“O economista de rua – 15 lições de economia para sobreviver a políticos e demagogos” é o título do novo livro do chileno Axel Kaiser – também autor de “A tirania da igualdade” e “O embuste populista”, este em parceria com a guatemalteca Gloria Alvarez.
Deveria ser leitura obrigatória em todas as escolas de ensino médio e universidades. Em pouco mais de 100 páginas e com um estilo cristalino, o autor se empenha em combater a incompreensão e o analfabetismo generalizados em assuntos econômicos.
Esse analfabetismo está disseminado, especialmente, entre aqueles que dizem defender a distribuição da riqueza (desde que não mexam no bolso deles, é claro), sem ter a menor ideia de como se cria a riqueza que eles afirmam querer distribuir.
Ou entre aqueles que afirmam com orgulho que “milhões foram tirados da pobreza”, talvez sem se darem conta de que essa frase admite uma dupla interpretação.
Ou, ainda, entre artistas e intelectuais que, nas palavras de Kaiser, “sonham em mudar o mundo a partir de meras emoções e impulsos, muitas vezes dando crédito a movimentos políticos devastadores”.
A todas essas pessoas – algumas, talvez, ocupando cargos com poder de decisão sobre o futuro do país – faria muito bem revisitar, tendo Kaiser como guia, alguns conceitos e princípios básicos da ciência econômica.
Mas a leitura de “O economista de rua” faria bem, sobretudo, ao cidadão comum desavisado: se todas as pessoas refletissem minimamente sobre a escassez de recursos, a inflação, os custos de oportunidade ou a relação entre o Estado e o mercado, elas não se deixariam contaminar por patologias políticas que inevitavelmente as prejudicarão no futuro.
Em um país onde cidadãos entendessem o básico de economia, ideologias liberticidas sequer teriam a chance de prosperar. E quem conhece princípios econômicos simples, afirma Axel, entende mais de economia do que boa parte da classe política e intelectual – que se comporta como se o Estado dispusesse de uma maneira mágica de obter recursos para satisfazer desejos e necessidades ilimitados.
Boa parte da nossa classe política e intelectual se comporta como se o Estado dispusesse de uma maneira mágica de obter recursos para satisfazer desejos e necessidades ilimitados
Seguem alguns trechos do livro "O economista de rua", seguidos por breves comentários meus:
“Os bons economistas de rua devem ter claro que é preciso sempre trabalhar; e não em qualquer coisa, mas em trabalhos produtivos. (...) um trabalho que crie ou sirva para criar bens ou serviços que outros demandem. (...) Se uma pessoa se dedica a contar as nuvens no céu, ela não tem o direito de exigir ser remunerada por isso, porque ninguém demanda que ela o faça. Se, em vez disso, ela se dedicasse a fazer música que outros pagassem para ouvir, (...) então ela obteria uma renda, que lhe permitira viver de seu esforço ou trabalho.”
Pois é. Por exemplo, o que mais tem no Brasil são pessoas que se acham grandes intelectuais ou artistas e que julgam ter o direito de receber pelo que produzem, mesmo que ninguém esteja interessado nas suas criações.
É preciso ensinar aos jovens que trabalho é, fundamentalmente, aquilo que paga as nossas contas. Eu posso escrever poemas inspiradíssimos ou pintar quadros de grande beleza, mas, se não houver quem pague por eles, isso não será um trabalho, porque eu não vou receber em troca deles os recursos de que preciso para viver.
Por óbvio, poesia e pintura são fundamentais, e não vai aqui nenhum julgamento moral sobre esse fenômeno. E é claro que todos devem procurar trabalhar naquilo que gostam. Mas se ninguém está interessado no que elas fazem, não é trabalho: é apenas um hobby, como contar nuvens. É preciso entender como as coisas funcionam na economia real.
De maneira análoga, lacração não é trabalho – a não ser que haja alguém interessado em pagar para que você fique lacrando o dia inteiro nas redes sociais. Pensando bem, talvez haja quem pague, e neste lacração pode ser trabalho sim. O que explicaria muita coisa.
É claro que é desejável alguma ação redistributiva do Estado. Mas isso não muda o fato de que essa ação se dá pelo confisco coercitivo de parte daquilo que as pessoas que trabalham produzem
“Um economista de rua entende que nossa própria existência implica um esforço produtivo, pois sem ele não poderíamos nem comer. Mas é fundamental deixar claro que existem basicamente duas maneiras de obter os recursos de que precisamos. A primeira depende do próprio esforço, e a segunda do esforço de outra pessoa. Ou nos financiamos com nosso trabalho ou o fazemos à custa do trabalho dos outros, como acontece com as crianças, que vivem sob os cuidados de seus pais justamente porque não podem se sustentar”.
Pois é. Mas existem adultos plenamente capazes que também vivem – ou pretendem viver – à custa do esforço alheio. Com certeza o leitor conhece pessoas assim. Para elas, só existem duas opções: apelar à caridade e à boa vontade dos outros; ou esperar que esses recursos sejam confiscados à força de terceiros e transferidos para elas.
Segundo Kaiser, esse confisco coercitivo pode assumir a forma de um roubo direto ou de uma “expropriação de bens por meio de um grupo organizado que a executa, como o Estado (por meio dos impostos)”. Mais uma vez: o autor não entra na discussão ética desse processo, ele apenas constata um fato econômico irrefutável.
É claro que é desejável alguma ação redistributiva do Estado. Mas isso não muda o fato de que essa ação se dá pelo confisco coercitivo de parte daquilo que pessoas que trabalham produzem. Quando esse confisco é excessivo, diminuem os incentivos à produção e ao trabalho, e a sociedade inteira empobrece. Simples assim.
“Afirma-se, muitas vezes, que o Estado deve prover gratuitamente saúde, educação, moradia e muitos dos chamados direitos sociais. Embora simpatize com essa posição, um bom economista de rua percebe imediatamente a falácia econômica nela contida: o Estado não é um Deus que pode fornecer recursos criando-os do nada”.
Pois é. A sociedade pode até achar justo que o Estado garanta saúde, educação e moradia gratuitos para quem não trabalha, mas é preciso ter sempre em mente que alguém vai ter que trabalhar para viabilizar os recursos necessários para isso.
Ora, uma vez que o Estado não produz nada, esses recursos terão que ser tirados de quem trabalha (mais uma vez, por meio de impostos) e transferidos para aqueles que irão receber os serviços gratuitos. Diga-se de passagem, em muitos casos podendo pagar por eles: não faltam estudantes de classe média alta nas universidades públicas, ou mesmo ganhando bolsa para estudar na Europa (mas eles se veem como justiceiros sociais, vai entender...).
Pode haver bons motivos para o Estado garantir, por exemplo, educação gratuita para aqueles que não podem pagar por ela. Mas isso não muda o fato de que a educação é – também – um bem ou serviço econômico, isto é, custa dinheiro e utiliza recursos – em instalações, salários dos professores e funcionários, equipamentos, livros etc – que terão que ser pagos por alguém, já que não existem recursos grátis.
Voltarei ao tema.
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