Maurício Maestro (primeiro à esquerda) no Boca Libre: banda se separa após mais de 40 anos| Foto: Divulgação
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Na semana que passou, três dos quatro integrantes da banda Boca Livre, criada há mais de 40 anos e responsável por sucessos como “Toada” e “Quem tem a viola”, anunciaram que estavam abandonando o grupo. O motivo: eles consideraram insuportável a atitude do cantor e contrabaixista Maurício Maestro, que decidiu não tomar, por enquanto, a vacina contra a Covid-19.

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É a “intolerância do bem” fazendo mais uma vítima. Maestro, que tem dúvidas sobre a eficácia da vacina, não tentou impor sua opinião a ninguém, nem é contra quem opta por se vacinar correndo: ele estava, simplesmente, exercendo sua liberdade de pensamento e de escolha. Mas isso bastou para que o convívio – depois de 40 anos de estrada! – se tornasse impossível aos olhos de seus (agora ex) colegas.

Um dos integrantes da banda divulgou a seguinte nota, ao anunciar sua decisão: “Abandono esse projeto que criei com tanto carinho. Pensei que persistir seria a arma para não sufocar. Mas hoje, o país que já está asfixiado precisa se curar primeiro para depois voltar a se amar”.

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A mensagem me parece clara: enquanto durar o atual governo, os autoproclamados defensores da democracia e da liberdade estão livres para odiar, isolar, censurar e perseguir todos aqueles que pensam de forma diferente da deles - já que todos são fascistas e de extrema-direita. Quando a esquerda voltar ao poder, nem que seja na marra e tratorando a vontade popular, aí sim eles poderão voltar a amar e defender a liberdade de expressão – dependendo daquilo que se quiser expressar, é claro.

Porque no fundo é disso que se trata. Por se negar a aderir ao pensamento único do campo dito progressista, que classifica o governo eleito pela maioria dos eleitores (ou Bolsonaro foi eleito pelas elites?) como fascista e genocida, Maestro se tornou uma figura execrável até mesmo para os companheiros de mais de 40 anos de profissão.

Quando me deparo com episódios assim (infelizmente cada vez mais frequentes), sempre penso na frase célebre da revolucionária Rosa Luxemburgo: “A liberdade é sempre a liberdade de quem pensa diferente de nós”. Não é mais assim que funciona: para 99% dos artistas e intelectuais no Brasil, a liberdade é exclusivamente a liberdade de quem pensa como eles. Quem pensa diferente tem mais é que ser asfixiado e sufocado mesmo.

Fico aqui pensando em qual teria sido a reação da mídia e da “galera do bem” se Maestro tivesse anunciado que deixaria o Boca Livre durante os governos do PT, por não concordar com o silêncio dos colegas diante dos escândalos de corrupção. Seria bem diferente, estou seguro.

Mas, justamente, Maestro não fez isso: mesmo sendo conservador e católico, ele conviveu democraticamente, ao longo de décadas, com quem tinha opiniões políticas diferentes das suas – coisa que o campo derrotado nas urnas hoje demonstra ser incapaz de fazer, apesar de seu discurso de defesa da democracia.

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Estranho conceito de democracia: se três músicos decidem deixar uma banda por não aceitarem conviver com uma opinião diferente, o intolerante é quem pensa de forma diferente, não quem não suporta a diferença.

Já na grande mídia, como era de se esperar, muitos jornalistas virtuosos atribuíram a culpa pelo fim do Boca Livre ao governo Bolsonaro, teimando em bater o mesmo tambor de sempre. Nessa narrativa enlouquecida repetida à exaustão, tudo de ruim que acontece no país é culpa do presidente genocida – até o fim de uma banda.

Para evitar mal entendidos, atenção: eu vou tomar a vacina assim que puder e acho que Bolsonaro deu péssimos exemplos ao longo da pandemia. Acho abominável a politização da vacina e da pandemia, o que acontece tanto pela esquerda quanto pela direita.

Mas também acho perfeitamente legítima a preocupação de quem, diante das informações desencontradas sobre a eficácia da imunização, escolhe aguardar: “Eu tenho o pé atrás mesmo, afirmou o músico. “Quero esperar os resultados para poder escolher”.

Ao que parece, estamos, sim, vivendo uma ditadura, mas é a ditadura do pensamento único e do politicamente correto. E o mais assustador é que são justamente aqueles que afirmam defender a democracia e a liberdade que se mostram mais autoritários e intolerantes.

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Na entrevista abaixo, Maurício Maestro comenta o episódio e fala sobre seus planos para o futuro: “O Boca? Só se eu sentir que pode voltar a ser realmente Livre”.

_ O que mais me impressionou nesse episódio foi que as pessoas que julgam estar defendendo a democracia são aquelas que se mostram mais intolerantes com a diferença – e nem se dão conta disso. Especialmente na cultura e na mídia, vivemos uma fase do pensamento único e do “ódio do bem”. Aqueles que julgam estar do lado “certo” se sentem no direito de abandonar, excluir do convívio, perseguir e sufocar quem não vota no candidato e no partido deles. É mais ou menos assim: “Quem não pensa como eu é fascista e não merece conviver comigo”.

MAURÍCIO MAESTRO: Esse é um fenômeno cujas raízes vêm de mais longe. A chegada do "politicamente correto", com uma série de regrinhas que foram paulatinamente sendo impostas à sociedade, foi transformando a conduta da maioria das pessoas em respostas pavlovianas a estímulos de medos e recompensas.

A campanha antitabagista, por exemplo, transformou os fumantes em "perigosos disseminadores da destruição de pulmões alheios", chegando-se a absurdos de em certos países proibirem fumar até em locais abertos, como parques. Os não-fumantes passaram a ser cada vez mais autoritários e repressivos, tudo em nome de uma "causa" humanitária... Não sou fumante, mas fico indignado quando vejo amigos meus tendo que se levantar de uma mesa para fumarem um cigarrinho "lá fora" , como se fossem uns viciados indignos do convívio, e acharem isso normal.

De proibição em proibição, de recompensa em recompensa, foi sendo criada uma massa de indivíduos prontos a se sujeitarem a qualquer coisa que venha impregnada desse "verniz" do bom mocismo, e a combater furiosamente toda e qualquer iniciativa de pelo menos discutir a questão. É claro que as posições políticas, e religiosas, contrárias a qualquer tipo de dominação globalista seriam o alvo prioritário a ser combatido pelos perpetradores dessa "programação" coletiva.

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_ Até onde eu li, você não tentou impor a sua opinião aos colegas da banda.

MAESTRO: Realmente eu só quis manter meu direito à escolha, sem impor aos outros. Se ter meu direito preservado é ser cúmplice de genocídio, o que dizer de todos que fizeram de tudo para impedir que fosse dado tratamento com Cloroquina, Azitromicina e Ivermectina aos doentes, isso sim causando inúmeras mortes? Não sou contra vacinas, e muito menos contra o uso de remédios que mostraram eficácia no tratamento precoce. Sei de médicos que tiveram Covid, se trataram com esses medicamentos, mas ficaram com medo de receitar o mesmo tratamento aos seus pacientes, para não perderem a licença... Quanto aos motivos dos que abandonaram o barco, pergunte a eles.

_ O assustador é que a narrativa da mídia inverte completamente a situação: foram seus colegas que não admitiram que você tivesse uma opinião diferente da deles, e são eles que não conseguem conviver com a diferença; mas eles saem na foto como defensores da democracia e do amor, e você, nas entrelinhas, como insensível apoiador de um “genocídio” – pelo simples fato de declarar ter um pé atrás com a vacina, com base em uma experiência pessoal [uma forte reação a uma vacina contra a Febre Amarela].

MAESTRO: Nesse mundo atual está tudo invertido, então não é de espantar que seja essa a narrativa que tentem fazer prevalecer. Apesar disso, tenho recebido inúmeras mensagens de apoio, de gente que sofre os mesmos tipos de pressão.

