Mesmo estando longe de concordar com todas as suas teses, um dos raros canais que acompanho no YouTube é o do conferencista argentino Agustín Laje. Coautor de O livro negro da nova esquerda: Ideologia de gênero ou subversão cultural e autor de La batalla cultural: Reflexiones críticas para uma nueva derecha (este ainda não traduzido no Brasil), ele é fundador e presidente da Fundación Libre, um think tank de ideologia conservadora.
Por suas críticas à agenda progressista, sobretudo quando esta agenda envolve a infância e a ideologia de gênero, Laje se envolve periodicamente em duras controvérsias – e sofre as consequências e acusações de sempre. Seu crime é fazer declarações politicamente incorretas que são percebidas como ofensivas e discriminatórias, como: “Homofobia é uma construção idiomática de caráter pejorativo para desacreditar todo aquele que opina que um homem vestido de mulher não é uma mulher”.
Naturalmente, a reação dos ofendidos não é debater nem argumentar, mas tentar silenciar na base da censura moral, carimbando na testa de Agustín Laje o rótulo de “extrema-direita”. O carimbo funciona mais ou menos como uma senha, um recado para as milícias do bem: eis aqui mais um alvo a ser perseguido, cancelado, esfolado e abatido, nas redes sociais e fora delas.
Nenhuma novidade até aqui: esse truque está tão manjado que já está pegando mal mesmo entre alguns progressistas, para quem começa a cair a ficha de que fizeram papel de bobos ao acreditar que o amor venceu, ou que democracia se defende com censura e outras práticas comuns às piores ditaduras.
Pois bem, contra a narrativa hegemônica ora em curso – que une de forma inédita bilionários e a extrema-esquerda, o Judiciário e a grande mídia – Agustín Laje acaba de lançar um novo livro: Generación idiota: Uma crítica al adolescentrismo.
O autor não se refere a uma geração específica, mas a um comportamento adolescente, hoje comum a jovens, adultos e até mesmo idosos. Porque as fronteiras, outrora claras, entre adolescentes e pessoas maduras – Nelson Rodrigues dizia que os jovens só devem ser levados a sério quando ficam velhos – se dissiparam completamente, em meio à névoa onipresente da lacração. A idiotice se democratizou: hoje qualquer pessoa tem o direito de ser idiota, não importa a idade.
Não era Marx quem dizia que no socialismo era assim que as coisas iam funcionar: “a cada um segundo suas necessidades”? A geração idiota acreditou
Todos aqueles que participam alegremente dessa “geração idiota” parecem estar viciados na adrenalina do cancelamento, e esta adrenalina os impede de enxergar a armadilha óbvia em que caíram: em nome da defesa da diferença, lutam para destruir toda e qualquer diferença, da diferença entre os sexos à diferença de opinião – e, por fim, à diferença entre as gerações, que agora se confundem em uma única trans-geração, na qual todos se unem e se confundem na mesma idiotice.
A consequência desse processo, paradoxalmente, é que nunca se falou tanto em tolerância, mas nunca se exerceu tanto a intolerância; e, quanto mais se fala em amor, mais ódio se pratica.
Segundo o autor, a mensagem que prevalece hoje é que eu posso ser adolescente, mesmo sendo velho, da mesma maneira que eu posso ser mulher, mesmo sendo homem, ou posso ser homem, mesmo sendo mulher. Porque tudo que importa é a autopercepção: eu sou o que eu sinto que sou. É o cogito cartesiano adaptado à era da lacração: sinto, logo sou.
Laje desmonta esse truque de forma cristalina, com um exemplo hipotético. O fato de uma adolescente já muito magra continuar a emagrecer por se perceber gorda – por sofrer de bulimia, anorexia ou algum distúrbio do tipo – não muda o fato de que ela está cada vez mais magra, e que isso pode ser perigoso para a sua saúde.
Mas, pela lógica da geração idiota, os pais dessa moça hipotética deveriam estimulá-la a fazer uma dieta para emagrecer ainda mais, uma vez que, se ela se sente gorda, ela é gorda – da mesma maneira que, se um homem de 130 quilos se sente uma delicada bailarina de 40 quilos, ele é uma bailarina de 40 quilos – e ai de quem discordar ou ousar negar a ele uma vaga na companhia de dança.
