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Luciano Trigo

Luciano Trigo

Os institutos de pesquisa vão fechar as portas?

(Foto: Reprodução Instagram)

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Longe de mim sugerir que os principais institutos de pesquisa do país erraram feio de propósito, manipulando os números em uma tentativa de influenciar o eleitor e favorecer determinado candidato, seja para presidente, governador ou senador – o que seria algo criminoso. Acredito que eles jamais seriam capazes de fazer isso. Mesmo assim, acho que esses institutos deviam tomar a iniciativa de fechar as portas.

Por quê? Por pura vergonha da própria incompetência. Eu, sinceramente, se tivesse recebido milhões de reais e entregasse esse serviço porco, sinceramente, pediria pra sair. E pediria o dinheiro de volta se tivesse sido eu a pagar pelas pesquisas. E mandaria uma mensagem junto com o boleto de cobrança do valor pago, dizendo: “Eu paguei por pesquisa de intenção de voto, não por pesquisa de wishful thinking. Vocês são pesquisadores ou torcedores?”

Aliás eu nem faria mais pesquisa no segundo turno, porque qualquer pesquisa será ridicularizada. E acho que, diante da vergonha que os institutos passaram, os eleitores do presidente estão no direito de se recusar a responder qualquer pesquisa a partir de agora.

Aliás, o senador Ciro Nogueira acaba de sugerir isso em seu perfil no Twitter:

Esses eleitores têm o direito de não acreditar que pesquisas com margem de erro de até 17% são sérias, para dizer o mínimo, ou achar que são mal-intencionadas. Podem imaginar até que esses institutos apostaram na expectativa da profecia autorrealizada, o que já seria uma conduta altamente condenável.

Não vou nem falar na pior hipótese. Mas devo dizer que achei muito estranho um artigo, publicado ontem, com o título “Pesquisas pré-eleitorais não errarão nem acertarão os resultados das urnas".

Oi? Se as pesquisas não errarão nem acertarão, elas farão o que exatamente? E para que servem pesquisas que não acertam nem erram? Para confundir o eleitor? Na verdade, o título até me fez lembrar uma famosa declaração da ex-presidente Dilma Rousseff: “Não acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem perder, vai ganhar ou perder”. É sobre isso, e não está tudo bem.

Realmente, o abismo entre previsão e resultado foi algo escandaloso (e espero, repito, que tenha sido só por incompetência), tão escandaloso que deveria irritar até os eleitores de Lula: afinal de contas, eles foram iludidos e enganados: já estavam até preparando a festa da vitória, mas agora vão dormir com a pulga atrás da orelha.

(Observem que não estou aqui nem declarando meu voto nem cravando qual será o resultado do segundo turno, que, acredito, tende a ser apertado. O assunto deste artigo é tão-somente o vergonhoso desempenho dos institutos de pesquisa, que podem ser considerados os principais derrotados no primeiro turno, depois de Lula – que, mesmo tendo chegado numericamente à frente de Bolsonaro, amargou derrotas inesperadas nas eleições para governador e senador dos principais estados do país - nenhuma delas, tampouco, prevista pelas pesquisas.)

Nas eleições para prefeito de 2020, os principais institutos de pesquisa já tinham falhado miseravelmente em diversas previsões, como demonstrei no artigo “O Ibope deve uma satisfação aos eleitores”. Na ocasião, escrevi:

“Eleição após eleição, os principais institutos de pesquisa vêm passando vergonha no Brasil, e em 2020 não foi diferente. Na melhor das hipóteses, a metodologia que estão usando é frágil – e já deveria ter sido corrigida. Não vou especular sobre hipóteses piores, mas cabe a pergunta: será apenas uma coincidência que os erros favoreçam sempre os candidatos de esquerda? Torço para que seja coincidência, mas, convenhamos, para muita gente será difícil acreditar nisso.

“Há uma questão ética envolvida aqui. É aceitável que institutos de pesquisa cometam erros absurdos em série, sem sofrer qualquer tipo de advertência ou sanção por parte da Justiça Eleitoral? Porque parece evidente que falhas dessa proporção podem prejudicar (ou beneficiar) candidatos de forma decisiva. Uma pesquisa que na véspera da eleição aponta um candidato com 10 pontos de desvantagem pode encerrar as chances desse candidato; depois que a votação acontece e mostra uma diferença real de 1%, é tarde para reparar o dano.”

Mais recentemente escrevi outro artigo sobre o tema, “As pesquisas se tornaram irrelevantes para o eleitor”, movido pela estranheza provocada pelos números das pesquisas. Estas teimavam em apontar uma diferença enorme entre Lula e Bolsonaro, como se nem as manifestações gigantescas do Sete de Setembro, nem o fraco desempenho do candidato do PT nos debates, nem a recuperação notável da economia nos últimos meses tivessem qualquer impacto nas intenções de voto. Estranho, não?  Desta vez escrevi, e modestamente acredito que os fatos estão me dando razão:

“Há dois tipos de atividade cujo principal patrimônio é a credibilidade: o jornalismo e as pesquisas de opinião. Um jornal que perde a credibilidade não tem valor algum. Uma pesquisa na qual ninguém acredita, tampouco. Grandes jornais e importantes institutos de pesquisa que, sabe-se lá com que motivação, jogaram na lata de lixo seu principal patrimônio já estão condenados, mesmo que ainda não tenham se dado conta disso. São mortos sem sepultura.

