O curto período de transparência nas listas dos passageiros dos voos de jatinhos da Força Aérea Brasileira (FAB) revelou que as esposas dos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Alexandre de Moraes (Supremo Tribunal Federal) pegaram carona para viajar em aeronaves oficiais. Mas a transparência durou apenas três semanas. A FAB retirou dos registros de voos a lista dos passageiros a partir de 23 de janeiro. Assim, foi retomado temporariamente o sigilo das caronas dos ministros e de outras autoridades.
Em 8 de janeiro, o presidente do STF, Roberto Barroso, fez um voo de Brasília para São Paulo em jatinho da FAB compartilhado com o ministro Haddad. Estavam no voo o ministro Alexandre de Moraes e a sua esposa, Viviane Barce de Moraes. O Decreto Presidencial 10.267/2020, que dispõe sobre o transporte aéreo de autoridades, prevê expressamente que o presidente do STF tem direito a solicitar voos em jatinhos da FAB. Os demais ministros não são citados.
Mas o decreto abre uma brecha que pode beneficiar os demais ministros do Supremo. Prevê que o ministro da Defesa poderá autorizar o transporte aéreo “de outras autoridades nacionais ou estrangeiras”. No caso de Alexandre de Moraes, os voos ocorrem por “motivo de segurança”. Ele vinha sendo perturbado e sofrendo ameaças nos aeroportos. Foram registradas no ano passado 100 viagens “à disposição do Ministério da Defesa”, sendo 87 delas com apenas um passageiro a bordo.
Brecha legal para caronas
O art. 7º do decreto presidencial abre espaço para os caronas. Prevê que ficarão a cargo da autoridade solicitante os critérios de preenchimento das vagas remanescentes na aeronave, quando existirem vagas disponíveis além daquelas ocupadas pelas autoridades que compartilharem o voo e por suas comitivas.
Em 15 de janeiro, domingo, Haddad compartilhou com a ministra do Planejamento, Simone Tebet, um voo de São Paulo para Brasília em jatinho da FAB. No voo, na condição de carona, estava a mulher do ministro, Ana Estela. Ela é secretária de Informação e Saúde Digital no Ministério da Saúde. No dia 19 de janeiro, uma quinta-feira, Haddad compartilhou um voo de Brasília para São Paulo com Simone Tebet. Na lista de passageiros estava Estela Haddad.
A prática de Haddad é antiga. De 2010 a 2011, como ministro da Educação, Haddad fez 97 voos entre Brasília e São Paulo acompanhado da mulher e da filha menor. Ele fez 46 voos exclusivos para São Paulo, sem outros ministros a bordo.
Aeronáutica não cumpre decisão do TCU
Em setembro de 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou ao Comando da Aeronáutica que passasse a divulgar na internet a lista de passageiros dos voos realizados pela FAB. A decisão não mudou, mas até hoje não foi cumprida. Em 3 de outubro do ano passado, o TCU atendeu à solicitação da Aeronáutica e prorrogou por mais 90 dias o prazo para cumprimento da determinação. Em 5 de janeiro deste ano, teve início a divulgação dos passageiros dos voos da FAB. Em seguida, porém, em 24 de janeiro, o plenário do TCU concedeu novo e “improrrogável” prazo de 90 dias para o cumprimento da sua decisão em setembro de 2022.
A decisão do TCU, em 2022, resultou de representação do então deputado federal Gustavo Fruet (PDT-PR), que alegou violação do princípio da transparência pelo Comando da Aeronáutica, por não disponibilizar os dados necessários ao controle da legalidade do uso de aeronaves da FAB pelas autoridades federais.
O Ministério da Defesa afirmou ao deputado que os voos realizados de janeiro de 2019 e maio de 2021 foram publicados no portal da FAB na internet. No entanto, a Força Aérea alegou não possuir a relação dos acompanhantes das autoridades, pois o referido controle estava a cargo dos solicitantes das aeronaves.
Recurso contra decisão
A Aeronáutica recorreu da decisão do TCU afirmando que “compete à autoridade solicitante manter o registro daqueles que acompanham a autoridade na viagem, como previsto no Decreto 10.267/2020. Não cabe ao Comando da Aeronáutica a responsabilidade de exercer a função de controle administrativo pelo uso de aeronaves militares que tenham seus voos disciplinados pelo Decreto”.
Na decisão de maio de 2023, o TCU destacou: “Não se sustenta a afirmação do recorrente de que não há previsão legal que atribua competência ao Comando da Aeronáutica para fornecer informações acerca da lista de passageiros dos voos realizados pela FAB, pois a própria Lei de Acesso à Informação exige tal providência. Conforme prevê o art. 8º da Lei 12.527/2011, é dever dos órgãos e entidades públicas promover a divulgação, em local de fácil acesso, de informações de interesse coletivo por eles produzidas".
O Ministério da Defesa afirmou ao blog que cumpre rigorosamente o Decreto Nº 10.267/2020. “Conforme o art. 2º desta normativa, o Ministro da Defesa poderá autorizar o transporte aéreo de outras autoridades, nacionais ou estrangeiras. De acordo com o decreto, as solicitações de transporte são atendidas nas seguintes situações: por motivo de emergência médica, de segurança e de viagem a serviço.
Fazenda defende legalidade das caronas
O blog relatou ao Ministério da Fazenda as caronas da esposa do ministro Haddad e perguntou qual o dispositivo legal que permite essa prática. A assessoria do ministro respondeu: “Trata-se de uma insinuação misógina ao ignorar o status profissional da citada, uma servidora pública. A professora da USP Ana Estela Haddad ocupa o cargo de secretária de Informação e Saúde Digital do Ministério da Saúde a convite da Ministra Nísia Trindade”.
Sobre a legalidade dos voos, a Fazenda afirmou que “as viagens realizadas pelo Ministério da Fazenda seguem as regras estabelecidas pela Lei nº 8.112 (artigo 58) e pelo decreto nº 10.267. Conforme o art. 7º do decreto nº 10.267, acerca do uso de vagas ociosas: Art. 7º Ficarão a cargo da autoridade solicitante os critérios de preenchimento das vagas remanescentes na aeronave, quando existirem vagas disponíveis além daquelas ocupadas pelas autoridades que compartilharem o voo e por suas comitivas".
A festa da direita brasileira com a vitória de Trump: o que esperar a partir do resultado nos EUA
Trump volta à Casa Branca
Com Musk na “eficiência governamental”: os nomes que devem compor o novo secretariado de Trump
“Media Matters”: a última tentativa de censura contra conservadores antes da vitória de Trump
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS