sua esposa. (...) Com tanto tiro, ele viraria só caldo. Matar Bolsonaro seria o único caminho da minha felicidade. (...) Botar vocês tudo amarrado na corrente, botar querosene e tacar fogo, enquanto eu pego um pote de Nutella (...) e assisto vocês queimarem.”
Se isso não é discurso de ódio, não sei o que seria. Mas o fato é que mesmo pessoas assim, que afirmam lutar pela democracia pregando o extermínio físico do outro, são livres para falar o que quiserem. Isto se chama liberdade de expressão.
Já pessoas que, com base em acontecimentos amplamente divulgados e em decisões da própria Justiça, dizem que determinado candidato é *****, **********, ********, *********, ou que determinado candidato já declarou que ********** ***** **** **** **** *** ******, ou que ele é responsável pelo *** ******* ** ****** que já se viu na História deste país, estão sujeitas à perseguição judicial, a ter contas banidas ou desmonetizadas, a responder a inquéritos, a ter sua casa invadida por policiais em operações de busca em apreensão. E olha que esse candidato ainda nem foi eleito.
Isto se chama censura.
O ódio do bem é um vício pior que crack
Esse vício de odiar qualquer presidente que não seja aquele que eu escolhi começou, vale lembrar, com o “Primeiramente, fora Temer!”. O vice de Dilma passou cada dia de seu breve mandato sendo achincalhado pela turma que se arvora detentora do monopólio da virtude e defensora da democracia – uma forma peculiar de democracia, diga-se de passagem, que ignora a alternância de poder e nega o direito do outro à existência.
(Lembrando que quem votou na Dilma também escolheu Temer, da mesma forma que quem votar em Lula também votará no Chuchu. Mas anotem: amanhã, caso Lula seja eleito e por algum motivo não termine o mandato, seguramente estes mesmos eleitores terão um surto de amnésia coletiva e começarão a gritar “Fora Alckmin!”)
Temer foi chamado todos os dias de golpista, usurpador, mordomo de filme de terror. Foi atacado por ser branco, foi atacado por ser velho. Foi atacado por falar bem o português. Foi chamado de corrupto, de ladrão, de satanista. A primeira-dama foi atacada por ser bela, recatada e do lar (porque, subentende-se, bom mesmo é ser feia, surtada e do bar). Professores de escolas públicas e privadas começavam suas aulas dizendo "Primeiramente, fora Temer".
Pois bem, nunca houve sequer a insinuação de qualquer movimento de Temer no sentido de coibir esses ataques, mesmo os mais covardes, criminosos e sem fundamento. Em momento algum, no Governo Temer, se cogitou ferir ou relativizar a liberdade de expressão para reprimir os excessos e a verborragia de quem não se conformava em ter deixado o poder. E é assim que tem que ser.
Hoje, a 10 dias do segundo turno, a percepção generalizada é a de que estão querendo eleger um candidato na marra. Isso não é bom para a democracia
Veio a eleição de Bolsonaro. O inconformismo só piorou. Desde o dia da posse, não passou um dia sem que o presidente fosse chamado de nazista, fascista, “coiso”. Com a tragédia da pandemia, passaram a chamá-lo de genocida, inclusive professores em sala de aula. Genocida! Assim, tipo Hitler, Mao e Stalin. É uma acusação meio pesada, mas nunca ninguém foi censurado por isso. Pelo contrário, pega até bem chamar o presidente de genocida: traz o reconhecimento dos pares e likes nas redes sociais.
Um respeitado colunista da “Folha de S.Paulo” escreveu um artigo com o título “Por que torço para que Bolsonaro morra”.
Outro defendeu, sem qualquer cerimônia, um golpe militar para derrubar o presidente (porque golpe militar de esquerda pode).
Nenhum dos dois foi censurado. Um e outro, aliás, escreveram esses artigos sabendo que não seriam censurados, que não corriam risco algum. Ao contrário: seriam e foram até elogiados pelos intelectuais e artistas que vivem na ditadura imaginária que persegue minorias e odeia e mata os pobres. Nunca foi tão fácil ser herói da resistência. (Se vivessem mesmo em uma ditadura, tais artigos sequer seriam publicados, mas isto é apenas um detalhe.)
A vontade do eleitor está sendo **********
Eis que começa a campanha eleitoral, e o monstro da censura volta a mostrar seus dentes no Brasil. E a censura parte, vejam só, não do governo fascista, mas do lado de quem supostamente defende a democracia, do lado do candidato que foi ***** após *** ********* em três instâncias e ************ com uma canetada; do lado do candidato que, por decisão do ***, o órgão em tese responsável pela isonomia e transparência da eleição, não pode ser chamado de **-***********, nem de ******, nem de ********, nem de *******.
Também não se pode falar que esse candidato defende o ******, que gosta de *******, que é amigo de ***********, que apoia a ********* ** ******. Não se pode tampouco citar o áudio do traficante ******* declarando seu voto. Não se pode nem repetir coisas que o próprio ********* já disse no passado, nem o que disseram sobre ele seus atuais aliados.