“Quando são sérios, institutos de pesquisa e grandes jornais prestam importantes serviços à sociedade, podendo até influenciar o voto do eleitor de uma maneira honesta. Quando se transformam em instrumentos de uma agenda política, eles se tornam, em um primeiro momento, nocivos. Em seguida, tornam-se irrelevantes, já não influenciam o voto de mais ninguém.”

O que está acontecendo é algo muito sério e grave. Pesquisas ainda influenciam os eleitores (mesmo que cada vez menos). Se as pesquisas tivessem refletido minimamente os números reais da votação deste domingo (mesmo as pesquisas divulgadas na véspera!), o resultado poderia ter sido outro, porque mudaria a percepção dos eleitores.

É fato que muitos eleitores indecisos acabam votando em quem está na frente. Se a velha mídia e os institutos de pesquisa afirmam que um candidato está 15 pontos percentuais à frente do outro, isso pode ter acontecido com muita gente – gente que votaria de forma diferente, se os números divulgados fossem outros, mais próximos da realidade.

Pior: diante da acachapante diferença anunciada, muitos eleitores de Ciro Gomes e Simone Tebet podem ter migrado para o candidato líder das pesquisas por desânimo, aderindo ao voto útil. Isso certamente aconteceu com os eleitores de Ciro. Por fim, eleitores mais pessimistas de Bolsonaro podem ter desistido de votar, também em função das pesquisas.

Mas vamos aos números dessas pesquisas, algumas delas publicadas ONTEM, confrontados com os números reais de HOJE. Para não cansar o leitor, vou citar somente os casos mais escandalosos – todos eles, por coincidência, favorecendo os candidatos de esquerda: a lista de erros gritantes seria interminável. Os números estão arredondados sem casas decimais.

Presidente:

IPEC: Lula 51%, Bolsonaro 37% (4% acima da margem de erro de 2 pontos)

Datafolha: Lula 50%, Bolsonaro 36% (5% acima da margem de erro de 2 pontos)

Realidade: Lula 48%, Bolsonaro 43%

Governador São Paulo:

IPEC: Haddad 41%, Tarcísio 31% (9% acima da margem de erro de 2 pontos)

Datafolha: Haddad 39%, Tarcísio 31% (9% acima da margem de erro de 2 pontos)

Realidade: Tarcísio 42%, Haddad 36%

Senador São Paulo:

IPEC: França 43%, Pontes 31% (17 pontos acima da margem de erro de 2 pontos)

Datafolha: Marcio França 47%, Marcos Pontes 30%

Realidade: Marcos Pontes 50%, Marcio França 36%

Governador Rio de Janeiro:

IPEC: Castro 47% (10% acima da margem de erro de 2 pontos), Freixo 28%

Datafolha: Castro 44% (13% acima da margem de erro de 2 pontos), Freixo 35%

Realidade: Castro: 59%, Freixo 27%

Governador Minas Gerais:

IPEC: Zema 50%, Khalil 42% (5% acima da margem de erro de 2 pontos)

Realidade: Zema 56%, Khalil 35%

Governador Rio Grande do Sul:

IPEC: Leite 40% (11 pontos acima da margem de erro de 2 pontos), Onyx 30%

Realidade: Onyx 38%, Eduardo Leite 27%

Além disso, nas eleições para Senador foram eleitos ou chegaram bem à frente dos adversários (bem mais à frente do que indicavam as pesquisas): Romário no Rio de Janeiro; Sérgio Moro no Paraná (Moro deu um duplo mortal carpado e apoiou Bolsonaro no primeiro turno; já o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, também considerado traidor pelo eleitorado de Bolsonaro, foi derrotado no Mato Grosso do Sul pela candidata do Presidente: sonhou ser eleito para o Planalto, não foi eleito nem senador). O PL de Bolsonaro passou a ter, apenas, a maior bancada do Senado.

Ainda para o Senado, Bolsonaro também elegeu Damares Alves (ela mesma) no Distrito Federal, Rogério Marinho no Rio Grande do Norte, Jorge Seif em Santa Catarina, Wellington Fagundes no Mato Grosso e Magno Malta no Espírito Santo, entre outros.

Também na Câmara de Deputados vários candidatos de Bolsonaro tiveram desempenho “surpreendente”, a julgar pelas pesquisas, com o PL fazendo uma bancada muito acima de qualquer prognóstico: 101 deputados, 20% da Casa. Mas acho desnecessário listar. Já deu para concluir que as urnas mandaram um recado duro para a esquerda – recado que os institutos de pesquisa foram incapazes de (ou não quiseram) prever.

Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima

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