“Se você acha que os homens fortes são perigosos, espere até ver do que são capazes os homens fracos”.
A frase é do psicólogo, professor e escritor canadense Jordan Peterson, que dispensa apresentações. Eu me lembrei dela quando li, nesta semana, o título de uma coluna na “Folha de S.Paulo” sobre a viagem do presidente Bolsonaro à Rússia:
“Objetivo da viagem de Bolsonaro para encontrar Putin é exaltar masculinidade tóxica"
Certo. Toda a agenda montada durante meses pela diplomacia dos dois países – que inclui, além de reuniões formais entre os chefes de Estado, encontros com empresários e lideranças políticas e iniciativas para estimular o comércio entre Brasil e Rússia, sobretudo nas áreas da energia e do agronegócio – é apenas uma cortina de fumaça, uma manobra diversionista.
A agenda secreta e verdadeira da viagem é exaltar a masculinidade tóxica. Depois dos eventos públicos, Putin e Bolsonaro vão fazer uma reunião secreta, regada a muita vodca (coisa de macho) e piadas machocêntricas, onde serão debatidas estratégias para a expansão planetária do machismo fascista heteronormativo.
Mas o que seria masculinidade tóxica? Pesquisei no Google: “Masculinidade tóxica é uma construção social, que define um conjunto de regras que determinam comportamentos específicos esperados de indivíduos do sexo masculino”.
Fiquei confuso. A conclusão necessária é que todas as regras que determinaram comportamentos esperados dos homens na História de todas as Civilizações do planeta, no Oriente e no Ocidente (aponte uma civilização em que tais regras não existiram) são tóxicas e – e precisam, portanto, ser apagadas e destruídas.
Este é um processo que já está em curso: estamos vivendo o verdadeiro crepúsculo do macho – aliás, título de um antigo livro de Fernando Gabeira. A própria palavra “macho” ganhou uma conotação negativa, passou a designar um problema: a mensagem subliminar é que todo macho é tóxico (da mesma forma que todo heterossexual é homofóbico etc).
A própria palavra “macho” ganhou uma conotação negativa, passando a designar um problema: a mensagem subliminar é que todo macho é tóxico
O problema é que as novas regras da “masculinidade frágil” que estão tentando enfiar goela abaixo da sociedade também serão uma construção social – pelo simples fato de que tudo na vida pode ser entendido como uma construção social.
(Aliás, nem tudo: aquilo que é determinado pela genética, como o sexo biológico, não é uma construção social, por mais que se esforcem para fazer você acreditar no contrário.)
A diferença é que esta será uma construção social imposta por uma minoria, na base do grito e do constrangimento, e não o resultado de transformações sociais que incluem mudanças de valores da maioria.
Vamos ver se vai funcionar. Mas, se o objetivo é a harmonia, por enquanto não está dando certo.
Voltando à frase de Jordan Peterson: parece cada vez mais evidente que, pelos menos na mídia e nas redes sociais, nunca houve tanto bom-mocismo e ostentação de virtude quanto hoje. Todos são bonzinhos, todos sabem o que é certo, todos se julgam moralmente superiores e fazem questão de ostentar isso. Todos odeiam machos fortes e exaltam a masculinidade frágil. Todos falam de amor.
E nunca se viu tanto ódio.
Porque todos esses virtuosos parecem viver à espera de uma oportunidade de participar de linchamentos morais, como os que vimos esta semana. Todos ficam à espreita de quem será o próximo famoso que dirá ou fará alguma m**** para cair em cima, babando de ódio, como aves de rapina. Esta se tornou a razão de viver de muita gente infeliz e ressentida.
E o pior é que, à sede de sangue, se soma uma incapacidade de interpretação de texto (e de imagens) verdadeiramente assustadora. Não importam o contexto, o que o cara realmente falou, a intenção do gesto que ele fez etc: no universo moral do progressismo lacrador não há nuances, nem direito a contraditório, nem vontade honesta de debater: tudo o que importa são likes, tags e compartilhamentos.
Na sociedade do ódio do bem, só há duas categorias de pessoas: os progressistas lacradores e os outros, os criminosos hediondos que merecem ser esfolados em praça pública – mesmo que o crime hediondo seja uma opinião ou um gesto ambíguo. Porque quem determina o que é certo e errado é o endosso de grupos barulhentos.
Há, é claro, aqueles que se aproveitam desse ambiente para operar de má-fé, usando o frenesi das manadas para perseguir desafetos. Mas há também uma massa de pessoas “comuns”, que se julgam boazinhas e bem intencionadas, que acredita sinceramente que é certo e bonito ir para a internet tirar uma casquinha da carniça da vez. É assustador. Deus me livre dessa gente boazinha.
São esses os homens (e, aliás, mulheres) fracos a que Jordan Peterson se refere. Mas a exaltada fragilidade também pode ser sinal de covardia e fraqueza de caráter. E quem continuar dando corda para essa turma só para ganhar um punhado de likes corre o risco de se transformar em breve no Cristo da vez.