Também está proibido dizer que esse candidato apoia ditaduras, como a da *********, **** e *********. Um ex-ministro do STF, Marco Aurélio Mello, teve uma fala censurada no Horário Eleitoral desta semana simplesmente porque ele explicava que **** não foi inocentado: suas condenações foram anuladas, o que é muito diferente. Quando um ex-ministro do Supremo é censurado por dizer a verdade, alguma coisa vai mal.
E esse festival de censura a céu aberto acontece, vejam vocês, com o apoio entusiasmado da grande mídia, a mesma que amanhã sofrerá as consequências desta estranha escolha.
Porque hoje, no Brasil, da mesma forma que temos uma Escola com Partido, parece que temos também Institutos de Pesquisa com Partido, que podem ter tentado manipular de forma criminosa o comportamento do eleitor no primeiro turno; uma Mídia com Partido, que abriu mão de fazer jornalismo para fazer campanha; e até uma Justiça com Partido, o que é uma contradição em termos, algo que não cabe em uma democracia.
Jornalistas em êxtase quase sexual defendendo a censura, vivi para ver isso.
Do outro lado, mentiras, fake news e ataques imundos ao presidente (que não poupam nem sua filha de 12 anos) são feitos diariamente, em escala industrial, sem qualquer reação da Justiça Eleitoral. Mas esta se apressou a proibir o candidato à reeleição de
- usar imagens das manifestações do Sete de Setembro na campanha;
- usar imagens da primeira-dama;
- usar imagens do discurso na ONU;
- fazer lives nos Palácios do Planalto e da Alvorada.
Etc. Isso sem falar na desmonetização de canais de direita (porque ser de direita é um crime), na perseguição a empresários por conversas privadas em grupos de WhatsApp, na criminalização da opinião.
A Jovem Pan, o Brasil Paralelo, esta própria Gazeta do Povo já tiveram um aperitivo do que será um governo com controle da mídia e sem liberdade de expressão. Um governo no qual, em suma, será proibido falar mal do presidente.
É em um país assim que você quer viver, eleitor que se omite por nojinho da falta de decoro de Bolsonaro? Tem certeza? Eu, pessoalmente, prefiro viver em um país no qual as pessoas tenham liberdade para chamar o presidente de genocida e até para desejar sua morte a viver em um país no qual as pessoas são presas por chamarem o presidente de ******.
E vou parar por aqui, porque ***** ********** ****, ********** *** ** **** ******* ** *** ** **** *******. ** *** ** **** ******* ********** ****, ********** ********** ****, ********** ********** ****, **********. É sobre isso.
Já vivemos em uma ditadura?
Encerro reproduzindo dois posts no Twitter que ainda não foram censurados (por enquanto):
“Qual é a legitimidade de um processo eleitoral em que um lado é amordaçado, e o outro tem liberdade de expressão absoluta?” (Leandro Ruschel)
“O atual processo eleitoral já é tipicamente bolivariano, no qual o tribunal eleitoral tem lado e está comprometido a fazer de tudo - tudo mesmo! - para levar o seu candidato à vitória.” (Flavio Gordon)
Ambos chamam a atenção para um aspecto inédito e gravíssimo do atual processo eleitoral, que também apontei no artigo “Uma eleição contaminada”.
Uma eleição na qual aqueles atores que deveriam zelar pela neutralidade e transparência do processo agem como militantes partidários e cabos eleitorais – e censores – está irremediavelmente comprometida e contaminada, independentemente do resultado. E hoje, a 10 dias do segundo turno, a percepção generalizada é a de que querem eleger um candidato na marra. Isso não é bom para a democracia.
Ainda mais em uma eleição altamente polarizada, não pode haver dúvida sobre a neutralidade de quem conduz e é fiador do processo, de quem tem o poder de influenciar, de calar e até de prender. Até porque, em qualquer eleição, o consentimento do lado derrotado se baseia na premissa de um processo eleitoral conduzido de forma justa, honesta e imparcial. Quando a percepção dessa premissa se desfaz, o consentimento também pode se desfazer. Nada de bom pode vir daí.
Por tudo isso, a depender de quem vença a eleição, acho que estão contratando uma grave crise – tudo de que o Brasil não precisava, agora que a economia volta a crescer. Espero estar enganado.
P.S. Se alguns trechos deste artigo apareceram com tarjas pretas ou asteriscos, é porque, de certa forma, já vivemos em uma ditadura. Uma sociedade na qual os jornalistas têm que pensar duas vezes e medir as palavras antes de escrever a verdade, uma sociedade na qual empresas de comunicação são obrigadas a proibir seus analistas de usar determinadas palavras, uma sociedade na qual as pessoas se policiam por medo de dar a opinião “errada” e na qual a liberdade de expressão só existe para um lado, uma sociedade assim já deixou de ser uma democracia, em um sentido muito profundo.
Ao arrepio da Constituição, já se controla, pelo constrangimento, o que pode ser pensado, dito, divulgado e publicado, mesmo que seja verdade. Nada impede que amanhã esse controle se dê por meio da força bruta.
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