A esta geração também foi ensinado que desejos são direitos. A responsabilidade por minha infelicidade, pelas minhas derrotas e fracassos, nunca é minha: a responsabilidade será sempre dos meus pais – ou desse substituto imaginário de pais ausentes, o Estado provedor.
Não era Marx quem dizia que no socialismo era assim que as coisas iam funcionar: “a cada um segundo suas necessidades”? A geração idiota acreditou. Ora, quem não quer ter todas as suas necessidades satisfeitas pelo Estado, sem precisar se esforçar nem correr atrás? A liberdade é um preço até baixo a pagar por esse paraíso, tá valendo.
Uma geração que cresceu soltando pipa no ventilador e jogando bolinha de gude no carpete não foi preparada emocionalmente para enfrentar o mundo real
Falando em geração idiota, por coincidência ontem um colunista do jornal O Globo publicou um artigo intitulado “Jovens de esquerda tendem mais à depressão, segundo estudo” (subtítulo: “Eles seriam mais sensíveis e mais impactados pelas mazelas do mundo”).
O estudo existe, é sério e não me surpreende em nada. Uma geração que cresceu soltando pipa no ventilador e jogando bolinha de gude no carpete – isso quando chegaram a ver “pessoalmente” uma pipa ou uma bolinha de gude, porque a maioria nem isso – não foi preparada emocionalmente nem psicologicamente para enfrentar o mundo real.
Transcrevo abaixo alguns trechos da coluna em questão:
“O estudo, publicado na revista 'SSM Mental Health', apontou uma correlação intrigante entre a identidade política dos adolescentes e uma escala que mede depressão. Estudantes do último ano do ensino médio (17 e 18 anos) que se identificam como 'liberais' (na tradição americana, de esquerda) têm pontuação média significativamente maior na escala que mede depressão do que aqueles que se identificam como 'conservadores'. (...)
“O debate produziu dois tipos de explicação. A primeira acredita que os jovens de esquerda adoecem mais porque são mais sensíveis e mais impactados pelas mazelas do mundo. (...)
"A colunista do jornal 'The New York Times' Michelle Goldberg logo percebeu que a hipótese dos autores do estudo não era muito consistente com os dados. (...) O maior índice de depressão entre adolescentes de esquerda não pareceu ser afetado pela mudança de governo, permanecendo mais elevado tanto no governo progressista de Barack Obama como no governo conservador de Donald Trump. (...)'
“A tese dos autores também despreza que seria igualmente razoável esperar descompasso entre valores e percepção do mundo entre os adolescentes conservadores, já que, no entendimento desse grupo, eles é que estão deslocados num mundo controlado por elites progressistas que destroem a família convencional e os valores americanos tradicionais. (...)
“A segunda linha de interpretação, capitaneada pelo psicólogo social Jonathan Haidt, tenta explicar o adoecimento dos jovens de esquerda pela política progressista contemporânea, que, diz ele, estimula a sensibilidade diante de pequenas agressões e enxerga simples ofensas como grandes e insuportáveis violências.”
Ora, o aumento cada vez mais evidente da depressão, ansiedade e outros distúrbios entre adolescentes – que já ganham contornos de pandemia – é uma consequência natural desse experimento social cruel que transforma todos em vítimas e cobradores de direitos, sem desenvolver qualquer senso de dever ou responsabilidade. E isso só vai piorar. As consequências a gente está deixando pra ver depois.
Pode até dar algum prazer a curtíssimo prazo acreditar que, para ser feliz, basta lacrar, exibir virtude, exigir direitos e apontar o dedo. Mas, com o tempo, esses jovens vão descobrir – já estão descobrindo – que vitimismo não leva a lugar nenhum – e que aqueles que os fizeram investir no papel de vítimas vão virar as costas quando os boletos começarem a chegar e os problemas reais aparecerem. Vocês estão sendo enganados, bobinhos.
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