Plenário da Câmara derruba trechos do novo marco do saneamento: derrota para o governo| Foto: Agência Brasil
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Um terço do primeiro ano do governo já passou, sem que o clima de polarização da sociedade tenha arrefecido. Ao contrário, embora, na campanha eleitoral, tenha circulado a narrativa de que o amor venceria e a sociedade se pacificaria, o que esá se vendo é justamente o oposto, um esforço continuo e, aparentemente, deliberado, para dividir ainda mais os brasileiros entre “nós” e “eles”. Os acontecimentos de ontem apenas comprovam que não se trata de acaso ou improviso, mas de estratégia e método.

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Dará certo? Como, no Brasil, até o passado é imprevisível, não dá para cravar o que vai acontecer. Mas não há motivos para otimismo. Isso porque essa estratégia e esse método partem de um conjunto de premissas que me parecem equivocadas. Mas quem sou eu na fila do pão...

De qualquer forma, seguem seis premissas que parecem nortear o comportamento do governo neste início de mandato – e que podem estar levando o país para um caminho inesperado e surpeendente, para muitos.

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Premissa errada número 1: perseguir o adversário aumentará a popularidade do governo

Não aumentará. A perseguição pode até reforçar a convicção dos já convertidos e dos apoiadores incondicionais do presidente, mas não atrairá o apoio de ninguém fora da bolha. Pior ainda, pode gerar o sentimento, naquelas pessoas comuns não comprometidas com ideologias, de que estão passando do ponto. Brasileiros tendem a simpatizar com quem é perseguido e a hostilizar quem persegue. Aliás, essa lição deveria ser óbvia, já que, ao ser preso em um passado recente, o próprio presidente virou mártir junto a uma parcela significativa do eleitorado. Muitos brasileiros não votaram com a razão, mas com a emoção. Nada impede que a emoção da maioria se volte contra o governo.

Premissa errada número 2: bodes expiatórios protegerão o governo, em caso de acirramento da crise econômica

Não protegerão. Fora da bolha, a sociedade não quer culpados para apontar o dedo, e sim que as coisas dêem certo. Se a inflação e o desemprego saírem do controle, os brasileiros comuns não vão querer saber se a culpa foi do presidente malvadão do Banco Central que se recusou a baixar os “juros genocidas” (sim, já estão usando essa expressão, basta pesquisar no Google). Eles vão cobrar do governo que foi eleito as promessas de campanha. Isso também não é novo: Dilma foi reeleita fazendo promessas de um novo ciclo de crescimento, mas bastaram poucos meses para que o povo e o sistema que a reelegeram se voltassem contra ela.

Embora, na campanha eleitoral, tenha circulado a narrativa de que o amor venceria e a sociedade se pacificaria, o que esá se vendo é justamente o oposto, um esforço continuo para dividir ainda mais a sociedade entre “nós” e “eles”

Premissa errada número 3: práticas de articulação junto ao Congresso que funcionaram de 2003 a 2008 também funcionarão no atual mandato

Não estão funcionando. Em mais de 120 dias o governo ainda não conseguiu aprovar nenhuma proposta relevante no Congresso Nacional. Pior ainda, fracassou miseravelmente nos dois primeiros testes (o PL 2630, cuja votação foi adiada por iminência de derrota, e a derrubada acachapante – 296 x 136 votos – de trechos do novo marco do saneamento). Isso apesar de toda a campanha a favor feita pela velha mídia e por integrantes do Judiciário (porque, no Brasil, mídia e Judiciário parecem ter lado – e nem fazem questão de esconder – como se isso fosse normal: é a democracia de um lado só. Fato é que, pelo menos na Câmara, os parlamentares deixaram claro que o governo não terá vida fácil. E os problemas tendem a piorar com a instalação da CPMI de 8 de janeiro e a CPI do MST – principalmente esta, que tem grande potencial de estrago, apesar de estar recebendo pouca atenção.

Premissa errada número 4: narrativas triunfam sobre a realidade   

Podem até triunfar, temporariamente, mas no fim do dia a realidade sempre se impõe. Fora da bolha, a sociedade está muito mais interessada em resultados que em palavras. E já aumenta a impaciência de quem estuda e trabalha com a lacração de quem não trabalha nem estuda, de quem acha que o Estado tem obrigação de resolver todos os seus problemas. Pelo menos metade dos brasileiros já entendeu que, como afirmou o ex-presidente americano Gerald Ford, “um governo grande o suficiente para lhe dar tudo o que você quer é um governo grande o suficiente para tirar de você tudo o que você tem”.

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Premissa errada número 5: a grande mídia tem o mesmo poder de antes de comandar a opinião pública

Não tem. As redes sociais mudaram tudo, ao mesmo tempo em que grandes grupos de comunicação aderiram ao ativismo jornalístico e abriram mão de seu principal capital junto aos leitores: a credibilidade e a isenção. E esse caminho não tem mais volta: depois de tudo que aconteceu nos últimos anos, mesmo que censurem e amordacem todas as redes sociais, ninguém fora da bolha voltará a confiar na grande mídia como confiava antes.

Premissa errada número 6: o tempo anda para trás

Não anda. Essa premissa engloba e explica todas as outras. Diariamente, o governo passa a impressão de acreditar que ainda estamos em 2003, sem se dar conta de que todos envelhecemos. Mas muita coisa aconteceu nesses 20 anos, e a sociedade brasileira mudou muito: ela está mais desconfiada em relação à retórica populista, ao bom-mocismo progressista, às referências antigas e ultrapassadas, bem como à narrativa de monopólio do bem e da preocupação coma justiça social. Quero crer que mesmo os mais jovens, apesar de toda a lavagem cerebral nas salas de aula das escolas e universidades com partido, já se mostram menos vulneráveis e suscetíveis à doutrinação e à sedução dessas narrativas.  O Brasil mudou. O tempo não anda para trás.