_ Certamente você foi o mais prejudicado nessa história toda, já que seus colegas saíram como heróis da resistência, e você como o vilão, pelo menos segundo a mídia. Que consequências você acha que isso pode ter para a sua carreira?

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MAESTRO: A carreira de músico é um eterno sofrimento. Temos que a todo momento escolher entre a integridade musical e as armadilhas do sucesso imediatista. Nunca fui um "queridinho da mídia", mesmo com todo o sucesso que o Boca Livre já teve. Nunca dependi da minha "boa imagem na foto" pra obter favores no meio musical. Tenho certeza de que, se algumas portas se fecharem, outras tantas se abrirão.

_ Fico imaginando que, ao longo de 40 anos de amizade e convívio na banda, outras diferenças mais sérias foram superadas, pelo simples fato de que, numa democracia, a gente tem que saber conviver com a divergência. Vocês continuaram juntos, por exemplo, ao longo dos 14 anos do PT no poder, e nem por isso você rompeu com seus colegas. Como você explica essa onda de intolerância contra qualquer artista que ouse discordar do pensamento único que enxerga a política como uma disputa entre o bem e o mal?

MAESTRO: Numa época em que a disputa eleitoral era entre o PT e o PSDB, dois lados da mesma moeda, ser contra ou a favor de qualquer um desses partidos, no fundo no fundo, não fazia qualquer diferença. Nunca enxerguei os ex-colegas do grupo como petistas de carteirinha, e nem essas questões eram assunto. Tudo mudou quando surgiu um real movimento conservador, que mudou o eixo da disputa.

Nesse momento, os radicalismos apareceram, cada vez mais acirrados. As posições conservadoras, que antes não eram combatidas porque praticamente não apareciam, foram ganhando adeptos até terem se mostrado majoritárias nas eleições de 2018. Em contrapartida, a fúria radical em destruir qualquer forma de manifestação da "extrema-direita" foi chegando às minorias raivosas com apoio da mídia e de uma parte da classe artística. O que vemos hoje é consequência disso.

_ Outra reação comum na mídia tem sido associar o episódio ao governo atual, como se a divisão da sociedade brasileira entre “nós” e “eles” tivesse começado ontem – quando, na verdade, ela foi deliberadamente alimentada ao longo de muitos anos, como ferramenta de perpetuação no poder de um campo político. Qual é a sua leitura da política brasileira dos últimos anos?  

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MAESTRO: Como eu disse antes, o surgimento de um movimento conservador que despertou a maioria silenciosa fez despertar essa fúria contrária que tem sido capaz de criar e inverter narrativas sempre com a intenção de calar, boicotar, difamar e até, se preciso, destruir qualquer um que se coloque contra o "discurso único" da esquerda, unida ao globalismo internacional. Como o presidente Bolsonaro simboliza essa resistência, ele e todos os que, de uma forma ou de outra, o apoiam são impiedosamente massacrados.

_ Que eu lembre, até o final do governo FHC, parentes não rompiam relações, nem amizades se desfaziam por causa de política. As pessoas exerciam seu direito de apoiar ou odiar o governo, mas a política não contaminava as relações pessoais como acontece hoje. Você concorda?

MAESTRO: Acho que expliquei acima, não havia dois lados, a "disputa de poder" era uma farsa.

_ O Boca Livre acabou? Pode voltar? Quais são seus planos agora?

MAESTRO: Quando o Boca Livre "acabou" em 1994, as pessoas me perguntavam: "E aí, o sonho acabou?" Eu respondia: "Não, o que acabou foi a realidade!" Planos? Não sei; o que vejo pela frente são montanhas querendo tapar minha visão do horizonte. E algumas nuvens passageiras que podem se dissipar ou se tornar uma grande tempestade... Pretendo seguir fazendo o que sempre fiz na música, e expandir minha atuação para cursos – a princípio, online – onde quero expor minha filosofia musical. Também comecei, um tempo atrás, a escrever um livro de memórias, antes que eu as perca, ainda sem pretensões editoriais. O Boca? Só se eu sentir que pode voltar a ser realmente Livre.

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