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Uma boa notícia para você, mulher, que pensa em passar o Carnaval no Rio de Janeiro mas está preocupada com a violência na cidade: seus problemas acabaram! Basta comprar uma calcinha com bolso, peça indispensável no guarda-roupa das cariocas. Nela você pode esconder seu celular, cartão de débito e até o dinheiro da cervejinha.
Parece piada, mas não é. A reportagem abaixo apresenta mais detalhes sobre a nova moda – apresentada como solução para o problema da violência:
Chama a atenção o tom da reportagem. Os apresentadores, sorridentes e bem humorados, anunciam a novidade como se estivessem falando da marchinha que promete pegar neste Carnaval. Ou como se estivessem dando recomendações sobre como enfrentar o calor na cidade.
Sim, parece que a insegurança se tornou tão natural quanto o calor do verão, um destino com o qual devemos tentar conviver de forma alegre e bem humorada.
Corte para registros de furtos e assaltos de celulares, “cada vez mais comuns” segundo a repórter que entra em cena: “Segundo dados do Instituto de Segurança Pública do Rio, até novembro do ano passado foram registrados mais de 30 mil furtos de celulares em todo o estado do Rio. Mas estes números podem ser ainda maiores, já que o mês de dezembro, período de festas de fim de ano, ainda não foi contabilizado”.
Nenhum sinal de indignação, revolta ou cobrança das autoridades, ao contrário. Há um certo tom de conformismo, como se fosse muito natural sair na rua e ter seu celular roubado, frequentemente com uma arma apontada para sua cabeça. O jeito é levar no bom humor.
A repórter apresenta então as calcinhas antifurtos, “uma das saídas encontradas para aproveitar a folia e se proteger de possíveis criminosos”, que já é vendida há anos por ambulantes, mas que virou uma verdadeira febre desde que uma jovem psicóloga postou um vídeo no TikTok, no final do ano passado, tema desta outra matéria.
“Viralizou nas redes sociais um vídeo em que uma psicóloga mostra o presente que ganhou para passar o Réveillon carioca com mais segurança: uma calcinha com bolso para celular. ‘Você quer saber a nova moda de fim do ano do Rio para não ser assaltado?’, diz Mara Gomes, no vídeo que chegou a mais de 13 mil visualizações no TikTok. Nos comentários da publicação, feita no dia 31 de dezembro, vários usuários exaltaram a invenção.”
Uma busca simples no Google mostra que a peça íntima está à venda em inúmeros sites no Brasil inteiro, sinalizando que a moda não é apenas carioca, mas se espalha por todo o país. Que maravilha, este promete ser o Carnaval mais seguro de todos os tempos!
Uma boa notícia para você, mulher, que pensa em passar o Carnaval no Rio de Janeiro mas está preocupada com a violência na cidade: seus problemas acabaram!
Pois bem, também não é apenas no Rio de Janeiro que é generalizada a percepção de que a violência vem aumentando. As notícias de assaltos e assassinatos se tornaram tão frequentes que nem chocam mais: viraram rotina. Igualmente generalizada é a percepção de que os cidadãos de bem estão entregues à própria sorte, já que, quando a polícia prende, a Justiça solta.
Em um país normal, turistas serem obrigadas a usar calcinha com bolso para reduzir as chances de perder o celular deveria ser motivo de escândalo; no Brasil, parece que é motivo de alegria, mais uma prova da criatividade e da malandragem dos brasileiros. Que divertido!
Por sua vez, as autoridades responsáveis pela segurança dos cidadãos fingem que não têm nada a ver com o assunto. Parecem mais preocupadas com os direitos humanos dos presos ou com preconceitos estruturais dos policiais – ou com o bem-estar dos detentos nas audiências de custódia.
Mas causas têm consequências. Algumas dessas consequências são impossíveis de estimar. Quanto vale a vida de uma vítima da violência? Mas outras dá para estimar sim. Um levantamento da Confederação Nacional do Comércio mostra que o Rio de Janeiro deixou de ganhar R$ 3,3 bilhões com turismo, em 2023, por causa da violência. Segundo esta reportagem:
“A incidência de roubos e furtos em zonas em que tipicamente os turistas se concentram, como Copacabana, na Zona Sul, vem subindo em escala preocupante, a ponto de ser assunto preferencial nas redes e nas mesas de bar. Não raro, esses crimes, que avançaram quase 40% em oito meses, se dão na forma de arrastões, produzindo aquelas cenas de bandos surrupiando a população no atacado. O crescimento dessa prática é tão impactante que voltou à cena o surreal conceito de “celular do bandido” — mais barato e sem dados armazenados. (...)Já as caixas de som que embalam os quiosques da orla estão sendo agora acorrentadas a cadeiras para não ser roubadas pelas turbas que passam carregando tudo de valor que encontram pela frente. Vítima de um desses arrastões, um grupo de taiwaneses passeava pelo famoso Calçadão quando foi abordado por duas dezenas de marginais que lhe arrancaram celulares e joias.”
Mas, como diz a ambulante da primeira reportagem, dá para curtir o Carnaval no Rio sim. Basta usar a calcinha com bolso. Confia.