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Lúcio Vaz

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Funcionalismo público

Aposentadorias e pensões de militares e civis geram milhares de rendas duplas e triplas

pensões triplas
Familiares da cúpula militar acumulam pensões com valores que chegam aos R$ 60 mil. (Foto: Julio Nascimento/PR)

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O cruzamento das folhas de pagamento de aposentados e pensionistas divulgadas pelo governo federal revela cerca de 6 mil rendas duplas ou triplas que somam até R$ 66 mil, sem sofrer abate-teto. Cerca de 10% desses pagamentos são ilícitos. Há casos de filha pensionista de dois pais, general e almirante reformados e ex-combatentes ao mesmo tempo e militar que acumula aposentadoria e pensão. Levantamento feito pelo blog apurou 17 pensões triplas e pelo menos 66 rendas acima do teto constitucional.

A divulgação aconteceu em cumprimento a uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), que acatou denúncia da agência Fiquem Sabendo sobre o descumprimento da Lei de Acesso à Informação. O governo federal mantinha em sigilo os dados de aposentados e pensionistas. Em janeiro de 2020, o governo Bolsonaro divulgou apenas os dados dos pensionistas de servidores civis, preservando os militares. A agência protocolou em janeiro deste ano uma nova denúncia no tribunal, por descumprimento da sua decisão. Em junho, o TCU reiterou ao governo federal que os dados dos militares também deveriam ser disponibilizados.

As folhas de pagamento divulgadas trazem a remuneração de militares aposentados, pensionistas de militares, pensionistas de servidores civil e aposentados do Banco Central. Nos casos de acúmulo de benefícios com valores elevados, a maioria envolve militares e seus dependentes. Mas há também 20 casos de professores e médicos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, incluindo aposentados e instituidores de pensões. Há também 10 registros de auditores da Receita Federal.

Rendas acima de R$ 60 mil

A maior renda acumulada é de Gizelda do Rego Pinto – R$ 66 mil. Ela recebe R$ 24,6 mil como ex-cônjuge de um auditor da Receita Federal desde 1966, mais R$ 6,5 mil como professora aposentada da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) a partir de 2016 e R$ 34,8 mil como viúva do marechal do ar José Carlos Pereira desde setembro de 2020.

Alayde Cabral Durães de Fonseca tem renda de R$ 27,3 mil como auditora fiscal da Receita aposentada desde 1991, mais R$ 34,9 mil como filha de um marechal do ar após 2003 – um total de R$ 62,2 mil.

Yolanda Dutra de Medeiros conta com a pensão de R$ 20,4 mil como ex-cônjuge do auditor agropecuário Maurício Cantalice desde 1986, mais R$ 29 mil como filha do marechal Edgard Soares Dutra a partir de 1996. Tem ainda a aposentadoria de R$ 11 mil do Colégio Pedro II, totalizando renda de R$ 60,5 mil. O general de exército Josemar Câmara Feitosa tem renda total de R$ 60,3 mil, sendo R$ 29,8 mil como militar da reserva e R$ 30,5 mil como médico aposentado do Colégio Pedro II.

O cruzamento de dados entre as folhas de pagamento mostra que muitos instituidores de pensão deixam dois benefícios para um mesmo dependente. O tenente brigadeiro do ar Waldemar Kischinhevsky deixou pensão militar de R$ 31,2 mil e pensão civil de R$ 22 mil como professor da UFRJ para a sua viúva, Celina Freitas Ramalho. Ela ainda recebe R$ 5 mil como agente administrativa aposentada da Aeronáutica, chegando a uma renda de R$ 58,4 mil, sem sofrer abate-teto. (Veja no fim do texto tabela com as maiores rendas)

Filha de dois pais

Entre as maiores rendas acumuladas há alguns casos curiosos. Alda da França Vellozo, por exemplo, recebe pensão de R$ 33,3 mil como pensionista de dois militares. Segundo os registros do governo era recebe pensão como filha de um coronel da Aeronáutica desde 1973 e como filha de um capitão do Exército a partir de 1996. Ganha ainda mais R$ 2,4 mil como postalista aposentada do Ministério da Ciência e Tecnologia. O blog solicitou esclarecimentos ao Exército, mas não houve resposta.

O almirante Luiz Brígido Bittencourt foi reformado por doença em 1991, com renda de R$ 31 mil. Desde 2005, porém, passou a receber pensão no valor de R$ 8,9 mil como ex-combatente no posto de segundo tenente da Marinha. O tipo de pensão é assim descrito: “ex-combatente (o próprio)”. A renda total chega a R$ 40,2 mil.

O general de divisão Marcel Padilla foi reformado em 1976, com renda de R$ 29,4 mil. A partir de 2005, passou a receber também pensão como ex-combatente no posto de segundo tenente do Exército, acrescentando mais R$ 8,9 mil à sua renda. Chegou perto do teto, com rendimentos de R$ 38,3 mil.

Quem sofre abate-teto

Há casos de pensionistas e aposentados que sofrem o abate-teto, o que ocorre quando a renda supera o teto constitucional – equivalente ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Therezinha Palhano Leal, como exemplo, recebe R$ 31,4 mil como pensionista viúva do almirante Luiz Carlos Palhano Leal, mais R$ 27,3 mil como aposentada da Advocacia Geral da União (AGU). Sua renda chegaria a R$ 58,7 mil, mas ela sofre o redutor constitucional de R$ 17 mil.

Tânia Dias Xavier tem um corte ainda maior. Ela recebe R$ 29,2 mil como pensionista filha do marechal Jovaldo Ferreira Dias e R$ 27,3 mil como auditora fiscal aposentada. A soma fica em R$ 56,5 mil, mas o abate-teto é de R$ 19,2 mil.

Sistemas não se falavam

As quatro folhas de pagamento que agora foram cruzadas não se falavam. Segundo dados do Exército, são cerca de 750 mil pessoas. Há casos de duplicidade de vínculo em pouco menos de 1% do total. Desse percentual, cerca de 90% aparentemente são lícitos. As Forças Armadas estão agora identificando as acumulações que são lícitas e as que são potencialmente ilícitas.

As que forem lícitas serão excluídas desse universo. No caso das potencialmente ilícitas, será aberto um procedimento administrativo em cada caso para ver se é acúmulo ilegal ou não. Uma vez constatada a ilegalidade, haverá um processo de restituição ao erário, com possível judicialização. Profissionais da saúde e da educação têm obtido na Justiça o direito de acumular empregos públicos ou salário com aposentadoria acima do teto constitucional.

Segundo as Força Armadas, esse trabalho de cruzamento das fontes de pagamento já vinha sendo desenvolvido pelo Ministério da Defesa, com participação das três forças (Exército, Marinha e Aeronáutica), junto à Controladoria Geral da União (CGU), buscando justamente essa integração dos dois sistemas diferentes.

Maiores rendas

Fonte: Portal da Transparência da Presidência da República

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